Coitado do Paulo Portas
Por Eduardo Louro
A notícia é de ontem, mas por falta de disponibilidade só hoje lhe pego. Foi trazida à estampa pelo Diário Económico e dá conta que a rábula da irreversível demissão de Portas, no princípio de Julho, e a crise política que lhe sucedeu, custou ao país 2,3 mil milhões de euros em agravamento de juros.
Não é exactamente novidade, há muito que corria por aí. Há muito que se atribui a mais esta brincadeira de Portas o momento de viragem no comportamento dos mercados, e de inversão do sentido descendente das taxas de juro. Sempre que se tem falado da saída directa da Irlanda do programa de resgate da troika comparam-se as suas taxas de juro com as portuguesas, e logo vêm à conversa as culpas de Portas.
Não é, evidentemente, aquela que foi apenas mais uma brincadeira de Paulo Portas que tem responsabilidades nisto. É mesmo injusto acusar Paulo Portas de mais esta malfeitoria, quando ele já tem tantas outras .
E não estou a defendê-lo. Até porque não seria fácil!
Quero apenas tentar pôr as coisas no seu lugar, separar o essencial do acessório. A crise política do final do primeiro semestre é da responsabilidade de Portas, isso é indiscutível. Mas surgiu na sequência de uma demissão a sério, realmente irrevogável, daquela que era a primeira e principal figura do governo: a decisiva demissão do decisivo Vítor Gaspar. Decisiva porque era exactamente quem tutelava o governo, e na verdade o representante da troika e dos credores no governo. Mas ainda mais decisivo porque, podendo simplesmente ter-se demitido, optou por explicar claramente porque o fazia: porque ele próprio falhara em toda a linha, mas também porque falhara a política em que tinha acreditado. Disse com todas as letras que a receita estava errada, e que por isso falhara!
Foi isto que foi determinante para os mercados – atenção que mercados e credores não são a mesma coisa - perceberem que o programa não funcionava e que, com ele, o país apenas se afundava cada vez mais. Foi esta declaração pública de falência do programa da troika, pela voz mais autorizada para o fazer, que fez com que as taxas de juros subissem e não mais descessem. E não as rábulas de Portas!
Só que a política se manteve e, pese embora as declarações de negação das cúpulas, especialmente do FMI, o programa da troika e do governo seguiu inalterável o seu rumo, como se Vítor Gaspar não tivesse dito nada do que disse. Era preciso fazer de conta que tudo estava a correr bem e esconder depressa as palavras do Gaspar. Por isso nada melhor que culpar Portas pelo arrepiar de caminho das taxas de juro.
Não é estranho que os comentadores do regime o tenham sacrificado para construir esta história. Estranho é que toda a comunicação social a tenha seguido!