A crise do sistema partidário: IV* – a reforma
Convidado: Luís Fialho de Almeida
Factos e opiniões a que não ficamos indiferentes:
António Coutinho - director do Instituto Gulbenkian de Ciência de 1998-2012, professor catedrático da Faculdade de Medicina de Lisboa, mais de 450 publicações e um dos cem cientistas mais influentes e citados do mundo (in Institute for Scientific Information) - reconhece a urgência de alterar o processo representativo do povo (RDP2, Quinta Essência, 03.06.2011). “Os partidos são uma espécie de cancro da democracia. A relação entre os partidos e o eleitorado fica contaminada quando há uma relação de interesse no voto das pessoas a quem os partidos falam. Há uma raiz demagógica nessa relação, sempre que a representatividade se faça pelo voto partidário. A melhor representação de uma população numa Assembleia representativa do país é uma amostra ao acaso, cujo numero de representantes é tecnicamente possível encontrar de acordo com a dimensão do país, para que, à semelhança dos júris dos tribunais americanos, não legislando, decidam. Aos partidos cabe a nobre missão de educar e convencer as pessoas das suas razões e princípios que consideram mais pertinentes, para que os representantes tomem as melhores decisões”.
É intencional trazer para esta análise a opinião de um cidadão insuspeito, que não é político de carreira nem politólogo, mas credível na carreira profissional, cientifica e no pensamento. Não comento o modelo e a sua viabilidade, mas reforço a urgência do debate como se reconhecia em Agosto de 2014, com o “Manifesto dos 30” apelando à reforma urgente do sistema partidário, ainda que mais centrada no sistema eleitoral e na transparência do financiamento dos partidos. Na esteira deste “Manifesto” vem Cavaco Silva em Outubro de 2014, aquando das comemorações da implantação da Republica, alertar para o risco de implosão do sistema partidário, reconhecendo a insatisfação dos portugueses com a democracia, mas logo centrando o seu apelo na “cultura de compromisso entre os agentes políticos indispensável à estabilidade governativa” (…não seria de esperar outra coisa). António Costa, na mesma circunstância, centra-se na necessidade de diálogo democrático (…nada de compromissos), apesar do seu antecessor António José Seguro ter lançado para debate a reforma do sistema eleitoral.
Creio que a dinâmica das sociedades no mundo actual impõe uma nova visão sobre os modelos de representatividade democrática. É pertinente e urgente que venham a debate modelos que revitalizem a representatividade do sistema partidário, que no formato actual já leva cerca de 300 anos, perante o descrédito generalizado, aqui e em muitos outros países, cristalizando a sempre referida afirmação de Churchill “A democracia é a pior forma de governo, à excepção de todas as outras”
Quanto à missão dos partidos políticos, de acordo com as suas bases ideológicas que os caracterizam de “direita“ ou de “esquerda”, há hoje condicionalismos que os inibem ou favorecem: Assiste-se à elevada dependência dos credores internacionais, das políticas europeias, e das imposições económicas do mercado global, nomeadamente com a supremacia de muitas multinacionais sobre os próprios estados - em Portugal reforçada com a alienação de empresas estratégicas - deslocalizando-se com frequência os centros de produção e do emprego. A riqueza concentra-se e a pobreza generaliza-se. Neste cenário a “esquerda” tem perdido vitalidade no combate e, por cá, como vemos nas candidaturas às próximas eleições legislativas, a “direita” une-se, a “esquerda” divide-se.
Também, do ponto de vista ideológico, se tem assistido à falência das ideologias de “esquerda”, após a queda da ex-URSS, e das alterações na China após Mao Tsé-Tung, enquanto o liberalismo capitalista vai galopando. E nós? Assistimos e constatamos, tal como Churchill (novamente), “A desvantagem do capitalismo é a desigual distribuição das riquezas; a vantagem do socialismo é a igual distribuição das misérias”.
Mas ainda acredito que a rendição é a pior das atitudes.
* Último da série de quatro textos