A entrevista deste fim-de-semana de Durão Barroso à SIC e ao Expresso traz-nos de volta a Porca da Política, de Rafael Bordalo Pinheiro.
Durão Barroso diz que, presidenciais, nem pensar. Fora de causa. Os barrosistas, que pé ante pé passaram de simples apoiantes de Passos a posições dominantes em boa parte do aparelho do partido, fazem coro: Durão Barroso deixou claro que não é nem quer ser candidato a Belém!
Quem parece não acreditar muito nisso é Marcelo. Ficou nervoso, e logo veio dizer que a entrevista era inoportuna e estranha. Que Durão Barroso deveria ter esperado pelo menos um ano, para dar uma entrevista como esta. Que estranhou, sobretudo, a avaliação que o presidente da Comissão Europeia faz de si próprio, e que se tinha alguma coisa a ver com a candidatura à Presidência da República, correu muito mal.
E faz muito bem, porque aquela linguagem não engana. Dizer agora que está farto de avisar o Pedro que há limites (lembra o outro, o avisador, quando também dizia que havia limites) quando ainda há dias dizia que agora é que se não podia abrandar, égato escondido com rabo de fora. Se bem repararam nem o BPN escapou: quando era primeiro-ministro bem perguntou o Constâncio…
E se dúvidas ainda sobrassem lá está o apelo a um governo do bloco central, e ainda com o CDS, naturalmente liderado pelo PS, de Seguro. E,the last not the least, aquela ideia de que o presidente deveria ser eleito com o apoio daqueles três partidos!
Nem mais. Não dá ponto sem nó, como há muito se sabe. A partir das posições que já ocupa no aparelho partidário, e com Passos despachado pelos resultados eleitorais, Durão Barroso tem tudo para garantir o apoio ao PS para formar o próximo governo do bloco central. Claro que em troca só quer o apoio à sua candidatura... Então a única com condições de garantir o tal apoio dos três partidos do arco da governação…
Elementar, meu caro Marcelo. É a porca da política!
Fantástico. Ninguém mais falou do corte nas pensões que o Secretário de Estado José Leite Martins anunciou. Ninguém mais se preocupou com o que vai acontecer com as pensões, nem com a forma como a CES (Contribuição Extraordinária de Solidariedade) passa a CDS (Contribuição Definitiva de Solidariedade - mantenho o eufemismosolidariedadepara facilitar a sigla). O que importa ao país é que o tal Secretário de Estado que ninguém conheciapôs a pata na poça.
Portas resolveu isto de uma penada - "foi um erro, não devia ter acontecido..." E pronto. Não se fala mais nisso!
Às vezes o Benfica joga mal. Uma vez por outra. Normalmente joga ... "benzinho". O problema não é sequer jogar apenas "benzinho". Poucochinho. O problema é que não consegue surpreender ninguém. Nem os adeptos, nem - e é isso que é determinante - os adversários.
Esta noite, na Luz, perante o Chaves, com o "onze" do costume - apenas com Tomás Araújo no lugar de António Silva (a confirmar que o preenche com absoluta competência), e com Kokçu, aparentemente com o problema resolvido, no banco - aconteceu o que é normal acontecer: sem jogar propriamente mal, o Benfica jogou "benzinho"... mas poucochinho. Ainda assim o suficiente para ganhar, por muitos, ao último classificado. Tem sido frequentemente assim: jogar "benzinho", mesmo que poucochinho, tem sido suficiente para ganhar maioria dos jogos. Umas vezes por pouco, outras por muitos, conforme a eficácia.
Só que, no jogo desta noite, àquilo a que normalmente chamamos eficácia, temos de chamar competência. Nem sempre é assim, nem sempre a falta de eficácia é incompetência, mas hoje foi-o. Hoje, na Luz, não foi eficácia que faltou especialmente a Di Maria e Arthur Cabral. Eficácia faltou a Rafa, Otamendi, Tomás Araújo, Bah ou Florentino.
Di Maria foi infeliz, mas também incompetente, ao permitir ao guarda-redes do Chaves que defendesse o penálti, ainda antes da meia hora, e que mudaria o jogo. Acontece. Arthur Cabral foi infeliz, mas também incompetente, ao imitá-lo, à hora de jogo. Não faço ideia donde tenha partido a decisão de trocar o marcador, mas não tenho dúvida que foi incompetente - um jogador como Di Maria não pode ficar afectado por ter falhado um penálti. Toda a gente sabe que não. Como toda a gente sabe que uma troca dessas pesa na cabeça de um jogador permanentemente desconfiado, como é Cabral. Fez exactamente como Di Maria fizera, e o guarda-redes voltou a defender.
O VAR - que tivera de intervir para que Hélder Malheiro assinalasse os dois óbvios penáltis - mandou repetir. Inicialmente ficara a ideia que Hugo Souza, o guarda-redes do Chaves, dera um passo antes de a bola partir. Deu, na realidade, mas manteve um pé na linha de baliza. E a repetição deveu-se, afinal, à entrada na grande área de jogadores do Chaves antes do remate, que já tinha também acontecido no penálti da primeira parte, de Di Maria, mas passado em claro.
Na repetição, Arthur Cabral já não foi infeliz, nem apenas incompetente. Foi qualquer outra coisa inimaginável, ao repetir, pela terceira vez, exactamente o mesmo. A mesma preparação, o mesmo remate fraco, para o mesmo lado direito do guarda-redes, no mais flagrante exemplo da incompetência que nesta altura grassa no futebol do Benfica!
A mesma que faz com que apenas consiga marcar ou em contra-ataque, ou de bola parada. Foi assim, num livre cobrado por Di Maria e concluído de cabeça por João Neves que, aos 68 minutos, marcou o golo que assegurou mais uma vitória. Curtinha, justa pelas oportunidades criadas, mas à justa e com muito pouco encanto.
Só depois do golo Roger Schmidt começou a mexer na equipa. A tempo de duas agradáveis surpresas: a primeira nos aplausos a Arthur Cabral, quando foi substituído por Marcos Leonardo; a segunda, pouco depois, pela pacífica entrada de Kokçu que, com João Mário, substituíram Di María e o irreconhecível David Neres.
Se tivesse o mínimo sentido de responsabilidade, Portas já teria a esta hora publicado a lista das pessoas nessas circunstâncias. Já sabemos que nem tem esse sentido nem faz ideia do que seja. E por issose está nas tintasque pensemos que somos governados por perigosos loucos e criminosos, que impunemente atribuiram subsídios sociais a gente rica, de riqueza bem à vista, que não estava escondida debaixo de colchão nenhum. Mas também por isso, e em alternativa, se está igualmente borrifandoque pensemos que é ele próprio um irresponsável, um aldrabão que mente e engana sem olhar a meios, nem que sejam disparates destes…
Não respeita os outros, mas também não se respeita a si próprio. O que também não é exactamente uma grande novidade!
Luís Montenegro vai hoje apresentar ao Presidente da República a lista de nomes para o novo governo. Dessa, pouco ainda se sabe neste momento, correndo-se até o risco de, o que se sabe, vir a não a confirmar-se. Sabe-se, depois dos resultados das últimas eleições, e mais ainda depois daquelas 30 horas que marcaram o início da nova legislatura só para escolher a Presidência da Assembleia da República que, só por milagre, não será um governo de curta duração.
No ano em que comemoramos 50 anos do 25 de Abril enfrentamos óbvias ameaças à nossa convivência democrática. E, em vez de celebrarmos a maturidade (de 50 anos) democrática e os valores da liberdade, da fraternidade ("em cada esquina um amigo") e da justiça social ("em cada rosto igualdade"), vemo-nos reduzidos à obrigação de defender o fundamental de um regime que não conseguiu evitar a fatalidade deste destino!
Chamam a istoprocesso de ajustamento. É preciso ter lata…
Um processo de ajustamento deveria ser justo. Vá lá: tendencialmente justo. Não deveria promover apenas justeza. Deveria juntar justiça à justeza!
Este processo de ajustamento ajusta apenas o que alguns têm andado a ajustar entre si. Para tramar os outros!
A distribuição de riqueza é cada vez menos justa. Menos justa e mais larga a diferença entre ricos e pobres. Ajusta-se aí cada vez menos, por muito que os mais ricos se ajustem cada vez mais ao ajustamento, e os mais pobres se ajustem cada vez mais à miséria.
E que bem ajustados ficaram: uns bem ajustados para cima e outros bem ajustados para baixo, sem nada no meio. Ou quase-nada, já com um quarto da população abaixo do limiar da pobreza…
Ah e tal… é o défice… Então não lhe chamem ajustamento da economia, chamem-lhe ajustamento do défice. Ajustamento de contas, que só tem a ver com justeza, não com justiça. Ajustamento de contas é isso mesmo, não precisa da justiça para nada. E é isso que se percebe, que o que importa é ajustar contas. Com uns, com outros, e até com a História… A pretexto de um défice suficientemente ajustado, bem apertadinho no Tratado Orçamental, que em tempos ajustaram juntos aprovar à pressa!
O "escândalo" criado pela "inventona" de Ventura - criou ele próprio (inventou) um acordo que reclama e mendiga há três semanas -, e pela imprudência de Montenegro, acabou com, não um, mas dois Presidentes da Assembleia da República - Aguiar Branco, desde já e para os próximos dois anos; e Francisco Assis para os restantes dois.
Está bem. PSD e PS têm a obrigação de defender o regime que, não sendo o melhor é, como acaba de mais uma vez ficar demonstrado, o melhor a que podemos aspirar. É tanto assim que nem a improbabilidade de chegar a vez de Francisco Assis - ninguém acredita hoje que a legislatura consiga sobreviver dois anos - impediu esta saída. Afinal a única possível, depois de três votações inconsequentes: a primeira com a candidatura única de Aguiar Branco, a que se juntaram, na segunda, a de Francisco Assis, promovida pelo PS, e a de Manuela Tender, apresentada pelo Chega, logo que se deu conta da do PS, donde partiram os dois primeiros para a terceira.
Depois de anunciada aos sete ventos a eleição de Aguiar Branco para a Presidência da Assembleia da República, com o declarado apoio do Chega ... saiu bronca.
Luís Montenegro, do "não, é não", acreditou na palavra de Ventura e, sobranceiramente, nem uma palavra sobre o assunto com o PS. Logo à primeira, no primeiro dia, e no primeiro acto da legislatura, viu-se o que aí está, e o que aí vem.
Aguiar Branco precisava de 116 votos para garantir a eleição. Ficou-se pelos 89. As contas são fáceis da fazer: 80 votos da AD, 8 da IL e ... mais um. André Ventura, como é costume, mete os pés pelas mãos. Começou por dizer que o voto é secreto, e que até poderiam ter sido os deputados do PSD a não votar no candidato para, no momento seguinte, justificar por que não viabilizou a eleição do candidato que anunciara apoiar, voltando à narrativa do "espezinhar" um milhão de portugueses.
Ficamos todos a saber, se é que já o não o sabíamos, que, qualquer golpe, qualquer habilidade, qualquer chantagem de Ventura que não resulte, são impiedosos pés esmagadores em cima de um milhão de portugueses. E ficamos também desde já a perceber a habilidade de Luís Montenegro para governar nas condições que resultaram destas eleições...
O resto é "uma vergonha". Como dizia o outro. Que não a tem, nem por onde ela passe.
Em tempo de recordar Abril, Adelino Gomes – provavelmente o português que mais memórias de Abril soube procurar e guardar para transmitir às gerações futuras – e Alfredo Cunha (fotografia) apresentaram ontem em livro mais umas quantasestóriasdaquele dia redentor, guardadas por todos estes quarenta anos.
“Os rapazes dos tanques” – assim se chama o livro – vem contar-nos histórias que ficaram do outro lado da História para nos revelar um novo herói, um herói improvável e escondido durante 40 anos, sem que se soubesse onde nem como.
Herói? "Não quero ser herói. Cumpri a missão que tinha como português" – disse quando percebeu que tinha finalmente sido encontrado pela única pessoa que o poderia encontrar.
No dia aprazadopara a revolução, José Alves Costa – assim se chama o novo herói que o não quer ser – chegava ao Terreiro do Paço, num blindado M47 para defender o regime. Quando lhe deram ordem para abrir fogo contra a coluna de Salgueiro Maia, recusou. Não com umnãorotundo e definitivo, que isso correria certamente mal. Mas contornando a ordem e ignorando a ameaça de um tiro na cabeça... Com astúcia, ou simplesmente com a inocência do rapaz da aldeia minhota, que nunca mais voltaria a Lisboa…
Só uma revolução feita de cravos poderia ter histórias destas. E novos heróis, quarenta anos depois...