FUTEBOLÊS #76 ALARGAR A BALIZA
Eduardo Louro
As balizas, no futebol, são constituídas por três tubos metálicos, redondos e pintados de branco: dois na vertical - os chamados postes – e um na horizontal, a chamada barra, também conhecida, para os mais velhos, por trave - um nome herdado dos tempos em que as balizas eram de madeira. E facetadas, em vez de redondas.
As medidas da baliza estão oficialmente definidas – 7,32 metros de comprimento (ou será largura?) por 2,44 metros de altura – e, por muito jeito que dê ao guarda-redes encurtá-las, ou aos avançados alargá-las, não há nada a fazer: têm que ser rigorosamente respeitadas!
E no entanto, graças ao futebolês, é possível ao avançado alargá-la e ao guarda-redes encurtá-la. Isso mesmo: o que o futebol faz, o futebolês desfaz! Mas o futebolês consegue mais: consegue ainda que sejam os próprios avançados a, contra todas as expectativas, encurtá-la. E se não consegue o mesmo com os guarda-redes – que sejam eles a aumentá-las – consegue pelo menos que eles as abram!
Um avançado alarga a baliza sempre que se coloca em posição central em relação à mesma, sempre que se encontra bem enquadrado com a baliza, como se diz em futebolês. O guarda-redes encurta-a se, por sua vez, naquela posição conseguir reduzir a distância que o separa do avançado. Sempre que, por força dos seus movimentos ou dos que a defesa adversária lhe impõe, o avançado se vê obrigado a descair para um dos lados, perde centralidade em relação à baliza. Fica desenquadrado com a baliza e é então ele próprio a encurtá-la! Fica mais fácil para o guarda-redes fechar o ângulo e tapar por completo a sua baliza! O que nem sempre acontece: circunstâncias há em que o guarda-redes, por deficiente posicionamento na baliza, em vez de a fechar, abre-a…
Como se vê mesmo as medidas rigorosas permitem alteração. Até parece política!
É o que o Benfica tem que perceber!
O Benfica passou toda esta época a encurtar as balizas adversárias. Ao mesmo tempo tinha na sua própria baliza alguém que, em vez de a encurtar, a alargava. Que, sempre mal posicionado na baliza, a deixava bem aberta e bem larga para os adversários.
Não sei se será possível uma mudança tão radical na gestão do Benfica que permita aspirar, já para a próxima época, ao alargamento das balizas adversárias e ao encurtamento simultâneo da sua própria baliza. Na eventual impossibilidade de juntar e acumular ambos os objectivos há que tomar opões e, como na construção da própria equipa, deve começar-se de trás: pela nossa própria baliza, tornando-a mais pequena para os adversários.
Parece-me que foi isso que Luís Filipe Vieira quis dizer no início da semana. Não foi ousado ao ponto de nos deixar perceber a ambição de conjugar os dois objectivos: puxou claramente as orelhas a Jorge Jesus, mas deixou-o continuar. E, deixando-o continuar, deixará continuar muitos dos erros que limitarão ambições. Mas puxando-lhe as orelhas puxou-o à realidade, deixou o aviso, esvaziou-lhe alguma parte do ego e, esperam os benfiquistas, limitou-lhe os poderes e circunscreveu-o à sua (reduzida, a meu ver) esfera de competências, lembrando-lhe o princípio de Peter.
Declarou a sua intenção de passar a delegar menos, o que, não sendo exactamente uma boa notícia – porque não se lhe reconhecem grandes competências no futebol – é outro puxão de orelhas: desta vez a Rui Costa! Que deverá passar a próxima época numa coisa tipo unidade de prematuros, a ver se cresce em laboratório…
Pode ser que na próxima época consiga encurtar a sua baliza. Vamos a ver! E esperemos que na outra seguinte chegue então a altura de alargar balizas…
Entretanto cai hoje o pano sobre o campeonato desta época: com um campeão claro e indiscutível. Ver-se-á lá mais para a noite se sem derrotas… Um campeão que não deixou que o rival Benfica esboçasse sequer uma ameaça de ciclo e que se mostra capaz de ser ele a lançar mais um dos seus muitos ciclos de domínio das últimas décadas. Que, como mais ninguém, sabe alargar as balizas dos adversários e encurtar as suas. De vez em quando, vai mesmo lá alterar as medidas…mas ninguém vê. E quando alguém vê é como se não visse… E quando alguém fala é como se não falasse, como se vê com um tal Jacinto Paixão!