Já tínhamos saudades disto
A Câmara Municipal de Lisboa, vá lá saber-se por que carga de água (responsabilidade de quem, ou a que propósito, para além de uma burocracia cega, surda - que não muda - e profundamente estúpida) partilhou com as autoridades russas os nomes, moradas e contactos de três manifestantes russos que participaram num protesto, em frente à embaixada russa em Lisboa, pela libertação de Alexey Navalny, o mais conhecido opositor de Putin.
A manifestação aconteceu em Janeiro passado, mas só ontem foi conhecida a notícia desse acto bufo, inaceitável e e incompreensível da Câmara da capital. Fernando Medina deu voltas e mais voltas e explicou que "o erro resultou de um funcionamento burocrático dos serviços que aplicaram nesta manifestação aquilo que aplicam à generalidade das dezenas de manifestações que acontecem no município". Quer dizer - não explicou nada.
Por isso ninguém percebeu. Excepto o ministro Augusto Santos Silva, mas esse, como se sabe, é senhor de uma inteligência rara, a que os comuns dos mortais nunca poderão aspirar. O ministro dos negócios estrangeiros dos governos de António Costa, dos Assuntos Parlamentares e da Defesa, dos de Sócrates, e da Educação e da Cultura dos de Guterres - um record absoluto - percebeu tudo: não se trata de "um incidente diplomático", apenas de "um procedimento errado que foi corrigido", facto com que só tem que se congratular.
E, congratulado e do alto da uma inteligência que nos verga a todos à nossa condição de mentecaptos, resolveu, de uma penada, um problema que em qualquer país do mundo livre e desenvolvido teria liquidado as hipóteses de reeleição de Fernando Medina. Simples - pediu à Rússia que cumprisse as leis internacionais e apagasse os registos que recebeu indevidamente.
A esta hora já certamente Putin lhe respondeu pelos canais diplomáticos que, sim senhor, pode estar descansado que já apagou tudo.
Há muito que não dava conta de um dos habituais tesourinhos deprimentes de Augusto Santos Silva. Era bom sinal, porque eles têm sempre uma relação directamente proporcional com o estado de sanidade do governo que integra. Mas acabou. As tiradas de Augusto Santos Silva estão para o inverno dos governos como o cuco está para a Primavera.