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Quinta Emenda

Tenho o direito de ficar calado. Mas não fico!

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Tenho o direito de ficar calado. Mas não fico!

Corrupção

Convidado: Luís Fialho de Almeida

 

Há temas que são recorrentes, porque os factos a que se referem persistem e agravam-se na sociedade portuguesa. Esta análise é uma síntese dos dados vindos a público e suas interpretações.

No passado dia 3, a Organização Mundial para a Transparência apresentou o relatório sobre o Índice de Percepção de Corrupção (IPC), que revela o agravamento da corrupção em Portugal passando do 25º lugar em 2003, para o 33º. Mais condenável que a posição no ranking, é a tendência de agravamento: pelos seus efeitos na motivação dos contribuintes chamados a pagar todos os desvarios da governação; por colocar em causa a credibilidade do país, nomeadamente perante os investidores externos; e pela imagem negativa que recai sobre os milhões de portugueses espalhados pelo mundo.

No passado dia 9, comemorou-se o dia internacional contra a corrupção. Paulo Morais, vice-presidente da Associação de Transparência e Integridade, em entrevistas na RDP1, assinalou ambas as datas com mimos como estes: “o fenómeno é generalizado na política e na administração pública”, “Há impunidade absoluta em Portugal e mesmo favorecimento da actividade politica ao fenómeno da corrupção, dada a promiscuidade entre negócios e a política”. “Só no Parlamento temos mais de 50 deputados, em 230, que são administradores, directores, consultores, advogados de empresas, que têm grandes negócios com o estado. Estão num duplo papel: devem lealdade ao povo que os elegeu, mas também fidelidade a quem lhes paga”, e disse ainda ”nem todos os políticos são corruptos, talvez uma minoria de 10 a 15%, mas estes mandam em 90% do orçamento do Estado. Os restantes 85% poderão não ser corruptos mas são cúmplices”.

O relatório da Organização Mundial para a Transparência e a opinião de Paulo Morais, levaram-me a rever um estudo no âmbito do projeto Sistema Nacional de Integridade, apresentado em Maio de 2012, do qual retiro algumas conclusões que nada surpreendem:

“Nenhum Governo até hoje estabeleceu, objetivamente, uma política de combate à corrupção no seu programa, limitando-se apenas a considerandos vagos e intenções simbólicas”.“Muitas das leis estão viciadas à nascença, com graves defeitos de conceção e formatação, o que as torna ineficazes”.

“Falta de sancionamento das irregularidades praticadas pelos políticos, pela falta de mecanismos de supervisão e de fiscalização e a quase inexistência de sentenças com penas de prisão efectiva de punição de corrupção”.“Falta de transparência no tocante a rendimentos e a património antes, durante e depois do exercício de cargos governativos”.

“Os gabinetes ministeriais não são solidários com as restrições orçamentais que impõem aos serviços públicos sob a sua tutela e privilegiam o clientelismo, o eleitoralismo e a cunha”. “Opacidade e gastos excessivos ocorrem com os pareceres solicitados a firmas de advogados com relações diretas com alguns membros do governo, em vez de serem solicitados aos departamentos jurídicos da Administração Pública”.Financiamento ilícito de partidos por parte de empresas, garantindo-lhes um acesso privilegiado a decisões políticas”.A independência da comunicação social não é linear e a concentração da propriedade dos media constitui uma preocupação pública”

 

“O relatório sugere que Ministério Público e o Tribunal Constitucional sejam mais ativos na fiscalização das declarações patrimoniais e que o regime de incompatibilidades e a entrega de registos de interesses seja alargado aos membros dos gabinetes ministeriais. Sugere ainda a criação de um “organismo especializado de combate à corrupção”, a "verdadeira despartidarização da Administração Pública" e a descriminalização da difamação, que tem sido um obstáculo à denúncia.”

 

Não fosse este assunto muito grave - pela incidência no sofrimento daqueles que são mais atingidos pela actual crise -, diria que as sugestões do relatório são para rir. Para que não se diga que o Governo é desprovido de senso moral, o Governo não desmente, assina medidas de combate à corrupção, mas não cumpre, não fiscaliza e não pune.

A corrupção é um brutal imposto que nos cai em cima, a ver pelo exemplo do BPN - buraco de 7 mil milhões de euros - e nada se faz para recuperar este e muitos outros activos retirados do orçamento do estado. O agravamento da corrupção acompanha o aumento da riqueza nas mãos dos milionários portugueses, que só no último ano teve um acréscimo de 11%.

O nosso 33º lugar no Índice de Percepção de Corrupção (IPC) ao nível mundial afasta-nos muito da Somália, mas aproxima-nos muito dos mais corruptos da Europa, a par da Espanha onde muitos políticos, autarcas, assessores, gestores tem prisão efectiva e multas pesadas, da Grécia não recomendável, e da Itália cuja máfia gosta de Portugal como refúgio, a ver por alguns casos recentes. É o nosso triste fado. Já no seu tempo, Eça de Queiroz, se zangava: “Portugal não é um País, é um sítio! Ainda por cima, muito mal frequentado!”

O que terá levado muitos portugueses a eleger, num concurso, o Salazar como o “maior português de sempre”? Será que foi Salazar que se impôs, ou foi o povo português que o pediu? Só que num regime autoritário os valores fundamentais - de igualdade, transparência, livre concorrência, imparcialidade, legalidade, integridade - perdem o significado que a democracia lhes dá, valores que esta corrupção não desiste de atacar. Não sou único a dizer: “Mais que uma crise económica, vivemos uma profunda crise moral”.

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