O ministro, o agora truculento Pires de Lima, entende que os trabalhadores da TAP se dividem entre os que pertencem ao sindicatos que chegaram a acordo com o governo e os outros. E que os outros podem ser despedidos, ao contrário dos sindicalizados nos tais sindicatos, a quem o governo garante protecção enquanto o Estado se mantiver no capital da companhia.
O Secretário de Estado, Sérgio Monteiro, já um ex-libris deste governo, não se limitou a acenar que sim com a cabeça. Repetiu a ideia até à exaustão, ia já alta a noite e lá continuava ele com toda a convicção a pregá-la. A difundi-la ao mundo... Nem ele nem o ministro tinham ainda reparado que não podia ser assim... Que estas coisas da Democracia e do Estado de Direito, por muito que lhes custe, não permitem ao governo tratar diferenciadamente os cidadãos, premiando os que o apoiam e penalizando os outros...
Terá já sido durante o sono que Pires de Lima acordou para a realidade, a tempo de pedir ao primeiro-ministro que, assim que chegasse ao hemiciclo para o debate quinzenal, desmentisse aquilo da melhor forma que entendesse. Isto a acreditar em Passos Coelho, que não é coisa que ele mereça. Se não o fizermos lá teremos que admitir que Pires de Lima e Sérgio Monteiro ainda agora estão convencidos que têm um país só para eles, e que Passos é que lá teve que lhes tirar o tapete para, mais uma vez, tentar minimizar prejuízos...
Em todas as últimas privatizações, todas as administrações das empresas objecto de privatização estiveram invariavelmente de acordo com o modelo de privatização escolhido pelo governo. Em todas as últimas privatizações, as administrações das empresas objecto de privatização asseguraram a sua continuidade na gestão das empresas privatizadas...
Aí está uma nova polémica. Desta vez é a guerra aberta entre António Costa e o PS, por uma lado, e Passos Coelho, o governo e os partidos da coligação, por outro, à volta da leitura do Memorando da Troika, no que respeita à privatização da TAP.
Entre os vários links que o Quinta Emenda disponibiliza ao longo da sua margem direita, encontra-se o Memorando da Troika, logo a seguir ao Futebolês. Trata-se da tradução portuguesa da versão original, justamente aquela que António Costa reclama para a sua verdade. E com toda a razão, como pode confirmar-se:
No capítulo "Privatizações"(3.31), na página 14, diz que "... para o período que decorre até 2013 abrange transportes (Aeroportos de Portugal, TAP, e a CP Carga), energia (GALP,EDP, e REN), comunicações (Correios de Portugal), e seguros (Caixa Seguros)... O plano tem como objectivo uma antecipação de receitas de cerca de 5,5 mil milhões de euros até ao final do programa, apenas com alienação parcial prevista para todas as empresas de maior dimensão. O Governo compromete‐se a ir ainda mais longe, prosseguindo uma alienação acelerada da totalidade das acções na EDP e na REN, e tem a expectativa que as condições do mercado venham a permitir a venda destas duas empresas, bem como da TAP, até ao final de 2011".
O que António Costa diz é rigorosamente o que está escrito na tradução portuguesa. O porta voz do PSD, Marco António Costa, veio defender -se com o original em inglês, sugerindo erros de tradução e dizendo que é esse que conta.
O original em inglês - curiosamente ali é o ponto 3.30 do capítulo relativo às privatizações - diz que "... The existing plan,elaborated through 2013, covers transport (Aeroportos de Portugal, TAP, and freight branchof CP), energy (GALP, EDP, and REN), communications (Correios de Portugal), and insurance (Caixa Seguros)... The plan targets front-loaded proceeds of about €[5.5] billion through the end of the program, with only partial divestment envisaged for all large firms. The Government commits to go even further, by pursuing a rapid full divestment of public sector shares in EDP and REN, and is hopeful that market conditions will permit sale of these two companies, as well as of TAP, by the end of the 2011".
O documento de tradução para português começa logo com uma nota que avisa e esclarece que, em caso de divergência, é original em inglês que vale. Como se vê, não há qualquer divergência. O que está traduzido para português corresponde exactamente ao que está escrito em inglês, pelo que se conclui, com grande faciidade, que o argumento porta voz do PSD não é mais do que aquilo a que já nos habituou.
Ontem à noite, dizia-me um colega e amigo - que muito respeito, muito entendido nestas matérias, mas também algo vulnerável às teses deste governo - que o governo tinha razão. Que no original havia um "as well as of TAP" a seguir à referência á privatização total da EDP e da REN. Expressão que, a ser assim, colocaria a TAP no mesmo saco da REN e da EDP.
Não é assim. A verdade é que a expressão não se refere à privatização total mas tão só, como se lê perfeitamente quer em inglês quer em português, ao timing das respectivas operações de privatização: na espectativa de condições de mercado para as realizar até ao fim de 2011. Permanecem intocáveis, e prevalecem, os dois pilares do capítulo: "receitas de cerca de 5,5 mil milhões de euros até ao final do programa, apenas com alienação parcial prevista para todas as empresas de maior dimensão"!
Não há lugar a qualquer dúvida. António Costa tem razão. Infelizmente, como é habitual, o governo e a maioria não deixam fugir uma oportunidade para lançar a confusão, estando-se verdadeiramente nas tintas para a verdade. Como diz o outro, não lidam maravilhosamente com a verdade!
O Conselho de Ministros decidiu não vender a TAP ao plurinacional Senhor Efromovich. Vale a pena uma opinião pública crítica. Vale a pena protestar e agitar consciências…
Ontem, no Parlamento, Vítor Gaspar teve mais uma das suas habituais prestações. Para além de voltar a falar dos impostos como se neles não tivesse qualquer responsabilidade, e de se transformar os falhanços rotundos e grosseiros das suas previsões em acertos raramente vistos em tempo de recessão, salientou os verdadeiros mas escassos aspectos positivos: a descida dos juros da dívida pública, a redução do défice primário e … o aumento da credibilidade do país.
Se a descida das taxas de juro da dívida pública nos mercados secundários e a redução do défice primário são dados objectivos e factos provados, o aumento da credibilidade externa do país já o não é. Não há nada que a meça, apenas se poderá concluir a partir de dados e indicadores que possam apontar nesse sentido. O comportamento das taxas de juro até poderá ser um deles, mas só isso!
Mas quando um jornal como o El País diz que o governo está a vender Portugal e se refere, da forma que o faz, aos processos das privatizações recentes, como a da EDP, ou em curso, como as da TAP e da RTP, não há razão nenhuma para avaliar em alta a credibilidade do governo. Que é quem precisamente faz a do país!
As privatizações, neste último acto que rapa o que do pote sobrou para rapar, estão a revelar-se autênticos negócios da China. E não é porque as primeiras, quando o negócio foi energia, o tenham sido em sentido literal. Em sentido literal e no outro!
O modelo da negociação directa, a que o governo agora lançou mão, é também propício a isso. E a falta de transparência na negociação directa apenas faz crescer a suspeição!
Vem isto a propósito da privatização da TAP, onde, ao que parece, o Estado se apresta a entregar a transportadora aérea nacional ao milionário multinacional - tem, pelo menos, nacionalidade polaca, brasileira e colombiana - Germán Efromovich, por 20 milhões de euros. É a única proposta, mais ninguém se mostrou interessado!
A opção de abrir mão de uma companhia de bandeira como a TAP é tudo menos pacífica. Haverá certamente um milhão de argumentos para defender a privatização. Tantos quantos os que podem ser usados em sentido contrário!
Vamos por isso deixar de lado esse pormenor (ou pormaior?) do sentido - e da própria qualidade - da decisão de privatizar a nossa transportadora aérea, e foquemo-nos apenas nos dois factores mais decisivos da operação: precisamente o valor (20 milhões de euros) e a falta de propostas alternativas.
Vinte milhões de euros será sempre um valor ridículo. Mais do que ridículo: de fazer rir. Um valor que nem por símbolo pode ser tomado!
Argumenta Efromovich que a proposta é de 320 milhões de euros (argumenta até mais, que ainda assume o todo o passivo, como se não assumisse também o activo…): 300 milhões para injectar no capital da sociedade e os tais 20 milhões para os cofres do Estado. Não é verdade, tal como não é legítimo referir-se ao passivo. Propõe-se a adquirir a TAP por uns míseros 20 milhões de euros – dá vontade de dizer que até o trágico BPN, em circunstâncias não muito diferentes, foi nominalmente entregue pelo dobro – e, depois, investe 300 milhões na empresa!
O valor de uma empresa depende de uma série de variáveis. Que não só financeiras e muitas mais que as que decorrem do seu balanço. A TAP foi evidentemente avaliada. Não se poderá entender que alguém se prepare para vender um bem, seja ele qual for, sem ter uma ideia do seu valor de mercado. O governo tem evidentemente esses dados. É discutível se os deveria tornar públicos, se bem que a sua divulgação fosse um contributo decisivo para a transparência que reconhecidamente está afastada deste processo. O que já é indiscutível é que, agora, tenha que o ser!
Outros dos pecados destas privatizações é o timing. Vender, nas actuais condições de mercado, é desastroso e só o faz quem está com a corda na garganta. A opção de avançar com operações de privatização é, nesta altura, uma opção de vender em saldos. É essa a opção que o governo fez!
Mas uma coisa é saldar a TAP, outra é vendê-la por um preço meramente simbólico apenas porque é a oferta do único cliente que bateu à porta. Se apenas há um cliente, e se esse único cliente está longe de oferecer o preço justo, só resta a opção de não vender.
Se não for esta a opção, e o governo não explicar tudo muito bem explicadinho...
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