Ao final do dia, ontem, depois do Presidente Marcelo ter metido mãos à massa, obrigando Luís Montenegro a obrigar o secretário de Estado, Hernâni Dias lá apresentou a demissão. A contragosto Montenegro lá teve que aceitar a primeira baixa no seu governo. Sem falar, sem dizer nada...
Não é membro do governo, não é ministro, nem secretário de Estado, é consultor do Governo para esta lei em concreto. E, também como Hernâni Dias, não vê nesta acumulação de funções qualquer conflito de interesses. Exactamente tal e qual Luís Montenegro não viu, não via e continua a não ver!
Uma publicação da PWC, onde há quatro décadas comecei a minha carreira profissional, conclui com alguma surpresa que, em 2018, a maioria das causas de despedimento nas lideranças das empresas teve razões éticas. Pela primeira vez foram despedidos mais CEO´s por falharem no comportamento ético do que por falharem objectivos e resultados ou por lutas de poder.
É um sinal dos tempos, e não tenho grandes dúvidas que esta é uma tendência que se irá manter. Tenho dúvidas é sobre a amplitude da ética...
Há poucos dias lia - já não me recordo onde - que o apoio de Peter Handke às atrocidades do nacionalismo sérvio no último grande conflito balcânico, não constituiu qualquer obstáculo para a Academia Sueca lhe entregar o Nobel da Literatura. Já tudo teria sido diferente se agora se soubesse que há trinta anos ele tinha passado a mão pelo rabo da secretária.
Ainda ontem foi notícia que o CEO da McDonald´s foi sumariamente despedido depois de ter sido conhecido o seu envolvimento com uma "colega de trabalho". Veio a correr confessar que foi um erro, o que não lhe valeu de nada. E que provavelmente "a colega" não terá apreciado muito...
No mundo ideal a ética deveria ser a principal fonte de regulação dos negócios, e não poderia de maneira nenhuma ficar-se pelo fait divers do rabo de saia. Mas isso é no mundo ideal. Aí também o despedido presidente da McDonald´s não teria confessado um erro mas enfatizado uma opção. E talvez nem as acções da companhia tivessem caído...
Quando há mais de 20 anos ouvimos falar da ovelha Dolly, e soubemos do primeiro mamífero clonado a partir de uma célula adulta, percebemos que, mais cedo ou mais tarde, viriam aí problemas.
Aquela ovelha simpática, entretanto já desaparecida, nascida e criada na Escócia abria uma porta que todos sabíamos onde acabaria por dar. Não sabemos quantos entretanto tenham tentado passar por essa porta, porque muitos certamente que o fizeram em silêncio. Sabemos agora que um cientista chinês, formado em universidades americanas e entretanto regressado à China, garante ter conseguido fazer nascer os primeiros bebés, dois gémeos, geneticamente manipulados em laboratório. E afirma estar já em curso uma terceira gravidez a partir de embriões alterados laboratorialmente.
A notícia surgiu no início da semana mas, estranhamente, não teve especial repercussão mediática. Mas sabe-se como é a agenda mediática nos dias que correm…
A ocorrência não está confirmada – nem negada – por qualquer entidade independente, e o resultado do estudo não foi publicado em qualquer revista científica. Mas isso não tem se não a ver com as reservas éticas da comunidade científica internacional. Isso não é mais que a mola de resistência que a comunidade científica aplicou à tal porta.
A modificação de genes de embriões humanos é proibida em muitas partes do mundo. Mas, nem isso garante nada, nem o é em muitas outras. Como na China… A ética tem fronteiras que nunca deveriam ser passadas e portas que nunca se deveriam abrir. Mas há sempre fronteiras fechadas à ética e de portas abertas a todos os horrores de que possam de alguma forma aproveitar.
Abriu-se na China – dá vontade de perguntar: onde mais poderia ter sido? - a porta que não se podia abrir, mas que há 20 anos se sabia poder vir a ser aberta. O que aí vem não cabe sequer na imensidão do cinismo do cientista chinês quando, no fim, afirma que, agora, cabe à sociedade “decidir o que fazer de seguida”.
Um cientista chinês - o nome é o que menos interessa - afirmou ter criado os primeiros bebés geneticamente manipulados. E como quem acaba de criar um monstro, rematou: "A sociedade decidirá o que fazer a seguir"!
Na prática, disse: "já está, agora façam disto o que entenderem"!
Rui Rio, metido em mais um beco sem saída, desta vez no beco do Silvano, diz que a sua palavra não é como o iogurte.
Pode não ser, a validade o iogurte é mesmo muito curta. O problema de Rui Rio pode não ser de validade, mas de prescrição. O Rui Rio que enfrentou o PS do Porto, e que se impôs ao poder do FCP e de Pinto da Costa, prescreveu ao fim de uma década...
Entretanto foram conhecidos novos desenvolvimentos nas aldrabices das viagens dos deputados insulares. E não melhoram em nada a imagem que deles vamos infelizmente tendo. E digo infelizmente porque é péssimo para a democracia que os eleitores não consigam ter os eleitos em boa conta. Não há nada pior, quando sabemos, como Churchil teorizou, que "a democracia é o pior dos regimes à excepção de todos os outros".
Ferro Rodrigues, o presidente da Assembleia da República, em vez de pedir explicações aos deputados, como eventuamente seria sua obrigação, quis passar uma esponja sobre o assunto, garantido que os deputados "não cometeram nenhuma ilegalidade, tendo beneficiado dos abonos e subsídios que sempre existiram, sem polémicas ou julgamentos de caráter". A esponja pode ter passado, mas não apagou nada; antes pelo contrário, a tecla da ilegalidade é simpelsmente mais do mesmo, e de ética, que é o que está em causa, nada. Não limpou, sujou ainda mais, acentuou a nódoa, porque ninguém vai deixar de perceber que quis ser juiz em causa própria, que se apressou a sair a terreiro porque a figura maior dos aldrabões é Presidente e o líder parlamentar do seu partido. O único, de resto, que tem a lata de dizer que a sua posição é eticamente inatacável...
E o deputado exemplo, o herói que na segunda-feira rasgou as vestes, anunciando de imediato a sua decisão de abandonar o Parlamento, considerando-se indigno de lá continuar, afinal já estava de saída. Limitou-se a fazer um número de circo, antecipando por uns dias uma saída que há muito estava definida em função das novas responsabilidades partidárias que assumira. Paulino Ascensão vai assumir a liderança do Bloco na Madeira, circunstância que implicaria o abandono do hemiciclo.
Pois... eles são mesmo todos iguais. Mesmo quando não são todos iguais, na aldrabice nunca são assim tão diferentes!
No sábado o "Expresso" deu a notícia, e fez dela primeira página: " Deputados das ilhas reembolsados por viagens que não pagam"!
O que o semanário concluiu, e noticia, é que os deputados com residência nos arquipélagos da Madeira e dos Açores, que a pretexto da insularidade recebem todos os meses no seu salário 500 euros destinados a pagar-lhes a viagem semanal de avião, apresentam, depois, o respectivo bilhete para receberem, também, o subsídio que o Estado paga a todos os cidadãos insulares pelo chamado custo da insularidade (cada cidadão insular, nas viagens ao continente, paga apenas 80 euros, sendo reembolsado da diferença, até ao máximo de 400 euros).
Como conclui o "Expresso, os deputados insulares vão cobrar do Estado aquilo que não pagaram. Estes deputados não podem sequer alegar que não deram por nada, que recebiam inadvertidamente em duplicado, pelas simples razão que eram eles próprios que tomavam a iniciativa de ir, de bilhete na mão, reclamar o segundo pagamento, Não têm como fugir à classificação de aldrabões.
São sete os deputados aldrabões, um do Bloco, um do PSD e cinco do PS. Entre eles Carlos César, como quase não podia deixar de ser. Que, para além de aldrabões, são ainda "chicos espertos", como também quase não podia deixar de ser. O que é que alegaram?
Exactamente, caro leitor, adivinhou: "Não é ilegal"! Não há lei nenhuma que os impeça de fazer isso!
Nem todos, tem de dizer-se. O deputado do Bloco de Esquerda, Paulino Ascensão, de quem nunca sequer tinha ouvido falar, certamente por desatenção minha, não se armou em "chico esperto", não se escondeu atrás de coisa nehuma, nem assobiou para o lado. Assumiu o erro e a culpa e decidiu renunciar ao mandato de deputado e devolver o dinheiro que recebeu indevidamente.
Eles podem até ser todos iguais. Mas há sempre uns mais iguais que outros!
Temos cada vez mais diifculdade em perceber o que é a ética. Pelo menos na política.
Repare-se: Rui Rio apresentou-se como o paladino da ética, o homem que devolvia a seriedade à política, acima de qualquer suspeita. Mas começou a construir a sua liderança, logo nas eleições internas, em cima do caciquismo de Salvador Malheiro, premiando-o depois com a elevação ao topo da hierarquia partidária, de quem fez "o seu" Marco António Costa. E agora desvaloriza a fraudulenta viciação do cúrriculo do seu Secretário Geral - não há volta a dar, no PSD é muito difícil resistir à tentação de "armar ao pingarelho" académico - que o próprio Marques Mendes entende (como a Ordem dos Advogados já fizera público) dever ser objecto de intervenção do Ministério Público. O que para o político comentador, tal como para a Universidade usada, que denunciou o abuso, tem gravidade criminal, para o supra sumo da ética, não passa de um simples "aspecto do currículo de Barreiras Duarte que estava a mais". Sem importância nenhuma. Já está corrigido, e não se fala mais nisso.
Já não sei se é Rui Rio que não tem muita sorte com as escolhas que faz, ou se é mesmo assim. Mais do mesmo, e cada vez pior!
Percebeu-se o esforço de tentar fazer sair do Congresso do PSD a ideia de unidade do partido. Do partido como um todo e do partido à volta do novo líder.
Santana Lopes foi o pivot desse processo. Quase que apareceu no Congresso como se tivesse sido ele a ganhar as directas. Baralhou, partiu e deu. E, claro, ficou com as melhores cartas... Nesse aspecto foi um congresso "à antiga", e sabe-se como Santana Lopes gosta disso.
Mas não resultou. NInguém ficou com a ideia que o PSD tenha saído deste congresso unido e com uma liderança forte e duradoura. Antes pelo contrário. Ficou a ideia de um saco de gatos assanhados onde tudo vai valer. Luís Montenegro puxou logo ali da faca, e não a vai voltar a pousar na baínha. E Rui Rio, com a meteórica ascensão de Elina Fraga (confessem lá: quem é que sabia que a senhora era do PSD? Não pensavam todos que era do partido do Marinho Pinto, se é que ainda existe?) não cedeu ao populismo, como diz Marques Mendes, cedeu à vingança. Foi uma facada nas costas do Passismo!
Mas, se o Congresso não conseguiu sequer deixar a ideia de um partido pacificado (quanto mais unido), também a ideia de um partido regenerado por uma liderança asséptica morre na fotografia do novo líder ladeado, à direita, pela imagem do populismo justiceiro e, à esquerda, pela do oportunismo promíscuo. Com Elina Fraga de um lado e José Luís Arnaut do outro, a ética de Rui Rio não cabe na fotografia!
Consta que o secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, recebe 360 euros líquidos por ter declarado residir em Tavira. Mas que na realidade mora em Cascais, e que esse subsídio lhe dá para pagar a casa do Algarve, essa sim em Tavira.
Não há volta a dar. Nem a geringonça é capaz de acabar com estas coisas...
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