O legado de 2016*
Com o ano a chegar ao fim – está mesmo a ficar-se – é tempo de olhar para trás, de fazer balanços, de distinguir factos, acontecimentos e personalidades. E de sobre eles fazer escolhas: o facto do ano, o acontecimento do ano, a personalidade do ano … Cá e lá fora…
Não é isso que vou fazer, mesmo que passe completamente ao lado do exercício mais próprio deste tempo. Para dizer que este foi um ano que correu mal ao mundo e correu bem – vá lá: menos-mal – a Portugal. Por todo o mundo se sucederam tragédias, umas mais naturais que outras. De sismos, a tsunamis, de furacões a vulcões… De quedas de aviões a atentados terroristas… E, the last not the least, como dizem os ingleses, Trump foi feito presidente americano.
Por cá, nada disso, felizmente. Elegemos Marcelo – veja-se bem a diferença –, a geringonça funcionou, Guterres foi designado secretário-geral da ONU, e a selecção nacional de futebol foi campeã europeia. Até o défice deixou de nos atormentar…
O que não quer dizer, nem mesmo à luz de um certo cinismo luso, que o que é mau para o mundo é bom para Portugal. Mesmo quando parece que é, como sucede com o empurrão que o terrorismo islâmico deu ao turismo nacional.
Mas é um mero efeito colateral. O efeito central do terrorismo islâmico, que parece incontrolável, esse é devastador. A partir da onda de terrorismo que todos os dias mata gente por todo o mundo, mesmo que só contemos os do pé da porta, e da indissociável avalanche de refugiados, o mundo mudou radicalmente, mesmo que disso não estejamos a tomar devida conta.
Veja-se como Merkel é hoje um anjo, e a esperança da Europa quando, há apenas dois anos, era o puro demónio. Veja-se como os valores da democracia, da liberdade e da tolerância são confrontados com os sentimentos de medo e de insegurança. E veja-se como esses sentimentos prevalecem sobre os valores das mais sólidas democracias, franqueando as portas à extrema-direita xenófoba e totalitária.
Como já se viu em muitas partes do mundo. Viu-se nos Estados Unidos. Já se vê na Europa. E provavelmente, já no ano que aí está a chegar, irá ver-se no próprio coração da União Europeia.
É este o maior legado de 2016. Justamente o objectivo principal do terrorismo islâmico!
* Da minha crónica de hoje na Cister FM