QUE SE LIXEM AS ELEIÇÕES
Por Eduardo Louro
“Que se lixem as eleições, o que me interessa è Portugal”!
A expressão é de Pedro Passos Coelho - foi usada ontem numa reunião com os parlamentares do seu partido – e já está a fazer correr muita tinta. A blogosfera, onde como se sabe não corre tinta, está já inundada….
O sentido da expressão usada pelo primeiro-ministro é claro e linear. Não é dado a quaisquer equívocos, o que não impede que muito se escreva e especule à volta deles, como já vi por esta blogosfera fora. Há expressões que se prestam a isso – e os políticos deveriam ser os primeiros a sabê-lo – e esta é uma dessas. Facilmente se descontextualizam e, depois, mais facilmente ainda se tornam terra fértil de especulação - mesmo que ilegítima – até se transformarem nas mais abusivas conclusões.
Por exemplo, e para pegar em dois pólos impostos, uns poderão concluir que Passos Coelho perdeu o respeito pela democracia ao mandar lixar as eleições. Se é que não revelou mesmo o seu obscuro lado antidemocrático, retomando aquela ideia de Manuela Ferreira Leite – numa expressão também ela de alto risco e que, convenientemente descontextualizada, fez um percurso exactamente idêntico – de suspender a democracia. Não por seis meses mas por tempo indeterminado. Outros, no pólo oposto, poderão concluir que esta é uma mensagem do mais alto sentido ético. De desprendimento do poder, ou mesmo de patriotismo, de quem coloca os interesses do país bem acima dos do partido: o que interessa ao partido - governar para ganhar as próximas eleições – não é compaginável com o que interessa ao país, com o que tem de ser feito.
Na minha própria especulação, o que o primeiro-ministro disse com esta expressão é claro e linear, como comecei por afirmar. E não se está nada a lixar para as eleições!
Ele, que sabe bem que, com o que está a fazer, não tem qualquer hipótese de ganhar eleições, das mais próximas às mais distantes, só pode dizer o que disse. Talvez assim abra algum espaço para aquela segunda hipótese de trás. Talvez assim algumas franjas do eleitorado o possam ver como o homem de Estado que coloca os interesses do país acima dos do partido. Talvez assim, espera ele, se abra uma pequena fresta da janela de oportunidade numa qualquer das eleições. Especialmente naquelas em que o seu adversário é a olhos vistos bem fraquinho!
Mas, de certeza que, assim, segura as pontas do seu próprio partido, numa altura em que brechas se abrem por todo o lado, bem visíveis mesmo à distância!
E espera, também ainda, transportar uma ideia de convicção e segurança naquilo que está a fazer. Numa altura em que a nação é atravessada por uma ideia de total incapacidade e bloqueamento do governo, sem saber por que ponta há-de pegar no país, apenas à espera da próxima visita da troika – como ontem aqui se dizia – é fundamental que transmita uma ideia precisamente contrária. Daí que tenha complementado com a referência à sua forma física: não está fisicamente abatido, está antes mais magro porque faz dieta para isso. “Ninguém quereria um primeiro-ministro barrigudo”: teve o cuidado de acrescentar para, logo a seguir, fazer a ponte para as convicções que o animam. Não só está de boa saúde e forma física como fortemente animado e convicto daquilo que está a fazer.
E nada como uma reunião interna e desgravatada para dizer estas coisas!