Quem deve governar? Vamos por partes...
Por Eduardo Louro
O líder da força política mais votada deve formar e chefiar o governo. Não está escrito em lado nenhum, mas também não precisa de estar. Quem ganha as eleições deve governar!
É senso comum, é evidência natural que entra pelos olhos dentro...
Pois, uma coisa é o senso comum. Outra, bem diferente, é o funcionamento da democracia e das suas instituições. É aí que começam os problemas, quando afinal a democracia é mais qualquer coisa que votar de quatro em quatro anos ... nos mesmos. Parece que ninguém contava com isso, que tudo se resumia a ganhar as eleições e prontos. Ganhar as eleições também não tem nada que saber - é ter mais votos e prontos!
A Constituição diz que o presidente da República indigita o primeiro ministro depois de ouvidos os partidos políticos e tendo em consideração os resultados eleitorais. Suponhamos que o presidente ouviu a PàF, naturalmente, dizer que ganhou as eleições e quer formar governo, coisa que também ele quer. E que são todos gente muito dialogante, capazes de no parlamento negociar tudo com todos. E ouviu, suponhamos também, PS, Bloco e PC - e já agora o PAN - dizerem que têm uma solução mairitária e estável de governo, e que não há diálogo possível com aquela gente da coligação, que conhecem de gingeira.
Depois de ouvidas as forças políticas, de ouvir isto, tendo em consideração os resultados eleitorais, o presidente só tem obviamente um caminho. Tudo o que faça fora desse caminho é inconstitucional. E consequentemente anti-democrático!
Ora bem, é a esse único caminho político, a essa única saída constitucional, a esse exercício democrático de solução exacta e única, que vemos toda a direita chamar nomes como golpe de estado, PRECização, aberração e uma infinidade de coisas afins...
Ou, como alguém escreveu num conhecido jornal digital de direita, imediatamente partilhado por uma entusiástica multidão nas redes sociais: "Colocar esse cenário configura uma deturpação de toda a prática política passada que nunca foi questionada em sete das dez eleições legislativas que tivemos nos últimos 30 anos". Como se alguma vez, alguma vez mesmo, e não só nos últimos 30 anos, ou nos que quiserem, tivesse existido em Portugal um cenário, não digo só como o actual, mas como o que nesta actualidade se poderá vir a configurar.
Toda a gente tem legitimidade para defender a sua dama. Não é legítimo é que subvertam os princípios democráticos, nem que pretendam impôr um entendimento da democracia à exclusiva medida dos seus próprios interesses.