GREVE GERAL
Por Eduardo Louro
A greve geral deste dia 24, que acaba de chegar ao fim, não foi muito diferente das outras. A mesma data - 24 de Novembro – do ano passado. A mesma repetição, até à exaustão, da legitimidade do respectivo direito. Toda a gente acha que a greve é um direito indiscutível, inalienável e que tem que ser respeitado.
Toda a gente acha que a greve é um direito respeitável, mas… Pelo que se viu por aí fora há sempre um mas, toda a gente tem uma mas a acrescentar. Que, mais ou menos atabalhoado, mais ou menos engasgado, serve tão simplesmente para dizer que o direito à greve existe mas não devia existir! Tal e qual!
Verdadeira novidade foi a ausência da famosa e clássica guerra dos números. Já diz o povo: para teimar são precisos dois! Como para dançar o tango, como dizia o outro… Os sindicatos não deixaram os seus créditos por mãos alheias – as coisas também não estão para isso – e, sem abdicar do seu papel, partiram para a luta. E não fizeram a coisa por menos: mais de 90%! O governo ainda deu mostras de ir a jogo – logo pela manhã já estava de peio feito e de provocação em grande estilo a anunciar os seus 3,6% - mas, depois, o patrão Relvas deu meia volta e mandou recolher. Não entramos nessa guerra – sentenciou. E pronto, não há discussão, ninguém teima e não há guerra!
Não será certamente novidade que muita gente que achava que deveria ter feito greve tenha ido trabalhar. Como não é novidade nenhuma que a adesão à greve tenha sido grande no sector público e muito reduzida no sector privado. O que de algum modo terá suavizado os terríveis prejuízos para o país…
Se a mobilização para a greve advém das dificílimas condições de vida impostas aos portugueses – não importa se com ou sem alternativas, e nem sequer se com ou sem enquadramento no manifesto do Dr Soares – é claro que, da imensa e esmagadora maioria dos portugueses que vive os mais duros dias das suas vidas, grande parte estaria disponível para aderir à greve. Razões não lhes faltam! Muitos – muitos mesmo – não o fizeram porque não podem sequer prescindir do salário que perderiam. Outros não o fizeram por conflito de interesses. Pela consciência – particularmente no sector privado - de que o seu direito legítimo de fazer greve conflituava com o interesse da empresa que lhe garante o sustento ou - mesmo no sector público – de que o exercício desse seu direito prejudicava outros concidadãos.
É natural que a adesão se tenha concentrado no sector público. É historicamente assim. É aí que se concentram os trabalhadores – não digo os portugueses – mais penalizados e é aí, apesar de tudo e sem paradoxos, que ainda poderá residir alguma capacidade para perder um dia de salário. Vamos a ver se isto não dá mais umas ideias ao governo, acabando por descobrir que, afinal, ainda há lá mais uns trocos para sacar!
O resto são posições ideológicas. Os que são contra as greves. Porque sim! Os que as vêm como o remédio para todos os males. Ou os que as delas têm uma visão meramente instrumental. Os dos mas e até os que acham que a chinesa Dagong e a americana Fitch acabam de baixar o rating da República (mais um lixo) precisamente por causa da greve.
Há gente que não percebe que as sociedades precisam de válvulas de escape. E que, nas actuais circunstâncias, é fundamental que a mais que justificada indignação esteja institucionalmente enquadrada. Para que incidentes sem expressão - como simples actos de vandalismo em meia dúzia de locais (entre os quais algumas repartições de finanças) ou os incidentes do final do dia junto ao palácio de S. Bento – não venham abrir caminho a fenómenos de contestação difusos e inorgânicos, que facilmente degeneram em descontrolada violência social.