Proíba-se! *
Depois da Comissão Nacional de Eleições – a CNE – ter emitido uma recomendação desaconselhando a realização de jogos de futebol no dia das eleições autárquicas, corre por aí que o governo se prepara mesmo para proibir, por lei, os jogos de futebol em dia de eleições.
Como, pela tecnicidade da lei, ela tem que ser geral e abstrata, irá certamente encontrar uma abrangência que vá para além do futebol e que nem deixe escapar os sempre bem regados jogos entre solteiros e casados, que acontecem pelo país fora. Nem sei se museus, cinemas e teatros escapam…
O governo poderá até vir a recuar nesta intenção - acredito até que venha -, mas confesso que ela não me surpreende. Está-lhes na massa do sangue. A primeira coisa que vem à cabeça desta gente é legislar: faça-se uma lei. A segunda é proibir: proíba-se! É assim que, de há muito, as coisas se resolvem em Portugal.
Vemos que em boa parte dos países, na Europa, mas não só, se vota durante a semana, num normalíssimo e corrente dia de trabalho. Começamos a ver surgir o voto electrónico, que agiliza todo o processo, e facilita a vida a toda a gente. Mas nada disso se aplica a nós, aqui neste cantinho da Europa, que o Senhor Juncker já não enxerga.
Por cá tem de se votar ao domingo, e na agenda de cada um nada mais pode constar que a deslocação à assembleia de voto, de manhã, o regresso a casa para almoço com a família, e o aconchego do sofá para fazer contas à vida enquanto as urnas não fecham.
Enquanto se pensar assim, não se pensa que os cidadãos não vão votar porque a sociedade não está virada para promover a consciência cívica e os valores da cidadania. Porque a pobreza de ideias, o mau gosto, os dislates e os disparates das campanhas eleitorais conseguem destruir qualquer réstia de consciência cívica que possa ter resistido. Ou porque, cansados de falsas promessas, de abusos, de comportamentos à margem da ética, muitas vezes irresponsáveis, ou mesmo delituosos, muitos desistiram da democracia.
Ah… Já agora recomendaria que se pedisse ao resto da Europa para também não jogar à bola, nesse dia. É que a malta não vai à bola, mas também não sai de frente da televisão para ir votar.
* Da minha crónica de hoje na Cister FM