Maquiavélico*
Começo por dizer que os problemas da promiscuidade entre políticos e negócios não se resolvem com leis. Resolvem-se com a escolha de pessoas sérias!
Mas isso não significa que não seja preciso leis para tratar desses problemas. Quer apenas dizer que, com pessoas sérias, nem é preciso utilizá-las e, sem pessoas sérias, não são suficientes.
Vem isto a propósito de uma lei que saltou esta semana para a ribalta à boleia das famosas golas, da não menos famosa campanha do programa “aldeia segura”, por causa de uns negócios entre o filho do Secretário de Estado da Protecção Civil e o Estado, mesmo que posteriormente mais uns tantos casos tivessem vindo também a público. Que torna nulos, logo à cabeça, para início de conversa, todos os negócios entre familiares de titulares de cargos públicos e o Estado e obriga, depois, à exoneração do familiar titular do cargo.
O primeiro-ministro protegeu-se à sua maneira, como sempre sabe fazer, e correu a pedir parecer à Procuradoria-Geral da República sobre a aplicação da lei à circunstância do Secretário de Estado. Já o Ministro dos Negócios Estrangeiros, entretanto a substituí-lo por uns dias de férias, achou por bem antecipar-se e declarar absurda, para a mesma circunstância, a interpretação literal da lei.
Ora, a lei tem já quase 25 anos - e está até para ser substituída - e não temos memória de alguma vez ter sido utilizada. E não terá sido certamente por falta de oportunidades, o que menos terá faltado neste país nos últimos 25 anos é negócios desses. Mas, quando ao fim de 25 anos é evocada a sua aplicação, nada… No mundo calculista do primeiro-ministro é preciso um parecer. No de Augusto Santos Silva, com um calculismo mais trauliteiro, declara-se simplesmente absurda.
É isto. Portugal não é um país sem lei, porque leis tem muitas. Mas nunca para aplicar aos amigos. Já vem de Maquiavel: “aos amigos os favores, aos inimigos, a lei”!
* A minha crónica de hoje na Cister FM