Aldrabices de valor acrescentado
Por Eduardo Louro
Todos os dias tropeçamos em pequenas habilidades que têm por único fim apanharem-nos os poucos euros que vamos conseguindo manter nos bolsos. Depois dos impostos, da gasolina, do supermercado, das prestações da casa, do carro e de sabe-se lá mais o quê. Dos parquímetros e dos arrumadores que nos obrigam a pagar o estacionamento em dobro. Depois de termos conseguido segurar os últimos euros à custa de tantos e tantos cortes e de mais uns furos no cinto, ainda surge um autêntico exército de chicos espertos a magicar todas as formas de os conseguir sacar. São autênticos ímanes apontados aos nossos bolsos!
Umas vezes de forma legal, muitas de forma ilegal, mas sempre de forma ilegítima!
À frente deste exército encontramos invariavelmente o mundo das telecomunicações. As novas tecnologias transformaram-nos em comunicadependentes e, como em todas as dependências, lá estamos nós disponíveis para alimentar mais uma vaga de traficantes que rapidamente ocupa os mais diversos pontos na cadeia de distribuição.
Se nos distraímos lá estão uns tipos a dizerem-nos que ganhamos isto e aquilo e, de repente, só damos com uns euros a voar nas asas de uns ora atrevidos ora incautos sms. Tudo legal! Tão legal que até as operadoras, invariavelmente os maiores chicos espertos, lhe dão cobertura…
O que todavia mais me impressiona é a generalização e a utilização indiscriminada das ditas chamadas de valor acrescentado. Que sejam utilizadas pelos chicos espertos, enfim: o que é que podemos fazer?
Mas não, são utilizadas por toda a gente. Por gente absolutamente insuspeita e pela mais respeitáveis instituições. Evidentemente com a bênção de todas as altíssimas entidades reguladoras e de supervisão que, supostamente, velam por nós - pobres cidadãos e indefesos consumidores.
São as televisões, que descobriram o filão e já não há concurso que não seja decidido sem as tais dos 60 cêntimos, mais IVA. Do mais simples e insignificante concurso ao próprio concurso das cantigas da Eurovisão e das estações associadas. Do maior português ao ídolo do momento. Às 7 maravilhas! Elegem-se assim as 7 maravilhas de tudo e mais umas botas…
As sondagens são já substituídas pelas consultas de opinião, sobre o que quer que seja, a troco de uma chamada com aquele mágico custo. Por dá cá aquela palha qualquer estação de televisão quer saber a nossa opinião. Que nós damos pelos módicos 60 cêntimos, mais IVA.
Mas também simples sorteios travestidos jogos de apostas!
É durante a transmissão de uma corrida de touros que se sorteiam bilhetes mediante a resposta a uma pergunta de algibeira, do tipo das dos tipos que nos enganam com os sms. Ou durante a transmissão de um jogo de futebol, onde se sorteiam bilhetes, bolas ou camisolas …
Pelos vistos nada disto é ilegal. Mas é ilegítimo e deveria sê-lo!
Estes sorteios são um negócio. Um negócio obscuro, sem transparência e sem risco. Vezes há em que, apesar de tudo, ainda há alguma transparência: é quando informam que oferecem uma camisola a cada 500 chamadas. Aí dá para ver o chico-espertismo e para fazer as contas à aldrabice!
As consultas de opinião são outra aldrabice. Perigosa e perversa!
Acha que isto ou que aquilo?
Parece-me normal que qualquer pessoa se interrogue: por que carga de água terei de pagar para dar uma opinião … que me estão a pedir? Não faz sentido, e como acho que as pessoas não são estúpidas, tenho que concluir que só vai gastar o dinheirinho quem tiver alguma coisa a ganhar com isso.
Por exemplo, ainda ontem uma estação de televisão questionava se Carlos Queiroz se deveria ou não demitir. Quem é que, no meio de todo este imbróglio em que ele está envolvido, teria interesse no sentido da resposta?
A resposta parece-me fácil e, já agora, o resultado foi esmagador: mais de 70% achava que não se deveria demitir!
Com tantas altas autoridades não haverá uma só que seja que perceba que isto assim não vale? Ou que não devia valer!