Sensação de ... pântano*
O tema é, evidentemente, incontornável. Não sei se já tudo foi dito, mas sei que há sempre mais qualquer coisa a dizer sobre os escândalos ligados à Raríssima, que a jornalista Ana Leal, da TVI, revelou ao país no passado fim-de-semana.
Entretanto vimos como numa deprimente entrevista à mesma jornalista, um Secretário de Estado revelou toda a sua miséria moral. E ficamos a conhecer os nomes ligados aos diferentes órgãos, consultivos ou directivos, daquela IPSS. Por exemplo, o Conselho Consultivo de Reflexão Estratégica, que numa instituição sem fins lucrativos não deixa de ser estranho, é presidido por Leonor Beleza e integra o consultor de comunicação António Cunha Vaz, Fernando Ulrich (presidente não executivo do BPI), Isabel Mota (antiga deputada do PSD, ex-secretária de Estado e actual presidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian), Graça Carvalho (ex-Ministra da Ciência e do Ensino Superior nos governos de Durão Barroso e Santana Lopes), Maria de Belém (ex-ministra da Saúde em governos socialistas e ex-candidata presidencial), e Roberto Carneiro (ex-ministro dos governos de Cavaco Silva), entre outros. Pela assembleia-geral passaram o ministro Vieira da Silva, obviamente envolvido até às orelhas, e a antiga deputada do CDS, Teresa Caeiro.
Maria Cavaco Silva, antes de ter sido feita madrinha dos portugueses por Marcelo - também ele por lá tido e achado - foi a madrinha da Raríssimas nos anos em que o marido ocupou a Presidência da República.
Na Raríssimas não estava apenas todo um regime. Todo o arco da governação, como se diz. Estava o regime e todos os seus vícios.
Por isso, o Instituto da Segurança Social nunca soube de nada. Por isso o Ministro Vieira da Silva não soube de nada. Por isso o Presidente da República também não soube de nada. De concreto e de objectivo, acrescentou. Por isso ninguém recebeu carta nenhuma. Por isso desapareceram as cartas registadas e com AR enviadas à Segurança Social...
E por isso somos invadidos por uma imensa angústia de más sensações. Pela sensação que não é raro o caso da Rarríssimas. Que não é excepção, mas regra. Pela sensação que o país é na verdade governado a partir do submundo. E pela sensação que, se mais trabalho de investigação jornalística deste nível fosse feito, o país desapareceria engolido pelo pântano em que se transformou.
E no fim, com todas estas sensações à flor da pele, vem o primeiro-ministro António Costa pousar leve, levemente, a cereja no topo do bolo, afirmando em Bruxelas que “o ano de 2017 foi particularmente saboroso para Portugal”!
Provocação não é certamente. E a insensibilidade não bate assim…
* Da minha crónica de hoje na Cister FM