Euro 2020 - E no fim, viva o futebol
Num Wembley arrepiante disputaram a final a selecção com o melhor futebol e a selecção com os melhores jogadores. Selecções, não equipas. Porque, no caso particular da Inglaterra, nem sempre teve os melhores jogadores na equipa. Arrepainte pelo ambiente, e arrepiante pela lotação esgotada por uma multidão alheia ao período pandémico que continua a marcar - e de que forma - a humanidade. Sem uma máscara... Nas imagens não vimos mais que meia dúzia de italianos, uma ínfima parte dos espectadores presente, com essa protecção. Entre os mais de 60 mil ingleses, nem uma.
O jogo iniciou-se com o golo da Inglaterra, ainda antes de concluído o segundo minuto. Muito cedo, ainda sem se ter percebido no que daria o jogo. No entanto em circunstâncias de jogo que se repetiriam com grande frequência durante toda a primeira parte, e por isso a revelar que não foi por acaso. Vale pena resumir a jogada, porque ela tem tudo do que estava preparado para o jogo. Nasce de um canto a favor dos italianos, provocado pela pressão alta da selecção com o melhor futebol. A defesa inglesa interceptou a bola, que sobrou para Shaw, no lado esquerdo, para a entregar a Kane, no meio do seu meu campo. Que a lançou para Trippier corria desalmadamente pela ala direita, para cruzar de primeira para o lado contrário, onde surgiu Shaw, sozinho, a rematar para o golo, com os defesas italianos no centro da área a marcar três jogadores ingleses que serviram de engodo.
Este lance marcou a final. As coisas tinham corrido de forma perfeita a Southgate logo à primeira. Os ingleses passaram a dominar o jogo, mas com o problema de fazerem disso o objectivo do jogo. Pretendiam dominar o jogo apemas para isso, nada mais. E a verdade é que, mesmo dominada, foi a Itália a única equipa a construir ocasiões que poderiam cabar em golo. Apenas duas, é certo, mas as únicas.
Na segunda parte Mancini mexeu na equipa. E bem. A Itália não tem um 9. Tinha um em campo, mas não dá para aquele futebol. Immobile, não dá. E, no banco, outro - Belloti - pior ainda. Por isso tirou o que tinha em campo e jogou sem nenhum.
Os ingleses mantinham que era boa ideia defender o golo madrugador de Shaw - o mais madrugador da História das finais do Camepontao da Europa, e o primeiro deste lateral esquerdo na selecção. Enquanto ia fazendo isso a Itália crescia, e cresceu tanto que quando os ingleses deram por isso era já demasiado grande. As oportunidades de golo apareciam apenas na baliza inglesa. E à terceira o golo acabou por aparecer, a meio da segunda parte. E logo a seguir só não apareceu outro porque não calhou.
E ficou assim até ao fim dos 90 minutos, seguindo-se o prolongamento, naquilo que foi a regra neste europeu. Nunca a competição tivera tantos jogos com prolongamento. E com decisões nos pontapés de penalti, pois apenas dois jogos ficaram resolvidos no prolongamento.
Southgate continuou fiel à sua estranha ideia de manter de fora os melhores. Depois do empate ainda recorreu a um - Grealish, sempre a sua primeira opção- e isso notou-se logo. Parece até ironia, mas os deuses não dormem, e até Sterling estava até a fazer o seu pior jogo. Mais irónico ainda, guardou para o minuto 119 a entrada de Reshford e Sancho. Para os penaltis. E ambos os falharam!
Os deuses do futebol penalizaram, e bem, Southgate. E premiaram, e bem, Mancini. Basta ver que Donnarumma, designado como o melhor jogador da competição, não fez uma defesa durante 120 minutos. Do outro lado, Pickford, teve muito mais trabalho, e de muito maior exigência. E negou o golo até por duas vezes.
Penaltis à parte, mesmo que até aí o guarda-redes inglês tenha feiro a sua parte, ao defender um deles. Porque aí, Donnarumma voltou a ser gigante.
Fica bem entregue a Taça de que Éder - lembram-se? - hoje se despediu em Wembley, para deixar nas mãos de Chiellini.
Não sei se os ingleses ainda querem que amanhã seja feriado. Mas desconfio que não queiram saber para nada que Southgate tenha trazido outro futebol à selecção inglesa. Pena que o tenha traído ao pensar que era assim que ganhava, provavelmente iludido por Fernado Santos.