O algodão não engana... Mas também não desenganou por completo. Os americanos mostraram um cartão amarelo a Trump, mas nem foi muito alaranjado.
Os democratas ganharam claramente a Câmara dos Representantes, a câmara baixa do Congresso, por onde tem de passar todo o processo legislativo. E isso vai atrapalhar a agenda de Trump, mas vai também permitir o avanço em muitas investigações incómodas para o actual presidente, como as ligações e as interferências do regime de Putin na sua eleição e o seu cadastro fiscal. E ganharam mais governadores estaduais. Mas os republicanos mantiveram, e até reforçaram, a sua posição no Senado, a câmara alta, o que obriga a muita concertação no processo legislativo.
Trump não foi plebiscitado, antes pelo contrário, foi admoestado. Mas também não ficou erguida uma barreira à sua reeleição. Nem do lado democrata emergiu um adversário de peso, até porque a estrela ascendente, Beto O´Rourke, perdeu a corrida para o Senado, no Texas, para o poderoso Ted Cruz. Se as declarações de Trump tivessem alguma vez alguma justificação, diria que talvez tenha sido por isto que tenha escrito no seu twitter: "Tremendous success tonight. Thank you all!".
Hoje há eleições nos Estados Unidos. A meio do mandato, Trump quis fazer delas um plebiscito, como expressamente confirmou, e um trampolim para a reeleição. Para isso empenhou-se e comprometeu-se integralmente com a campanha, o que quer rigorosamente dizer que mentiu, manipulou e forjou como se não houvesse amanhã.
O reportório não é novo, nem traz sequer nada de novo: amedrontar os eleitores, incutir-lhes muito medo com a invasão do país por um gigantesco bando de sul-americanos criminosos, terroristas, traficantes de droga, violadores e assassinos, e avisar que só não ganhará se houver fraude eleitoral. Novo é que, agora, milhares de pessoas a fugir da miséria a que foram condenados por governantes corruptos que sucessivas administrações americanas plantaram e suportaram, engrossam uma caravana que atravessa o México em direcção a norte, à fronteira onde Trump colocou 15 mil soldados com ordem para matar.
Hoje os americanos vão dizer se a eleição de Trump, há dois anos, foi um acidente, ou se, fechando-se sobre si próprios, fecharam definitivamente a América ao mundo. É uma espécie de teste do algodão!
Chegou o dia que ninguém acreditava que pudesse chegar. Há 8 anos - a 20 de Janeiro de 2009 - poder-se-ia ter dito a mesma coisa. Mas não é da mesma coisa que se está a falar...
Se há oito anos a surpresa estava na cor da pele do presidente em cerimónia de posse, hoje, a surpresa está na cor das ideias do presidente que vai tomar posse. Negras, mas muito mais negras que a cor da pele do seu antecessor. E bem capazes de mudar a face do mundo... Tanto, que muitos até acham que poderá ter começado hoje a terceira guerra mundial!
E não faltam razões para pensar assim. Trump já provou que, por maiores que sejam os disparates que diga, não os diz apenas por dizer. É mesmo para fazer. E o choque frontal contra a China, a anulação da NATO, a desvalorização das Nações Unidas, a mudança da embaixada americana de Telavive para Jerusalém, o muro do México, a hostilização da União Europeia, a negação do aquecimento global, e todos os retrocessos incorporados no "Make America Great Again", só dão para admitir o pior.
Diz-se que, mais que divididos, os americanos estão arrependidos. Nunca um presidente tomou posse com tão baixos níveis de popularidade. Mas também nunca um presidente fora eleito com tantos (3 milhões) votos a menos que o adversário. Nem com ideias tão perigosas... E fala-se já num impeachement, a curto prazo. Não faltarão certamente razões, mas também não faltavam para que não fosse eleito!
Mês e meio depois depois das eleições, desta vez na segunda terça-feira de Novembro porque na primeira era feriado - e para os americanos os feriados são para descansar e "curtir", não são para votar - cumpre-se hoje, e só hoje, a verdadeira e decisiva eleição do presidente dos Estado Unidos da América.
É verdade: é hoje que Trump será eleito presidente, porque é hoje que os grandes eleitores eleitos há mês e meio vão cumprir a constituição, votando eles agora directamente nos candidatos que então se apresentaram ao voto popular. Que, como bem se sabe, foi em maior parte para a candidatura de Clinton: mais de 2,5 milhões de votos a mais!
Em tese, os resultados da voltação de hoje deste colégio eleitoral podem impedir a eleição de Trump. Não faltaram de resto manifestações e processos com esse objectivo, e o espírito da lei constituicional é esse mesmo: que uns cidadãos mais esclarecidos possam corrigir a vulnerabilidade popular à demagogia e ao populismo.
Ironia máxima: a lei que a Trump aproveita foi exactamente feita para evitar que Trump fosse eleito. Como o feitiço se virou contra o feiticeiro...
No fundo sempre achamos que haveria de aparecer a barreira que travaria Trump, o crivo por onde não poderia passar. Como todos falharam, ainda há quem queira pensar que seja este, no último, "in extremis" que tudo acabe por se resolver. Como quando acordamos de um pesadelo. Mas isso é continuar a dormir...
O homem que faz do governo da maior potência mundial um clube de milionários - para reunir tanto dinheiro como Trump junta na sua administração, numa pequena sala. era preciso encontrar um local onde coubesse um terço dos americanos! -, que já distribuiu todas as raposas por todos os galinheiros, e que já começou a brincar com o fogo, vai mesmo ser hoje confirmado com o 45º presidente dos Estados Unidos da América. E daqui por um mês, como sempre a 20 de Janeiro, passará mesmo a ocupar a Casa Branca de pleno direito.
Só agora terminou a contagem dos votos dos americanos nas eleições presidenciais. E com algumas novidades. E até algumas surpresas!
Não é novidade que Hillary Clinton foi mais votada que o presidente eleito. Soube-se logo na própria noite das eleições. O que é novidade é a expressão dessa diferença, a favor da candidata derrotada. Mais que novidade, é até surpresa tenha obtido mais dois milhões de votos que Trump.
Mesmo ainda antes de conhecida em toda a sua extensão, esta circunstância tinha já suscitado uma petição dirigida ao colégio eleitoral, assinada de imediato por milhões de americanos, para que os grandes eleitores não respeitassem o mandato do Estado que representam, mas o do voto popular. Para que, no próximo dia 19 de Dezembro votassem no candidato efectivamente mais votado, o que a Constituição americana prevê mediante o pagamento de uma multa. Que os subscritores se dispunham a pagar…
Agora, um grupo de reputados especialistas em informática emitiu um relatório que sugere que o voto electrónico em três estados que deram a vitória a Trump teria sido manipulado, conclusão a que chegaram depois de análise estatística aos votos contados através de sistemas informáticos e aos contados por métodos tradicionais. E entregou-o à equipa de Hillary Clinton com a recomendação de impugnar os resultados e de requerer a recontagem dos votos.
São já muitos, e muito visíveis, os sintomas de que a maior democracia do mundo está doente. Bem sei que há gente que gosta de dizer que há quem diagnostique estas doenças sempre que os resultados não convergem com as suas opções. Mas se isso não for reduzir os problemas a uma expressão tão simples que os desvirtua, é apenas retórica descartável!
O mundo continua perplexo com a eleição de Donald Trump. Indignado, revoltado mesmo: como é possível que os americanos tenham entregue os comandos do ainda mais influente país do mundo a um aventureiro, populista, arruaceiro, racista, xenófobo, fascista, retrógrado, reaccionário e, depois de tudo isso, ignorante e incapaz?
Como é possível que os mais excluídos dos americanos, as minorias, tenham votado em quem, de forma clara e repetida, garantiu perseguir sem tréguas? Como é possível que os americanos acreditem em quem mente com tanta falta de pudor? Como é possível que os americanos acreditem que alguém lhes resolve os problemas sem lhes apresentar soluções?
Pode dizer-se que é porque Hilllary Clinton não era apenas um candidata que não entusiasmava ninguém. Era mesmo a pior candidata possível, e o melhor adversário que Trump poderia desejar. Pode dizer-se que é o resultado da decadência das democracias ocidentais. Dos valores que se permitiram perder. Do vazio de respostas de um sistema que perdeu regras e limites. Do esgotamento das elites políticas, acomodadas no seuconforto ao sofrimento dos outros… E em grande parte corruptas.
Pode dizer-se tudo isso e muito mais. Mas pode também dizer-se que a América é isto mesmo. Que há na América duas Américas: uma, moderna e de vanguarda, da ciência, das universidades, da inovação, da tecnologia; e outra profundamente retrógrada, atrasada, com séculos de atraso, e fechada ao e do mundo. Ou que o sistema eleitoral – que curiosamente não se vê muito questionado – está ultrapassado e desfasado da actual realidade sociológica...
Há 16 anos, Al Gore ganhou claramente em votos, mas quem foi eleito foi Bush (filho). Agora, Hillary foi humilhada pelos resultados eleitorais. E no entanto, mesmo assim, foi a mais votada!
Apetece odiar os americanos, porque "isto" não é só com eles. Mas não vale a pena ...
Vale antes a pena pensar como é possível que a uma personalidade com a dimensão de Obama suceda um tipo tão reles como Trump. Porque, aí, encontramos política: a derrota da política!
Para os mais distraídos, para os que teimam em não perceber que, com Trump, o mundo se tornou num sítio bem mais perigoso, é ver donde vêm as reacções de júbilo: Marine Le Pen, Victor Orban, Vladimir Putin...
Dois candidatos que não entusiasmam muita gente, nem lá nem no resto do mundo. Verdadeiro entusiasmo, de resto, só Trump desperta. Mas apenas por lá.
Uma coisa é certa: Trump é o melhor adversário que Hillary Clinton poderia desejar. E, curiosamente, o inverso também é verdadeiro.
Clinton pode ganhar. São maiores a suas possibilidades, apesar de tudo. Mas muito provavelmente não ganharia a nenhum outro adversário ... convencional, digamos assim. Se ganhar, Hillary não ganhará pelos seus méritos. Ganhará porque é preciso evitar que um tipo como Trump ganhe.
Trump pode não ganhar. Mas - cruzemos os dedos - tem ainda algumas possibilidades de vir a ganhar. Contra outro candidato - já não diria contra qualquer outro, mas contra outro candidato menos comprometido com o sistema, mais transparente, mais de carne e osso e menos de plástico - já não teria qualquer possibilidade.
E assim cá estamos de coração nas mãos. À espera... Apenas á espera, mas sem conseguir evitar roer as unhas...
De repente, o cenário eleitoral das presidenciais americanas virou-se de pernas para o ar. Aquilo que os debates televisivos pareciam ter garantido, não está mais garantido e a ameaça de Trump poder vir a ser presidente da ainda mais influente potência mundial é agora mais real. Mais real do que alguma vez tinha sido, e mais assustadora ainda. Até porque ganhou forma e dimensão depois de estar praticamente aniquilada.
Tudo isto porque o FBI, a uma semana das eleições, decidiu entrar de repente pela campanha dentro. À bruta, e sem pré-aviso!
Na sexta-feira, o director nacional do FBI, James Comey, enviou uma carta ao Congresso dando conta de reabrir a investigação aos mails de Hillary, que tinha sido dada por concluída em Julho. O tema, recordo, tem a ver com a utilização, por parte da Srª Clinton, enquanto responsável pela diplomacia americana no primeiro mandato de Obama, de contas privadas de correio electrónico, e portanto à margem dos requisitos de segurança do Estado. Em causa estava se essa utilização tivera o propósito intencional de desviar informação dos canais normais, e em causa está que é crime utilizar essas contas privadas para veicular informação classificada de segredo de estado.
Se o assunto estava encerrado, que sentido tem reabri-lo a uma semana das eleições?
Bom, o senhor do FBI diz que, ao investigar um congressista (Weiner), acusado de troca de mensagens de cariz sexual com uma menor, que fora casado com uma assessora da então Secretária de Estado, foram encontrados no seu computador novos mails, que eventualmente poderão conter informação classificada. E diz que, ao ter disso conhecimento, não o revelar seria favorecer Clinton.
O que não diz, mas toda a gente vê, é quem favorece, revelando-os. Pois... O que toda a gente no mínimo percebe é quem o Sr Comey decidiu favorecer, a oito dias das eleições. Quando sabe que não tem sequer tempo para concluir a investigação, e que acaba de lançar para o ar coisas - decisivas - que não tem condições de deixar provadas.
O patrão do FBI decidiu lançar uma bomba de elevado efeito destruidor para favorecer Trump. E lançou. Não é a primeira vez que o FBI se porta mal... Não é a primeira vez que o FBI alinha pelo lado mais reaccionário da América. É comum!
E nem é preciso recuar ao sinistro J. Edgar Hoover...
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