O PESO DAS PALAVRAS
Por Eduardo Louro
É curioso reparar como as palavras têm pesos diferentes conforme as diferentes circunstâncias. É caso para também dizer que as palavras são elas mesmas – as palavras – e as suas circunstâncias!
Palavras ou expressões que uns se recusam a pronunciar mas que outros não encontram sequer um sinónimo para alternativa. Tudo isto sem que muitas vezes se perceba muito bem por quê, mas a verdade é que há palavras e expressões que, se a uns queimam, a outros refrescam!
Na política isto é recorrente!
São muitos os exemplos – prometo que voltarei ao tema – mas, por hoje, detenho-me em dois que estão na ordem do dia.
Na passada quinta-feira toda a gente aplaudiu as notícias que chegavam da cimeira europeia. Pelas decisões sobre a Grécia mas particularmente pelo que nos tocou a nós na componente do resgate financiado pela UE: com a quebra significativa na taxa de juro e o alargamento do prazo de reembolso para o dobro.
Isto é, regozijámo-nos porque, finalmente, a UE reconheceu aquilo que, há muito, uma boa parte da sociedade portuguesa reclamava: a necessidade de reduzir a taxa de juro e alargar o prazo. Porque, independentemente de serem ou não criadas as condições para trocar políticas económicas recessivas por outras de crescimento – e é aí que está de facto a chave do problema -, sem essa reformulação não era mesmo possível pagar a dívida.
Toda a gente o percebia, toda a gente o reclamava - excepto o ministro das finanças (o que tem que se compreender) que, quando lhe falavam nisso, dizia de imediato que isso não era importante e nem sequer para já – e toda a gente lhe chamava reestruturação da dívida! Expressão maldita para o governo – para facilitar chamemos-lhe assim – e para a direita, mas que a esquerda sempre utilizou. A direita, ou mesmo o chamado arco do governo, teve medo da expressão logo que ela foi introduzida na discussão pública pela esquerda. Pela conotação e pelas agências de rating, e por isso nem sequer ousava falar na redução da taxa de juro…
E, no entanto e em qualquer circunstância, alterar condições tão determinantes – mesmo as mais determinantes – de uma operação de financiamento é reestruturá-la. Com todas as letras!
O outro exemplo que me ocorre vai - pode dizer-se – em sentido contrário. Na abordagem da actual e dramática situação portuguesa é comum ouvir-se dizer que ela resulta de termos andado a viver acima das nossas possibilidades. Esta é uma expressão – e permitam-me mais uma vez que simplifique – usada pela direita mas que indigna a esquerda, que contrapõe com a impossibilidade de alguém que ganhe os salários mais baixos e mais desiguais da Europa gastar acima das possibilidades.
E é de facto chocante admitir que quem ganha 500 euros – muitíssima gente, pois o salário médio nacional ronda os 700 – e que tem que pagar a água, a electricidade, o gás, a renda de casa e as mais básicas das despesas básicas viva acima das suas possibilidades. E no entanto todos percebemos que, enquanto país, andamos há muitos anos a viver não do que produzimos mas do que nos emprestam. Isto é, de facto acima das nossas possibilidades! E percebemos isso tão claramente quanto isso nos entra pelos olhos dentro: basta olhar para os automóveis que circulam nas nossas estradas e nas nossas cidades! E já nem digo para que se compare com o que se vê na Holanda, na Dinamarca, na Finlândia, na Noruega ou na Suécia, só para referir alguns dos mais ricos dos países mais ricos do mundo!
Pois é: da mesma forma que a direita não quer ouvir falar de reestruturação da dívida porque isso mexe com os mercados financeiros, também a esquerda se recusa a ouvir falar de vivermos acima das nossas possibilidades porque isso mexe com a sua suposta base social de apoio. E pur si muove !