O coiso*
Não é a primeira vez, nem será certamente a última, que os grandes acontecimentos da semana são abafados por um coiso qualquer. Disse bem, não me enganei: um coiso qualquer, que não uma coisa qualquer.
Numa semana em que não faltaram grandes temas – não é todas as semanas que há uma moção de censura ao governo, que o governo espanhol dá uso ao tal artigo 155, seja lá isso o que for, ou, por muito que pareça que é, que o nosso Cristiano Ronaldo é consagrado como o melhor do mundo – a notícia é um coiso.
Chamo-lhe coiso porque não encontro melhor palavra para me referir a um ser abominável que tem o poder de produzir coisas tão pérfidas como um conjunto de alarvidades desprezíveis para pretensamente sustentar uma abjecta decisão jurídica, verdadeiramente aberrante, que enoja o país e conspurca a Justiça portuguesa.
O coiso vive na Idade Média, mas administra a Justiça nas mais altas instâncias do edifício jurídico português do século XXI. A ponto de, da sua abjecta decisão, não haver possibilidade de recurso.
Mesmo que indignados, podemos compreender o caracter irreversível do aborto jurídico saído das entranhas do coiso. O que não podemos compreender é que ainda haja coisos destes. E o que não podemos aceitar é a impunidade da coisa.
Não podemos aceitar que o Conselho Superior da Magistratura tenha sido tão rápido a anunciar que nada tinha para fazer. Não aceitamos, e afinal tinha. Valeu a pena a onda de indignação que atravessou o país. Tanto que já está anunciada a abertura de um inquérito disciplinar ao coiso.
O país aguarda impacientemente pelas suas conclusões. O país e a nova geração de magistrados que está a substituir este e tantos outros coisos. E que já faz da Justiça portuguesa – e esta é também uma notícia da semana – a mais eficaz da Europa no processo cível e a quinta mais eficaz no processo penal.
* Da minha crónica de hoje na Cister FM