O apuramento da selecção e outra(s) história(s)
A selecção nacional de futebol concluiu ontem a fase de apuramento para o Euro 2024 culminando, com a vitória (2-0, com golos de Bruno Fernandes e Ricardo Horta) em Alvalade sobre a Islândia, num inédito apuramento plenamente vitorioso. Dez jogos, dez vitórias. E com o maior número de golos marcados (37), e o menor de sofridos (2), de sempre!
E, se não sempre, na imensa maioria dos dez jogos, com exibições de alto nível. Poderá dizer-se que o grupo era acessível. Que não encontrou adversários de grande porte, mas também isso depende do patamar que a selecção portuguesa atingiu no panorama do futebol mundial. Durante décadas o apuramento para uma fase final de uma grande competição de futebol era inacessível. Depois passou a esporádico - 1966, 1984 (curiosamente com participações entusiasmantes), 1986 (desastrada) e 1996.
A partir daí só falhou o Mundial de 1998, em França. E, com maior ou menor dificuldade no apuramento, e maior (Euro 2000, 2004 e 2012 - 2016 foi o do inédito título, mas não foi especialmente brilhante - e Mundial de 2006), ou menor brilho (Mundial de 2002 e de 2014) nas fases finais, esteve sempre presente nos maiores palcos do futebol mundial.
Este período que lançou a selecção portuguesa para o grupo das selecções obrigatórias nas fases finais iniciou-se com Humberto Coelho, e a magnífica equipa de 2000. Por razões nunca esclarecidas, mas que se lêem bem nas entrelinhas daquilo que é o futebol em Portugal, foi substituído por António Oliveira, no fiasco de 2002. A partir daí sucederam-se reinados mais ou menos longos. Primeiro o longo reinado de Scolari, depois os mais curtos de Carlos Queiroz e Paulo Bento, até ao longo de Fernando Santos.
As gerações de grandes jogadores portugueses iam-se sucedendo, à volta de Cristiano Ronaldo - que tem hoje colegas na equipa que ainda não eram nascidos quando ele começou -, à medida, cada vez mais evidente, que se falhavam grandes selecções, daquelas que são sempre favoritas a ganhar o que disputem, e que deixam o perfume do bom futebol espalhado por onde quer que passem. Com Fernando Santos vieram os títulos - o Europeu de 2016, e a primeira das edições da Taça das Nações - mas nunca a afirmação de uma selecção ao nível da qualidade dos jogadores portugueses, sobejamente exibida nas equipas que integravam, nos maiores clubes do mundo.
Fernando Santos aprisionava o (crescente) talento dos jogadores e era ele próprio refém. Refém da forma como ganhou o Campeonato da Europa, em França. E ... de Cristiano Ronaldo. Incapaz de se libertar de um sem se libertar do outro.
Quando o tentou, quando forçou, acabou.
Chegou Roberto Martinez e logo se percebeu por que lado tinha partido a corda que, em desespero, Fernando Santos puxara. Deslocou-se de imediato a Riad e essa mensagem de vassalagem não augurava qualquer mudança.
A vantagem do treinador espanhol, para além da de rapidamente "se fazer português", foi não estar refém de França. Com isso conseguiu libertar os jogadores, formar um grupo, e fazer desta selecção uma equipa capaz de soltar o talento imenso dos jogadores que a compõem. E de, mesmo a jogar muitas vezes com dez, surgir na Alemanha, no início do próximo Verão, com a condição de candidata a campeã europeia.