Generosidades*
De repente, um livro – desculpem-me se exagero na designação – que teria pela frente todo um longo caminho comercial até chegar a best seller, alarga o passo e, de uma só vez, sem investir um tostão em marketing e publicidade, salta para as estantes com uma campanha promocional nunca vista, com as portas das vendas completamente escancaradas.
Mérito do editor, profundo conhecedor dos segredos do negócio?
Mérito do autor, ilustre escritor, distinto Nobel, ou emérito investigador e pensador?
Nada disso. O editor é de primeira linha, mas sem investimento não faz milagres. E o autor … Bom, já lá vai o tempo em que garantia que um dia haveria de chegar a Nobel…
O mérito é todo – todinho – de Pedro Passos Coelho. Aceitou o convite para apresentar uma coisa que toda a gente tinha por verdadeiramente pornográfica. Intelectualmente pornográfica. E ao que se diz – porque não a li, nem tenciono fazê-lo porque tenho mais que fazer – também de facto muito próxima da pornografia. E ao aceitar fazê-lo acendeu nas redes sociais, e na comunicação social em geral, uma gigantesca campanha que não mais se apagou, com reacções que, se não chegaram para rasgar vestes, deram pelo menos para rasgar cartões do partido.
Três dias depois de reafirmar a sua intenção de assegurar essa apresentação, porque admirava o autor e não era homem de voltar com a palavra atrás, deu o dito por não dito. E pediu ao autor que o desobrigasse do compromisso…
Não lhe vale de muito, esta inflexão. Não lhe acrescenta nada, antes pelo contrário. Mas vale muito, e acrescenta ainda mais, à campanha que generosamente ofereceu à obra do seu amigo… Que já nem de apresentação precisa. O livro, a coisa, está já à venda. A todo o vapor, como seria inevitável num país como o este…
* Da minha crónica de hoje na Cister FM