Há 10 anos
No segundo semestre de 2007 a crise financeira internacional começou a mostrar a cara. Era uma crise com origem no subprime americano, que toda a gente já sabe o que é e no que deu. Um ano depois, em 2008 – faz agora três anos – surge o acontecimento que veio virar do avesso o sistema financeiro internacional: a falência do Lehman Brothers.
Por cá atravessávamos uma grave crise económica, com o país já em recessão, depois de quase uma década sem crescimento económico. Depois da entrada do euro, no início da década - e do século e do milénio – a nossa economia não mais crescera. Roubaram-lhe o único instrumento de crescimento que conhecia: a desvalorização cambial!
Mas o governo de José Sócrates, pese embora os sinais de capacidade reformadora, e até de controlo orçamental, que começara por dar, não quis saber. Já a pensar nas eleições do ano seguinte, Sócrates anunciava que Portugal, porque se tinha preparado bem, não seria afectado pela crise internacional e o ministro da economia – o incontornável Manuel Pinho – declarava solenemente o fim da crise. Até às eleições de 2009 todos sabemos o que se passou, com BPN, aumento dos salários da função pública, tudo a esconder e negar a crise. Que, só depois das eleições, o governo finalmente admitiria!
Mas já não era crise, velha de anos, que Manuel Pinho declarara extinta. Não! Agora diziam que era a crise importada, a crise internacional, a tal que Sócrates garantira de que estávamos a salvo. O país começara a perceber que Sócrates mentia, que a crise era a mesma, a velhinha, que não nos largava. Que, PEC atrás de PEC, se agravava a cada dia. A oposição nega qualquer vestígio estrangeiro no genes da crise e o Presidente da República só já depois da entrada em funções do actual governo – que, agora que já não é oposição, também muda de posição - se converte à ideia de que tudo isto provém lá de fora, e que é mesmo a União Europeia a culpada disto tudo.
A crise é evidentemente de origem interna e resulta de mais de uma década sem crescimento, do esgotamento de uma economia desestruturada e viciada. O resto veio depois! Os mercados financeiros, que começaram a pressionar Grécia pela simples razão de que não poderia ser de outra forma – não foi por critérios económicos que a Grécia integrou a UE, foi razões de estratégia geopolítica, cujo preço algum dia teria de ser pago – e, logo a seguir, a Irlanda, porque teve que acorrer ao seu sistema financeiro – esse sim atingido pelo efeito subprime – voltaram-se para Portugal. Por uma simples razão: repararam que um país que não cresce há mais de dez anos, e que nem sequer tem condições de inverter esse bloqueamento, não consegue pagar o que deve.
É esse o nosso problema. O nosso défice orçamental e a nossa dívida pública não seriam problema nenhum se não fosse a nossa crise económica endémica. Não conseguimos, nem ninguém consegue, pagar o que deve quando está cada vez mais pobre! E quando um credor percebe isto não só não empresta nem mais um chavo como exige de volta o que emprestou…
A troika, à boa escola do FMI, aplica a mesma receita para todos os casos, fazendo crer que a terapia não tem que ter a ver com a doença. Que lhe basta ser punitiva: o tratamento está na punição severa!
É como alguém estar com uma doença hepática, eventualmente até por alguns excessos alcoólicos e, em vez de se lhe retirar o álcool e tratar do fígado, lhe receitar exercício físico. Do mais violento e com umas cervejas para matar a sede!
Discute-se agora – tanto e nas mesmas bases (de conveniência política ou ideológica) como, há bem pouco, se discutia se a crise era interna ou externa – se as medidas poderiam ser outras. Se, afinal, isto poderia ser diferente. Claro que sim, que as medidas poderiam ser outras, as acertadas para a doença. Se o mal está na falta de crescimento, medidas que agravam o mal resolvem o quê?
Mas não podemos esperá-las de quem já se percebeu que não está preparado para as exigências do momento. E esse é, há muito, outro dos nossos grandes dramas!