Corrente de ar
Não sabemos no que vai dar, mas a detenção de Joe Berardo e do seu advogado surge como uma lufada de ar que entra por uma janela que se entreabre numa sala congestionada de ar absolutamente irrespirável.
Depois dos desfiles pelas comissões parlamentares de inquérito, e das respectivas prestações televisivas, de tantas figuras de proa dos negócios em Portugal, iniciados até pelo próprio Berardo, o que mais faltava era que nada se passasse. Que ninguém, para além de nós todos, pudesse achar que não teria de haver alguma coisa a fazer.
Berardo é apenas o mais tóxico mito de um país saloio, de deslumbramento fácil. Recebeu comendas das mãos de insuspeitos e respeitados Presidentes da República, encheu horas de televisão e páginas de jornais e revistas. Fez os negócios que quis, como quis. Os bancos puseram-lhe nas mãos o dinheiro que quis, sem garantias.
Comprava acções com dinheiro dos bancos, garantidos por essas acções. Garantia o risco com o próprio risco, e os bancos achavam graça. De longe acenava-lhes com a famosa coleção de arte, mas só para a verem em exposição. E ria-se. Ria-se muito... E dizia "babe"... E que não devia nada... Que não tinha nada, nem medo de ninguém...
Claro que tudo isso já se passou há muito tempo. O tempo não volta para trás, passa pelas coisas e elas prescrevem. Não há meios ...
Mas há mais comendadores. E mais chicos-espertos que parecem parvos, e só por acaso não são comendadores.