As percepções
Assinalou-se ontem, dia 18, o dia internacional das migrações. Em Portugal, quando não se fala de outra coisa, não se deu por isso.
Diz-se que a execução do PRR não avança por falta de mão de obra. Que a construção do novo aeroporto ficará em causa. Auscultam-se as empresas e a maior dificuldade que revelam - não, não é o IRC - é a falta de mão de obra. O equilíbrio financeiro da Segurança Social é mantido precisamente pela contribuição dos imigrantes.
E no entanto o país debate os perigos da imigração. Na saúde, na educação, na segurança ...
O Barómetro da imigração realizado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, dado a conhecer há dois dias, dá conta que os portugueses acham que há imigrantes a mais. Têm até a percepção que são já 40% da população. Na verdade, a totalidade de estrangeiros com autorização de residência em Portugal é de 1.164.606 pessoas (dados de 31-10-2024), pelo que os verdadeiros imigrantes não serão muito mais de 10%.
Por muito que as estatísticas e relatórios de segurança o desmintam em absoluto, os portugueses - dois terços, conforme aquele barómetro - acreditam que os imigrantes contribuem para um aumento da criminalidade.
O país que precisa de centenas de milhares de imigrantes, é o mesmo que acha que eles já são de mais. O país que é tido por um dos mais seguros do mundo, é o mesmo que tem percepção de insegurança.
É o novo fenómeno da percepção, introduzido pela extrema direita através do extraordinário instrumento de manipulação de sensações que são as redes sociais. Introduzida em vastos segmentos da sociedade, a percepção passa a comandar largos sectores de eleitorado. A partir daí é a democracia a funcionar em regime de auto-destruição.
Primeiro são os próprios partidos da extrema direita a capitalizar a percepção. E a entrar nos diversos eleitorados. Depois, lideranças políticas frágeis, e a mera visão instrumental do voto, desencadeiam a reacção à perda de eleitorado, e transformam a percepção em realidade política.
É a isto que estamos a assistir em Portugal. Em grande parte do mundo também não é muito diferente.