O ciclo vicioso funciona. E não faz falta!
Temos visto que, no debate político eleitoral, praticamente toda a gente clama contra os baixos salários em Portugal. Nesse discurso há dois temas que são transversais, e praticamente aceites por todos: o salário mínimo está muito encostado ao salário médio; e os baixos salários fazem com que os mais qualificados abandonem o país e partam para destinos que valorizam as suas qualificações.
O primeiro dos dois temas, sendo consensual porque é factual, é apresentado com propósitos diferentes. Uns evocam-no para argumentar contra o aumento o salário mínimo, e alguns desses até contra a sua própria existência. Outros, para concluir que há um problema de retrocesso salarial no país, depois de dez anos desregulação laboral e de cortes salariais.
Sabe-se quem são uns e outros.
O segundo, igualmente consensual e factual, decorre apenas da conclusão a que chegam os outros, os segundos. Os uns, os primeiros, que se sabe quem são, só por cinismo o podem referir. Seja porque em tempos mandaram emigrar, seja porque, depois, congelaram carreiras e salários. Ou seja, ainda, porque fizeram da transferência geracional uma locomotiva para o downsizing salarial.
Dez anos depois não há trabalhadores disponíveis para trabalhar pelos baixos salários que são oferecidos, e não há trabalhadores qualificados porque se foram embora. Mas nem assim os salários sobem. Mesmo assim todos os anos caem na pobreza milhares de pessoas com trabalho.
Só o salário mínimo aumenta porque é imposto por lei. Os outros salários não podem subir - dizem - sem crescer a produtividade. E a produtividade não cresce sem trabalhadores qualificados. E não há trabalhadores qualificados porque os salários são baixos.
"O liberalismo funciona", como não se cansa de reclamar o Cotrim de Figueiredo. Pois .... mas cá só funciona à força da lei. E mesmo assim só às vezes. O que por cá funciona mesmo é o círculo vicioso!