Parede de fumo
Por Eduardo Louro
O PSD tinha ontem anunciado que o primeiro-ministro esclareceria hoje tudo e, mesmo que ainda antes do início do debate quinzenal já os jornais adiantassem que a explicação estava nas despesas de representação, a expectativa era, por isso, grande.
António José Seguro teria certamente percebido que este debate de hoje, nestas circunstâncias e nesta altura, a dois dias das eleições internas, mais que mais uma oportunidade, era uma oportunidade única caída do céu, depois dos debates televisivos com o seu opositor. Se bem que já todos saibamos do que Seguro (não) é capaz, esperava-se que a súbita capacidade de combate recentemente revelada desse agora em alguma coisa.
A Procuradoria Geral da República, provavelmente fazendo o que teria de fazer, fez o que se esperava que fizesse. Que chutasse para canto, como Passos Coelho bem sabia quando, depois de se ter refugiado na Assembleia da República, decidiu pedir-lhe a investigação.
Era este o cenário que dominava o debate quinzenal desta manhã, o último reduto que sobrou a Passos Coelho. Por escolha própria ou porque fosse a parede a que se foi encostando, mais que deixar-se encostar.
Encurralado, socorreu-se do último argumento a que agora podia lançar mão: a sua palavra de honra, que para uns pode valer muito e, para outros, nada. Antes, fazendo-a valer ainda menos, mais uma cambalhota: as despesas de representação eram ainda terreno muito movediço – como bem sabe quem dedica alguma atenção às coisas da Contabilidade e da Fiscalidade – e era preciso corrigir isso para pagamento de despesas, mesmo que ninguém lhe lembrasse que para se efectuarem despesas em serviço é preciso estar ao serviço, mesmo que a abrir portas. E que se está ao serviço de alguém de forma remunerada ou a título gratuito… E que, como ainda ontem dizia o António Lobo Xavier, poderia não se lembrar de quanto ganhara em cada um dos meses dos últimos vinte anos, mas lembrava-se perfeitamente quando trabalhara de graça…
No fim de contas, depois da estranha coisa de não se lembrar de coisa nenhuma, de, pela mão de um Secretário Geral fiel, diligente e disposto a meter os pés pelas mãos, buscar ilibação na Assembleia da República, e de procurar ganhar tempo e poeira na PGR, Passos Coelho pensa que, entre aplausos de dezenas de deputados "encarneirados", conseguiu criar a parede de fumo suficiente espesso para continuar em cena.
Esta cabia-lhe a ele, ninguém o podia substituir. Agora a máquina trata do resto!