AUSTERIDADE E CRÉDITO
Por Eduardo Louro
Há seis meses, com o governo a acabar de refinanciar a banca, em plena lua-de-mel, a austeridade não era problema. Interrogando-se se o país aguentaria mais austeridade, os banqueiros não hesitavam na resposta: "ai aguenta, aguenta" - dizia Ulrich, sem complacências.
Na semana passada, no entanto, os banqueiros já vinham a terreiro, por Ricardo Salgado, dizer que não. Que o país já não aguenta mais austeridade!
Poderá o leitor achar que é normal. Foi descoberto o tal erro na folha de Excel de que Vítor Gaspar tinha feito o (in)devido uso, e finalmente está toda a gente, António Borges incluído, convencida que a insistência na austeridade não leva a outro lado que não o aprofundar da espiral recessiva. Até Durão Barroso já descolou da austeridade, e fez já mea culpa.
Até poderá ser que assim seja, que os banqueiros tenham visto passar esta carruagem e decidido embarcar nela. Para não perder este comboio. Mas fico com a ideia que não foi esta a carruagem que avistaram, nem era este o comboio que não queriam perder.
Sabe-se como se trata de gente que cheira, melhor que ninguém, o apodrecimento do poder. E que perante esse cheiro é ágil e rápida em tudo o que possa precipitar os acontecimentos. Bem nos lembramos que Sócrates atirou a toalha ao chão precisamente depois de os ter recebido na véspera!
Claro que o governo, sempre pouco hábil nestas coisas, deu um bom pretexto quando decidiu incluir a banca, logo a seguir ao Tribunal Constitucional, no lote dos responsáveis sobre quem sacode a água do capote. Passos Coelho – mais uma vez bem acolitado por António Borges, que tomou para si, veja-se bem, as dores do ataque à banca - pretende que o governo tudo faz para que a economia cresça, só que a banca, fechando-se ao crédito, não deixa. E de tudo tem feito para pressionar os bancos a abrir os cordões à bolsa, esquecendo-se que o poderia ter feito sem se expor a este ridículo se tivesse incluído nos contratos de recapitalização qualquer coisa a esse respeito.
Toda a gente percebe que não há crescimento porque não há investimento. Nem consumo. E não porque não haja crédito. Crédito para quê?
É evidente que nas condições actuais da nossa economia as empresas não precisam de crédito para fazer crescer o seu volume de negócios. Precisarão dele eventualmente para financiar prejuízos e fundo de maneio, penalizado pela degradação das suas próprias cobranças, para se aguentarem, para não fechar portas… Ora, o crédito bancário – que procuram nessas circunstâncias já depois, como bem se sabe, de ter esgotado o dos seus fornecedores e de lhe ter agravado também as dificuldades – não deve servir para isso. É que isso chama mais por capital que por crédito... E é bem compreensível que, depois de tudo o que se passou, a banca não pretenda entrar por aí…
O resto é demagogia. E o governo – e António Borges (tem sempre que se falar assim, porque ele é governo sem ser do governo) – faria bem melhor se, em vez de se perder em demagogias e à procura de desculpas, fosse directo ao assunto. E ir directo ao assunto é, nesta matéria, pôr rapidamente o Estado a pagar as suas dívidas. É fazer com que o Estado deixe de ser o maior caloteiro do país, e passe a pagar a tempo e horas. Depois, bem … depois é traçar uma política de crescimento económico porque, de austeridade, o país não precisa mais. O Estado precisa, o país não!
Nem é preciso nenhum estudo especial. Basta olhar para a política fiscal: está lá quase tudo!