Foi assim ...
Era como uma final para o Benfica, este jogo de Chaves. Depois de duas derrotas consecutivas, qual delas a mais confrangedora, esta deslocação a Chaves era decisiva. Era uma final!
E, das finais, diz-se que se ganham, não se jogam. Para ganhar, ou antes, para se dizer que se está ali para ganhar, é preciso entrar com tudo. O Benfica só tinha que fazer isso. Mas não o fez.
Pareceu até que não entrou com isso bem metido na cabeça. Sabe-se que os momentos maus não acabam de um momento para o outro, e sabia-se, por isso, que o Benfica não poderia chegar a Chaves e impor o seu futebol, perdido. Mas também não poderia entrar em campo como se nada estivesse a acontecer ao seu futebol. E foi isso que fez.
Entrou como se tudo estivesse a decorrer normalmente, sem sentir a necessidade de recorrer a outros argumentos. Os jogadores não procuraram na determinação, e na vontade de ganhar, compensar a criatividade perdida. Apenas Neres - com a reclamada condição de titular, que animou os media nos últimos dias, promovida pela ausência de Florentino, que fez deslocar Aursenes para o lado de Chiquinho - trazia ao jogo alguma criatividade. E assim correu toda a primeira parte. Com o Benfica por cima do jogo, tendo mais bola, mas nunca sem aquela pressão sobre o adversário - sempre cómodo na sua tarefa de fechar todos os caminhos para a baliza - de quem tem que ganhar o jogo. E depressa.
Bem espremida, a primeira parte deu um remate de Rafa (que continua completamente desinspirado, como os outros, mas nele nota-se mais), aos 19 minutos, que nem deu para assustar o guarda-redes flaviense, e uma jogada para golo, que António Silva desperdiçou com um remate por cima, com a baliza escancarada ali à frente. E deu, nos minutos finais, para, então sim, o sufoco. Um assalto à baliza de Paulo Vítor de que, no entanto, não resultou uma verdadeira oportunidade de golo. Tudo morria na muralha defensiva que os dez jogadores do Chaves construíram à frente do seu guarda-redes.
Mas deu o mote para a segunda parte. Que começou logo com uma grande oportunidade de golo - duas, no mesmo lance - de João Mário. Primeiro foi o defesa Bruno Langa a afastar a bola de cima da linha; na recarga, foi o guarda-redes a fazer o mesmo. Precisamente 5 minutos depois, um contra-ataque rápido do Chaves acabou com o veloz Juninho na cara de Odysseas. Que na única defesa em todo o jogo, acabou a impedir o golo.
O Benfica continuou a mandar no jogo. Com mais assertividade, e mais consistência, que na primeira parte. Mas com o mesmo resultado - muitos cantos, 19 ao todo, todos marcados da mesma maneira, sempre curta e inconsequente. E pouco mais.
Roger Schemidt voltou a tardar com as substituições. Começou por lançar Gonçalo Guedes, a 20 minutos do fim, por troca com Neres, desaparecido do jogo na segunda parte. Dez minutos depois, lançou Tengsted e João Neves, para saírem João Mário e Gonçalo Ramos, ambos muito apagados, mas os melhores marcadores do campeonato. E só a 2 minutos dos noventa algo arrojado - troca de Gilberto por Musa. Só que, nessa altura do jogo, é difícil falar de arrojo.
O Benfica voltara ao sufoco, para os minutos finais. O árbitro, João Pinheiro, deu 5 minutos de compensação e, ao terceiro, nova situação de golo eminente, depois de mais uma defesa milagre do Paulo Vítor a um remate de cabeça de Otamendi. Que se preparava para a recarga, na pequena área, quando o João Pedro, que entrara ao 78 minutos e logo viu um amarelo por "placar" Gonçalo Guedes, que saía disparado para a área flaviense - com João Pinheiro a parar o lance e a interromper um ataque prometedor, quando devia deixar prosseguir a jogada, e exibir o amarelo na primeira oportunidade -, o atinge, de pitons, na canela.
João Pinheiro assinalou falta ... de Otamendi. O Paulo Vítor ficou deitado no relvado, e a sua equipa médica entrou em campo. O VAR, com todo o tempo para ver e rever o lance, obedeceu a Vítor Baía. O guarda-redes do Chaves está bem - nunca tinha deixado de estar -, e cobra o livre, com pontapé para a frente. Otamendi está sozinho, sem ninguém à volta, com a bola na sua direcção. Pode dominá-la no peito. Ou devolvê-la de primeira para o ataque. Não faz uma coisa, nem outra. Recebe-a com o pé, e ela foge-lhe. Escorrega e, de trás, surge a correr um tal Abass, entrado há pouco para reforçar o lado direito da defesa, com a bola ali à frente. Otamendi ainda poderia ter tentado a falta. Sabendo que seria expulso, deixou-o seguir, acreditando num milagre de Odysseas. Não houve milagre, e o Chaves ganhou o jogo, no último minuto.
Foi assim, esta final. Foi assim que o Benfica perdeu o jogo que não podia perder. Foi assim, não fazendo um grande jogo, mas fazendo mais do que o suficiente para o ganhar. Foi assim, com João Pinheiro (e o VAR) a trocarem, no momento certo, um penálti, e uma expulsão (segundo amarelo), por uma falta ao contrário. E transformarem uma (provável) vitória numa derrota. Antes já tinham feito vista grossa a um outro penálti, sobre João Mário. Sim, tem que ser penálti. Porque é igualzinho a um que, no Dragão, uma hora depois, desbloquearia o nulo. E contribuiria para mais uma vitória pelos mínimos (2-1 ao Santa Clara, o último). Só com uma diferença: João Mário não se mandou para o chão antes de rematar, completamente desequilibrado; Toni Martínez atirou-se de imediato ao chão!
Por ter sido assim perdido, o jogo que não se poderia perder, acredito que a revolta se instale no Benfica. E que será suficientemente forte para que não volte perder um ponto, que seja, que não possa ser perdido.