Passo seguinte: negociação e semântica!
Por Eduardo Louro
O governo, e a opinião publicada que o sustenta, estão seriamente empenhados no falhanço do processo grego. Passos Coelho deu o mote, com a já famosa história para crianças, e a máquina não parou mais. E no entanto o interesse nacional aconselharia, se não um apoio entusiástico à causa grega, que isso seria pedir muito a um governo que tem a história – para crianças e adultos – que este tem, pelo menos que se mantivesse quedo e mudo. Na expectativa. Porque o país não tem nada a perder, ou melhor, o que tem a perder é imensamente menos do que o que tem a ganhar!
Mas, porque as eleições estão aí, o governo, e os poucos – estou em crer – que o apoiam, sobrepõem os seus interesses eleitorais particulares aos interesses do país, importa-lhes que a Europa bloqueie as pretensões do governo grego, obrigando-o a reconhecer a sua incapacidade e a capitular. Demitindo-se ou, e isso seria melhor ainda, traindo e negando as suas promessas e o seu eleitorado.
O que nesta altura ao governo de Passos e Portas mais importa é que não se confirme que há, e sempre houve, alternativas ao modelo que a Alemanha impôs, e que tão entusiasticamente abraçou. O que o governo não quer é pôr agora em causa a teoria da inevitabilidade em que fez assentar a sua governação. É justamente isso que sustenta a sua solidariedade com Merkel, que também tem na mesma TINA (there is no alternative) o seu ponto de não retorno.
E no entanto o bloqueamento a que ontem se chegou, quando o périplo grego chocou de frente com Berlim, não é mais que aparente. Nem é a derrota da Grécia, como o governo de Passos e a sua gente pretenderiam, nem é a apregoada saída épica do governo grego que, entre a espada e a parede, teria heroicamente preferido a espada.
Creio que está agora oficialmente aberto o espaço de negociação. Ninguém poderia admitir que a Alemanha reconhecesse humildemente que falhara, que tudo o que impusera estava errado, e que bastaria aparecerem uns tipos desempoeirados e desengravatados para desdizer tudo o que disse. Também me parece que ninguém acreditaria que uns tipos tão desempoeirados não tivessem expressões mais suaves na gaveta para ir gradualmente substituindo as mais radicais. Como hair cut, por exemplo!
Varoufakis, o ministro das finanças grego, já pelo menos por duas vezes recorreu, em jeito de desculpa, aos erros de tradução. É aí, não em erros de tradução mas na semântica, que as coisas se vão passar a jogar. Deixará de se falar em perdão da dívida, ou hair cut, para se falar, por exemplo, em empréstimos perpétuos. As reformas que, como se sabe, para os alemães – e para o governo português, sempre em sintonia – querem dizer cortes de salários e de despesa social, substituirão a austeridade. E quererão dizer, para o governo grego, ataque às oligarquias, aos grupos de interesses organizados, à corrupção e à evasão fiscal (onde, por exemplo, seria bonito ver o governo português disponibilizar-se para dar uma ajuda).
A Grécia é um pequeno país, mas é um país muito importante. Para a Europa e para o Mundo. Por isso o BCE fechou, com estrondo, de um lado e abriu do outro. E assim irá continuar a ser nos próximos dias, até que todo o pó assente, e a dignidade regresse á Grécia. E à Europa!