GERAÇÃO À RASCA
Por Joana Louro *
O país veio para a rua naquela que terá sido uma das maiores manifestações de sempre... e provavelmente a maior desde os tempos de Abril!
O país estava a precisar disto... E se me é permitido algum egoísmo, eu estava a precisar disto... Precisava de viver uma coisa assim, que me permitisse voltar a acreditar, voltar a identificar-me e voltar a encontrar-me neste país que é o meu e no qual quero continuar a acreditar...
No sábado, como canta Chico Buarque, a festa foi bonita. Foi bonita festa, pá! Duzentas ou trezentas mil pessoas nas ruas, de todas gerações: avós, pais, filhos e netos encheram as praças e as avenidas das nossas cidades. Num protesto cívico e digno, saído do povo – de todos nós – sem botões de comando em qualquer central partidária...
Uma manifestação que nasceu espontânea e descontraída e que a partir das novas formas de comunicar atingiu proporções impensáveis. Porque um grupo de jovens decidiu lembrar a outros jovens que protestar é preciso. E esses passaram a outros e outros a outros ainda, numa bola de neve que ninguém conseguiu mais parar.
Uma manifestação inconsequente, dizem! Não me importa muito. Importa-me muito mais que foi digna, responsável, cívica, pacífica e exemplar. Sem exageros de qualquer espécie. Sem violência, sem extremismos nem radicalismos. Longe, bem longe das imagens de destruição e violência de outros países europeus, como que a lembrar-lhes que também têm coisas a aprender connosco. E a lembrar-nos a nós que, quando queremos, sabemos fazer as coisas tão bem ou melhor que os outros...
Lembrando-nos que há mais de 30 anos também usamos cravos em vez de armas. Que houve Abril, se calhar com muitos momentos como este.... que nos enchem a alma e nos fazem acreditar.
Acreditar que afinal não somos uma massa inerte e amorfa. Alheia e indiferente a tudo, sem voz, sem consciência e sem noção de um mundo de pessoas a sério que é muito mais do que aquele que está ao alcance de um clique. Acreditar que este pode ser o princípio da mudança. Acreditar que o valor da abstenção nas últimas eleições presidenciais foi apenas um descuido de percurso... Que esta gente não se está nas tintas, não é indiferente nem negligente... Que está envolvida com o país e que no momento certo, na forma certa e nas doses certas o sabe demonstrar. Acreditar que, se calhar, ainda é possível sonhar um país, porque sabemos que o país muda … se nós mudarmos! Que o país não fará por nós aquilo que nós não soubermos fazer por ele...
Se acredito em tudo isto? Quero acreditar e acho que mereço acreditar! Deixem-me acreditar… Não estraguem!
* Publicado no Jornal de Leiria de hoje