Acabem lá com o fogo amigo
Começo a contar a história deste Portimonense-Benfica, referente à sexta jornada deste campeonato, e o segundo jogo consecutivo fora, por Roger Shemidt. Diz-se que o seu futebol é previsível. E é. De resto ele próprio o confirmou naquela "summit" qualquer do futebol de há dias, no Porto, quando disse que o Benfica joga sempre da mesma forma.
Se "joga sempre da mesma forma", é previsível, já diria La Palisse. Assim sendo, não seria muito difícil aos adversários contrariá-lo. A verdade é que, na enorme maioria das vezes, não o conseguem. Parece-me que por razões óbvias: porque, sendo previsível, é bem estruturado e executado por jogadores de qualidade que, em condições normais, tornam imprevisível o previsível. É isso que, de resto, permite que o Benfica jogue sempre da mesma maneira, e quase sempre bem.
Roger Schemidt não poderia ter esta ideia de jogo se não tivesse estes executantes. Tendo-os, faz bem em defendê-la.
Roger Schemidt tem impedido a saída de determinados jogadores, considerados fundamentais. Apontava-se-lhe com frequência que lhe faltava comprová-lo, dando-lhes utilização. Hoje comprovou-o, e não apenas no onze inicial, onde lançou Morato, Neres e Florentino - três deles - dois dos quais com implicações posicionais na equipa. Só Florentino rendeu directamente João Neves que, ao intervalo, rendeu directamente Kokçu. Morato, a prever o próximo jogo da Champions, em Milão, com o Inter, "obrigou" Otamendi a ocupar o lugar de António Silva, no lado direito do centro da defesa. E Neres (não faz sentido os adeptos reclamarem da bancada a sua entrada, como lamentavelmente aconteceu na quarta-feira), jogando na esquerda, "enviou" João Mário para a posição deixada livre por Di Maria. Talvez lesionado, ou talvez poupado. Como fazia sentido.
Criticar as opções de Roger Schemidt não é pecado. Pecado é fazê-lo com a ligeireza "do oito ao oitenta" dos adeptos, sempre disponíveis para embarcar em processos auto- destrutivos.
Dito isto, o Benfica não deixou milho para os pardais, lançou-se ao jogo como lhe competia e teve 25 minutos avassaladores. Como é habitual só que, hoje, sem dar tempo para os pardais aparecerem. E tudo começou logo a correr bem, com o primeiro golo aos 5 minutos. E melhor ainda por ter sido um grande golo e marcado por Bah, um dos jogadores mais necessitados de auto-confiança. E na realidade um dos mais afastados do desempenho da última época.
Quando, aos 17 minutos, Musa marcou o segundo, já a avalanche do futebol benfiquista em Portimão justificava mais golos. É compreensível que o elevadíssimo ritmo dos primeiros 25 minutos não possa ser mantido durante todo o jogo. É normal que assim seja, e o Benfica moderou a pressão no acelerador. Só aos 27 minutos o Portimonense conseguiu fazer a bola chegar à grande-área do Benfica, já o campeão nacional tinha desperdiçado oportunidades para duplicar o marcador. Na realidade nem lá chegou, simplesmente a sobrevoou.
Ainda assim, com mais moderação, o jogo corria bonito e de feição. Com dois "se nões": a recorrente falta de eficácia (Rafa acrescentou mais dois desperdícios - aos 32 e aos 36 minutos - aos anteriores); e a lesão de Bah que, com o grande golo que marcou, tinha tudo para estabilizar emocionalmente, e logo num lugar para que a alternativa ... é Aursenes. Só porque é alternativa para tudo!
Ao intervalo Roger Shemidt fez umas inéditas três substituições: Bah, lesionado, pelo regressado Jurasék - que foi para o seu lugar na esquerda, passando o norueguês para a direita - Musa, pelo "necessitado" Arthur Cabral, e Kokçu por João Neves. Nada que fizesse baixar o nível exibicional da equipa.
O ponta de lança brasileiro não faz o que Musa faz, não tem o mesmo impacto na pressão e na recuperação defensiva, mas nem isso era problema. E dava até indicações claras de maior entrosamento com o resto da equipa. O golo é que continua muito arredado. Chegou a parecer que seria hoje, mas não voltou a aproveitar as oportunidades de que dispôs.
E lá voltou a acontecer o que tantas vezes tem acontecido. Depois dos 10 minutos iniciais, com mais três oportunidades desperdiçadas - Rafa, Neres e Arthur Cabral -, e de uma habilidade do árbitro Helder Malheiro, que entendeu que, não assinalar uma falta sobre Rafa na meia lua, era vantajoso para o Benfica, de uma perda de bola de Neres na área adversária saiu um contra-ataque e o golo. No primeiro remate à baliza. E Trubin voltava a sofrer mais um golo sem ter uma única defesa para mostrar.
Nem deu para pensar na malapata do 2-0. Nem para lembrar como vem sendo tão frequente transformar uma goleada virtual num assustador 2. É que, no minuto seguinte, nova perda de bola, remate à queima em cima de Morato e ... más notícias do VAR. Aquilo era para penálti, disse. Música para os ouvidos de Helder Malheiro.
Pela quarta vez numa semana, e em três jogos, Trubin tinha a bola ali a 11 metros, pronta para lhe entrar na baliza. Se tinha corrido bem com o golo de Bah, melhor correu com a defesa do penálti. O guarda-redes do Benfica, acossado e pressionado por todo o lado, em autêntico bulling, defendeu. Deu o corpo às balas de tanto fogo, muito dele dito amigo, e defendeu muito mais que um penálti.
Agora, deixem-no em paz!
E um jogo que em poucos segundos passara virtualmente de goleada a empate, voltava a poder ser o mesmo que sempre tinha sido. A tranquilidade chegara nas luvas de Trubin. O golo da dita, o terceiro, chegaria 5 minutos depois, na classe de Rafa (o que joga este rapaz, lembrem-se do Grimaldo!). Ganhou a bola a um adversário e foi por ali fora, como só ele sabe, até a entregar para a finalização de Neres.
Assunto resolvido. Faltava jogar meia hora. Muito tempo, mas apenas tempo para mais quatro (quatro!) oportunidades para ampliar o marcador. E para lhe dar, no mínimo, um ar que tivesse alguma coisa a ver com o que foi o jogo.
Nos resultados, este campeonato vai equilibrado. De uma maneira ou outra, mais de uma do que outra, todos vão encontrando maneira de somar 3 pontos a cada jogo. Seja preciso o tempo que for, seja precisa a batota que for. A jogar à bola é que a diferença é muito grande!