Em tão pouco dizer tanto
Sabe-se que Rui Rio é tido por reserva moral do PSD. Ele próprio tudo tem feio para alimentar de si mesmo uma ideia sebastiânica que faça dele o desejado, sempre à espera da vaga de fundo.
Como não lhe conheço uma ideia para o país, nada que verdeiramente dê substância a esse estatuto de salvador da pátria que lhe pretendem atribuir - apenas lhe conheço a ideia que faz de si próprio: um poço de virtudes desconhecidas que paira acima de todos os defeitos da classe política - tenho alguma dificuldade em afastar da sua testa o invisível rótulo de populista.
Desde que há semanas se deixou de tretas e disse finalmente que estava ali para assumir a liderança do partido - assumir é completamente diferente de conquistar, os sebastiânicos não conquistam nada, aceitam, no limite, no fim de tudo, esgotadas todas as alternativas, e com grande espírito de missão o seu próprio destino - era preciso que dissesse alguma coisa. Alguma ideia, por mais elementar que fosse.
Pois acabou de acontecer esse momento histórico em que o desejado apresenta a sua primeira ideia para o país. E a sua primeira ideia é, imaginem, criar um novo imposto. Exactamente, nem mais, nem menos: um novo imposto!
Ficamos esclarecidos. Tão esclarecidos que nem valia a pena ouvir mais nada...E não valia, de facto. Porque, se ouvi-lo dizer que esse novo imposto não aumentaria os impostos, é ouvir o que há dezenas de anos ouvimos, ouvir a explicação que deu é absolutamente assustador. Dizer que o novo imposto teria correspondência na descida dos impostos sobre o rendimento e no IVA, que se destinaria exclusivamente a pagar os juros da dívida (reforço: os juros, apenas os juros da dívida, e não a dívida, como titulam os jornais), é dizer que corta na educação, na saúde e nas funções sociais do Estado. Sem diferença nenhuma do que tem sido feito. Mas dizer que seria bem recebido pelos portugueses, porque prefeririam pagar dívida - em clara manipulação seriam levados a pensar que estariam a pagar dívida, uma impossibilidade, mas estariam apenas a pagar juros da dívida - a pagar a educação, a saúde e as outras funções do Estado Social, é todo um vasto e completo manifesto político.
Tardou a lançar uma ideia, mas quando a lançou, e mesmo parecendo falar pouco, Rui Rio disse tudo. Disse que vai fazer o que todos antes de si fizeram: lançar impostos. Disse que sobre os juros e a dívida não há nada a discutir, apenas tudo a pagar. Disse o que pensa das funções do Estado. Disse o que pensa do financiamento da saúde e da educação. E disse o que pensa dos portugueses...
Disse tanto, e em tudo o que disse, nada o distingue de Passos Coelho. E se nada o distingue, alternativa não é certamente!