Só a Coreia tem paciência para o futebol de Fernando Santos
Com últimos jogos dos grupos G e H encerrou-se a fase inicial deste Mundial do Catar, com a curiosidade de nenhuma das 32 equipas ter conseguido ganhar os três jogos.
Já só Portugal e o Brasil tinham essa possibilidade. Ambos perderam.
Surpreendentemente, o Brasil. Sem surpresa, Portugal!
Diria que, pelo que tem sido o desempenho da selecção portuguesa, foram mais surpreendentes as duas vitórias anteriores que a derrota de hoje.
Na realidade, o futebol da selecção de Fernando Santos - mais propriamente da Femacosa, Lda - não foi hoje diferente do que tem sido. As duas vitórias não esconderam nada, mas turvam a vista de toda a gente.
Os que jogaram hoje - houve seis alterações relativamente ao último jogo, com o Uruguai, mantendo-se apenas o guarda-redes Diogo Costa, os defesas Pepe e João Cancelo (mesmo mudando da direita para a esquerda), Rúben Neves, no meio campo, e o inevitável Ronaldo, na frente - não jogaram melhor nem pior que os outros. Tal e qual como os outros, jogaram muito menos do que aquilo de que são capazes.
Esse é, como se sabe, o problema de Fernando Santos. Não consegue pôr os jogadores, sejam eles quais forem à excepção do mesmo de sempre, a jogar o que sabem e podem. Um problema tanto maior quanto ele nunca tem a nada a ver com isso. Se ganham, mesmo não jogando nada, jogaram bem. Se perdem, os jogadores erraram. E há que corrigir esses erros.
Hoje as coisas voltaram a começar a correr bem. Logo aos 5 minutos, na primeira vez que a equipa chegou à área dos coreanos, marcou: passe longo de Pepe para a direita que encontrou Diogo Dalot, que cruzou para Ricardo Horta marcar, na pequena área.
Estava dado o mote para a estratégia de ataque da equipa: passes longos de Pepe. O meio campo não era preciso para nada que não fosse, ou para defender, ou para entreter o jogo e deixar passar o tempo.
Era isto que se pedia a Rúben Neves, João Mário, Vitinha e Matheus Nunes. A Ronaldo não se pede nada, já se sabe. E a Ricardo Horta que ajudasse Diogo Dalot a defender.
Claro que, assim, a Coreia do Sul não tinha por onde encontrar dificuldades. Bastava-lhe disputar e ganhar as bolas longas que lhe chegavam à defesa e, tanto quanto a sua paciência lhes permitisse, assistir às trocas de bola para trás e para o lado dos centro-campistas e defesas portugueses.
Quando essa paciência se esgotava disparavam para a frente, incomodando muito mais do que eram incomodados. Foi sempre assim, durante todo o jogo. Não houve diferença nenhuma da primeira para a segunda parte.
Mostraram que era assim logo depois de sofrerem o golo. E marcaram, de um canto (os cantos fazem o resto da história do jogo), poucos minutos depois. Valeu que o marcador estava fora de jogo. Não valeu.
Mas não demorou muito que valesse. Pouco passava do meio da primeira parte e, de novo de canto, a Coreia empatava mesmo. Desta vez nem nunca poderia haver fora de jogo, porque o jogador coreano foi servido por ... Ronaldo. Que abdicou de atacar a bola para desfazer o cruzamento, encolheu-se e virou-lhe as costas. E foi com as costas que assistiu o jogador coreano, um desconhecido central que responde pelo nome de Joung-Gwon Him.
Depois de empatar a equipa de Paulo Bento reforçou a paciência. Se até aí era paciência de coreano, a partir daí mais pareceu paciência de chinês. Tanta que durou bem mais de uma hora.
Já nos descontos, no segundo dos 6 minutos de compensação, lá entra outro canto na história. Só que, desta vez, os coreanos nem precisaram que o canto fosse a seu favor. Serviu-lhe na mesma que o canto fosse na sua baliza. E não, não é um hino ao contra-ataque. É simplesmente qualquer coisa de inimaginável numa equipa que dizem querer ser campeã do mundo: um jogador correu com a bola de uma área a outra sem ser sequer incomodado; quando chegou à área de Diogo Costa tinha chegado apenas um colega de equipa, já no meio de cinco ou seis portugueses. E mesmo assim conseguiu entregar-lhe a bola. E mesmo assim, Hee-Chan Hwang, que até é colega de equipa de Rúben Neves e Matheus Nunes, marcou!
E a Coreia ganhou o jogo, com os uruguaios incrédulos. Mas só porque não estavam a ver o jogo, estavam apenas focados em ganhar o seu jogo ao Gana. Se tivessem alguém a ver o jogo teriam sido avisados que seria prudente dilatar 2-0, a que chegaram na primeira meia hora do jogo.
Assim, acabaram de fora, com os mesmos pontos e a mesma diferença de golos dos coreanos, com quem tinham empatado na primeira jornada. Mas com menos golos marcados
O Brasil também perdeu. Também com um golo nos descontos. Épico, de resto. De Aboubakar, já esgotado. Que, já esgotado, poucos minutos antes, nas mesmíssimas circunstâncias em que os portugueses perderam o jogo, correu atrás do Bruno Guimarães, agarrou-o, e acabou com a fuga do brasileiro. Viu o amarelo. Esquecido não deveria estar, não tinha dado tempo para se esquecer. Mas nem assim resistiu a tirar a camisola na celebração do golo, acabando expulso, acarinhado pelo árbitro.
O golo épico do antigo jogador do Porto, que somou ao outro, espectacular que marcara no empate a 3 com a Sérvia, que no outro jogo decisivo perdia (2-3) com a Suíça, não serviu de nada aos Camarões. Ia, isso sim, quase servindo para roubar o primeiro lugar ao Brasil. Faltou apenas um golo à Suíça para passar para a frente do grupo.
Se calhar não o quis, como já fizera a Espanha. Talvez tenham preferido a selecção de Fernando Santos à de Paulo Bento. E se calhar têm razão!