O regresso da velha senhora
Os verdadeiros efeitos económicos da pandemia vão agora começar a surgir, e ultrapassarão provavelmente as piores expectativas, muito por culpa do regresso de uma velha e sinistra senhora de que já nos tínhamos esquecido. Chama-se inflação. Simplesmente inflação!
Desde o início do século que tínhamos deixado de contar com ela, desde a implantação do euro como moeda única europeia. A contínua deslocação da indústria para fora da Europa, ainda mais que a pandemia, mas também a pandemia, escancararam as portas fechadas da inflação durante estas duas primeiras décadas do século.
Hoje faltam matérias primas e componentes em quase todas os sectores da actividade, e a pandemia apenas tem alguma coisa a ver com isso na medida em que durante mais de um ano amorteceu o desequilíbrio por redução da procura. Logo que a actividade económica começou a ser reposta, e a procura se encaminhou para a normalização, os preços começaram a subir. E isso, embora alguma coisa tenha a ver com a pandemia (a China, a fábrica do mundo, encerrou e tardou a repor os níveis de produção), tem muito mais a ver com a logística requerida por uma produção agora localizada a grande distância da Europa.
O caos instalado nos grandes portos europeus mostra-nos essa imagem. Em nome da eficiência da globalização os cargueiros foram sendo cada vez maiores (há 30 anos um grande cargueiro transportava 5 mil contentores, hoje transporta 25 mil), e os portos passaram a ter dificuldades em recebê-los, sucedendo-se os acidentes, de que é exemplo maior o do Ever Given, no canal do Suez, há pouco mais de seis meses. Mas também a falta de contentores, passando muitos bens e produtos a ser transportados soltos, tornando a sua descarga numa equação pouco menos que impossível. Uma e outra circunstâncias transformaram as descargas em processos longos, complexos e caros. E os portos em armazéns de produtos que deviam estar em pleno circuito económico, mas estão apenas a acumular custos.
Ficam só por isso mais caros. Mas mais ainda pelo desequilíbrio na oferta face à procura, desafiando a lei máxima da constituição dos preços.
Aí está portanto a inflação, mais que o terror das economias, o terror de muitos países e governos. E especialmente da Alemanha. E aí está, à vista, o fim dos juros baixos. Que têm sido o seguro de vida das famílias e dos Estados, em especial dos portugueses, e que se vêm juntar ao fim das moratórias.
Tudo se conjuga para mais uma tempestade perfeita. Valha-nos - não Santa Bárbara - São Banco Central Europeu. Que no próximo dia 16 reunirá para nos dizer se tem alguma mezinha verdadeiramente milagrosa. Sabendo nós que não há milagres!