O Barcelona voltou a ser cilindrado pelos alemães do Bayern de Munique, desta vez em pleno Nou Camp, aos olhos incrédulos dos seus adeptos. Habituados já a ficar à porta da final – apenas por duas vezes nos últimos cinco anos lá chegaram – não esperavam que fosse desta maneira. Primeiro tinha sido o Inter, de Mourinho, a fechar-lhe a porta. Depois, há um ano, o Chelsea. Ambos – que, curiosamente, viriam a erguer o mais apetecido troféu de clubes - à custa do autocarro, de uma estratégia de jogo ultra defensiva que, em última análise, revelavam inequívoca vassalagem à superioridade da equipa de Messi, Iniesta e Xavi. De Guardiola!
Para os adeptos, não é a mesma coisa que a sua equipa seja afastada dos títulos por adversários inferiores, que aceitam, sem questionar, a sua superioridade ou por um adversário que acaba de exibir uma superioridade incontestável. Os adeptos que enchem sempre Camp Nou simplesmente viram que era o Bayern a jogar o futebol que a sua equipa queria jogar. Mas que não podia!
Mais do que à inversão dos papéis, assistiu-se à passagem do testemunho. O Barcelona entregou ao Bayern, em pleno Camp Nou, no coração do orgulho culé, o seu estatuto de maior equipa de futebol dos últimos anos. Uma passagem do testemunho com um simbolismo indisfarçável: o Barcelona deixa de ser o melhor quando perdeu Guardiola; o Bayern passa a ser o melhor quando ainda vai receber Guardiola!
Gary Lineker, que apesar de ter sido um grande jogador de futebol, e um dos maiores símbolos do fair-play, arrisca-se a ficar mais conhecido como criador de máximas do futebol - é sua, a mais célebre definição de futebol: onze contra onze e no fim ganham os alemães – dizia, no fim do jogo de Munique, que Guardiola fazia muita falta a uma daquelas duas equipas, e que uma não era o Bayern.
Assim é. A saída de Guardiola apressou o fim do ciclo do Barcelona. E este super Barça acaba por passar pelo ciclo de domínio das equipas que marcam uma era, com apenas dois títulos europeus. Dois títulos nos cinco anos da sua era - como acontecera com o Benfica na sua era de sessenta – é muito pouco. Tão pouco que é igualado por equipas que nunca atingiram esse estatuto, como o Nottingham Forrest, de que hoje ninguém se lembra. Ou mesmo como o Inter de Milão, que não sendo o ilustre desconhecido da terra de Robin dos Bosques, também os conquistou sem ter marcado uma era. Longe pois do Real Madrid, do Milan, do Liverpool, do Ajax ou do mesmo Bayern que, das suas eras, e eventualmente sem terem atingido o mesmo esplendor, tiraram bem maiores dividendos.
O Barcelona, para muitos a melhor equipa de futebol de todos os tempos, foi massacrada em Munique. Destroçada e humilhada pelos alemães do Bayern: quatro a zero, e podia bem ser pior!
As estrelas não se chamaram Messi - andou por lá a camisola 10, mas só isso - Iniesta ou Xavi. Chamaram-se Roben, Ribery e Muller, e fizeram gato sapato deste Barcelona. Que teve bola, como sempre, mas sem sequer a conseguir transportar. A uma deficiente condição física, agravada por um relvado propositadamente encharcado, juntou-se uma condição psicológica ainda mais baixa e um treinador mumificado, que nunca percebeu o que lhe estava a acontecer.
E pronto, Heynkes - para mim, a par de Artur Jorge, o pior treinador da História do Benfica, que pôs o João Pinto na rua - que se dava como irremediavelmente perdido para a alta roda do futebol, deixa um testemunho bem pesado a Pep Guardiola. Leva o Bayern a duas finais consecutivas da Champions. E parece que, ainda antes de percebermos como perdeu a do ano passado, para o Chelsea, já todos percebemos como irá ganhar esta!
Ah! Já que se fala tanto de árbitros... É que o de hoje, o Sr Kassai, uma espécie de Pedro Proença da UEFA, deixou dois penaltis por marcar e validou dois golos irregulares. Mas não foi por isso que o Barcelona saiu hoje de rastos de Munique!
Levando a sua estratégia italiana até ao fim o Chelsea é finalmente campeão europeu, na segunda vez que atinge a final. Parece que está descoberta a receita de Abramovich: despedir um treinador português e entregar a equipa ao adjunto da casa!
Desta vez Mata fez de Cristiano Ronaldo e Schweinsteiger, sem escorregar, de Terry. De resto, tendo sido um jogo recheado de incidências e de emoção, não foi um grande jogo. As estrelas da equipa bávara simplesmente não apareceram no jogo em que o Bayern tinha apostado toda a época. Robben e Schweinsteiger estiveram mesmo nos momentos mais desastrados da equipa, o primeiro a falhar um penalti decisivo, já no prolongamento – que levou Heynkes, e bem, a afastá-lo da lista de marcadores dos penaltis que decidiriam o campeão -, e o segundo, infeliz, a falhar (com a bola no poste) o último e decisivo dos pontapés que couberam à equipa.
De resto, apenas algo que ocorreu ao minuto 66 merece destaque. É cobrado um pontapé livre a favor do Bayern, sobre a direita e já perto da grande área do Chelsea. Ashley Cole salta à bola já dentro da área e ela bate-lhe na parte superior do braço. Pedro Proença – e bem – manda seguir!
Ironicamente – ou talvez não - esta jogada é a cópia mais fiel que se possa imaginar de uma outra que se passou em Braga, naquela famosa partida em que sempre que o Benfica acelerava a voltagem do jogo rebentava a instalação eléctrica da Pedreira. Substitua-se Cole por Emerson e a camisola azul pela vermelha e... voilá!
Como toda a gente sabe, o árbitro Pedro Proença marcou penalti que, a meias com os apagões, acabou por garantir o empate ao Braga! O mesmo Pedro Proença, o mesmo lance, as mesmas circunstâncias de jogo… mas juízos opostos. Depois digam que não há coisas… Ou coiso, como diz o outro!
E, no apuramento do Bayern para a final, nem sequer entra aquela coisa estranha a que se convencionou chamar sorte. A sorte que acompanhou o adversário - que receberá no seu estádio - da final ao longo de toda a prova. Basta lembrar que, quando perdeu em Nápoles por 3 a 1, ainda com Vilas Boas, poderia ter perdido por seis ou sete. Ou a sorte (e não só) que, a seguir, teve nos dois jogos com o Benfica. E a que teve com o Barcelona, em ambos os jogos.
Se o Bayern entrou no Barnabéu com um pequeno saldo credor de sorte – a de ter marcado o golo da vitória em Munique já mesmo no final – a verdade é que aos seis minutos de jogo os pratos dessa balança já estavam equilibrados.
A partir daí desequilibraram definitivamente a favor do Real Madrid. Que aos catorze minutos, e sem que o Neuer tivesse efectuado uma única defesa, já ganhava por dois a zero e tinha o apuramento no bolso. Apenas oito minutos mediaram entre o primeiro e o segundo golo de Cristiano Ronaldo e do Real. Nesse espaço de tempo o Bayern criou três oportunidades claras de golo…
A partir do minuto seis, e até ao fim do minuto noventa, o Bayern foi sempre superior. Apenas no prolongamento, em que o medo de sofrer um golo se sobrepôs a tudo e a todos, haveria algum equilíbrio. Dito isto, parece-me que a justiça do apuramento do Bayern é inquestionável. Se antes do jogo Mourinho dissera que o Real Madrid merecia estar na final, agora, no fim, não o poderá repetir. Sob pena de cair na mentira, ou mesmo no ridículo!
O Bayern não é só uma grande equipa. Foi uma grande equipa, com um meio campo que nãoengoliuapenas o meio campo madrileno.Engoliutoda a equipa de Mourinho!
O Bayern é uma equipa fortíssima fisicamente. E depois, quem tem Neuer (que nem precisou de se mostrar, quem precisou disso foi Casillas), Lham, Schweinsteiger, Luís Cláudio, Ribery, Roben, Mário Gomez ou Muller, tem que ser mesmo uma grande equipa.
O resto é o jogo, é jogar à bola, coisa que a equipa bávara fez muito mais que … os jogadores do Real Madrid. Que foram muito menos equipa (terão chegado a sê-lo?) e que estiveram, praticamente todos (excepção de Casillas - que defendeu tudo o que havia para defender e ainda dois penaltis, tantos quanto o seu colega do outro lado – e, de alguma forma, Cristiano Ronaldo), abaixo do que podem e do que devem.
Estranho é que Mourinho tenha também apostado nos penáltis. Ou talvez não, talvez tenha percebido que não tinha argumentos para aquele Bayern. Mas, tendo apostado – agora é fácil, claro, mas eu senti-o e manifestei-o na altura -, deveria ter tido outro critério na escolha dos jogadores. Cristiano estaria sempre entre os eleitos, evidentemente (mas nunca deveria ser o primeiro a marcar), mas…o Sérgio Ramos?
Foi um rude golpe nas aspirações de Mourinho. E de Cristiano Ronaldo. Para o primeiro, a consequência imediata deverá ser a sua continuidade em Madrid por mais um ano. Com o campeonato e a Champions (a terceira, por três clubes diferentes, o seu grande objectivo pessoal) no bolso Mourinho abandonaria os merengues: tão claro como água. Para o segundo, a consequência vai mesmo ter quer ser um grande europeu. A vantagem da Champions em relação a Messi, já foi.Queda la copa de Europa, por supuesto!