Os Estados Unidos acabam de anunciar uma operação antiterrorista “bem-sucedida” durante o fim de semana no Afeganistão, na qual abateram o líder da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, que sucedera a Bin Laden que, há 11 anos, então no Paquistão, tivera o mesmo destino. Na altura, com Obama na Casa Branca, era Biden era vice-presidente. Na altura, os americanos estavam no Afeganistão. Agora, menos de uma ano depois da debandada americana, está lá a Al-Qaeda ...
Agora é esperar uns dias para saber quem sucederá a al-Zawahiri. E se calhar mais 11 anos para o eliminar ... Porque a Al-Qaeda, como a hidra da mitologia grega, tem muitas cabeças. De serpente, também!
Não tem sido a melhor a gestão que os Estados Unidos têm feito do affaire Bin Laden. Começou pela histeria nacional que mostrou ao mundo e acentuou-se no discurso de Obama : um discurso de Bush onde ninguém revê Obama, apenas comparável ao de uma figurinha que por aí apareceu, apresentando-se como presidente do Peru, e que viu ali o primeiro milagre do novo beato João Paulo II.
Comunicar a conquista – à falta de palavra mais adequada ao actual momento, chamo-lhe assim - de Bin Laden com um discurso que não se cansa de evocar Deus traz-nos à consciência aquilo que tendemos a esquecer e que é, se não um profundo choque de civilizações, pelo menos a distância cultural, mental e mesmo de valores que nos separa da chamada América profunda. Ao contrário do americano comum temos dificuldade em entender a festa a partir da morte, sentimos um imperativo de consciência que nos obriga a curvar perante a morte, mesmo que seja a do mais odiado dos terroristas, e estamos felizmente convencidos que a justiça não se faz sumariamente e a sangue frio.
Sabíamos que Bush corporizava aquela mentalidade e aqueles valores do americano fechado sobre si mesmo. Mas vibráramos com a eleição de Obama porque se lhe opunha nessa dimensão reaccionária e obscurantista. E agora surge-nos um Obama igual a Bush, retrógrado e insensato: levar esta acção para a dimensão religiosa é transportá-la para o terreno do inimigo e praticamente legitimar o fundamentalismo religioso, que precisamente alimenta o terrorismo.
Poderá perdoar-se ao presidente do Peru, mas nunca se poderá perdoar ao presidente dos Estados Unidos. Sem se perdoar, condescendeu-se com Bush: Mas a Obama não se pode perdoar, condescender ou sequer compreender que tenha pretendido assegurar a reeleição a partir desta oportunidade!
Mas depois vem ainda a estória: uma estória começa a não ter pés nem cabeça. A que sucessivamente se vão acrescentando capítulos ora inacreditáveis ora delirantes: testes ADN, uma irmã que morreu em Boston há não sei quantos anos, fotografias que são e deixam de ser para mostrar, ora fotografias eventualmente chocantes de alguém com um tiro na cabeça, ora fotografias das exéquias fúnebres. Exéquias fúnebres: lançado ao mar - como consta do guião - com honras militares e reportagem fotográfica… O próprio Bin Laden, quando foi abatido, ora estava de arma em punho ora desarmado!
Quando, à boa maneira americana, a presa é, invariavelmente e sem grandes preocupações, apresentada como troféu - como ainda há bem pouco tempo se viu com Sadam Hussein - não se percebe toda esta descrição quando se trata do declarado inimigo número um da América, do patrão da maior multinacional de terrorismo e pai do franchising do terrorismo.
A revolução iniciada na Tunísia alastrou ao Egipto? É o que se diz!
Até pode ser que seja assim, que tenha alastrado… mas, não é a mesma coisa. Nem mais ou menos!
O Egipto não é o Magreb. Em comum pouco mais têm que o facto de serem governados pelos nossos filhos da puta (a expressão não é minha; é de Kissinger quando, referindo-se a Pinochet, dizia: é um filho da puta, mas é dos nossos)!
O papel do Egipto nos equilíbrios da mais instável região do mundo dos últimos 50 anos é único e decisivo. Como único e decisivo é o papel do Egipto no futuro do radicalismo Islão. No seu incontrolável avanço ou na sua contenção…
O Egipto é o único aliado árabe de Israel e um forte parceiro nos acordos de paz. O Egipto é dos maiores países árabes e a biblioteca do mundo árabe, o seu maior centro cultural. E o principal berço da Al Qaeda…
Joga-se neste momento no Egipto mais que o seu futuro. Mais do que o futuro do Médio Oriente: o futuro do mundo e de uma certa forma de olhar para ele a que chamamos civilização!
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