No inverno chove. Às vezes chove muito. Quando chove muito, há cheias em Lisboa. Às vezes morre muita gente, tanta que nem nunca se chega a saber quanta. Às vezes dá jeito que não se saiba. Em 1967 foi assim.
Esta noite choveu muito em todo o lado. E choveu muito em Lisboa. Houve cheias e morreu uma pessoa. Sabe-se que morreu uma pessoa.
Os túneis de escoamento que Lisboa aguarda há décadas que sejam construídos no subsolo, podem esperar. Têm podido esperar. Afinal as alterações climáticas só dão seca e Lisboa é só para estrangeiros. E, ao contrário das gravuras, sabem nadar. Yo!
António Costa bem quis convencer o pessoal que não houve cheias nenhumas, ou que o que aconteceu não teve a menor importância. Sobrara apenas um pequeno dano colateral, quando o ministro do Ambiente meteu os pés pelas mãos, e até aconselhou as vítimas a mudarem-se para outro lado, mas nada de grave.
O problema, mais uma vez, foi o Presidente. Marcelo hoje meteu-se a caminho, foi até lá e, literalmente, agitou as águas. As cheias do Baixo Mondego são afinal um problema. E nacional. E elogiou "a resistência" das populações com que o ministro (que ouviu das boas) tinha brincado. Ou, no mínimo, tratado com pouco respeito.
As inundações deste fim de semana no Algarve determinaram o primeiro acto público do novo governo em trânsito, que revelou ao país um dos seus novos ministros.
Não se pode bem dizer que era de todo um desconhecido. Logo que foi anunciado ficamos a saber que era o ministro que simplesmente não poderia ser ministro. Era já uma questão fé, de crença no Espírito Santo. Na primeira oportunidade, na primeira aparição pública, o ministro tratou de esclarecer que aquele pormenor, que alguns pretenderam transformar em impedimento, não é mesmo nada mais que apenas um lado do triângulo da sua fé de homem da Católica.
Quando o novo ministro da Administração Interna atribuiu as inundações à “fúria demoníaca da natureza” percebemos o holismo da sua crença e a dimensão da sua fé. Quando João Calvão da Silva acrescentou que " a fúria da natureza não foi nossa amiga", que "Deus nem sempre é amigo, também acha que de vez em quando nos dá uns períodos de provação" percebemos-lhe a veia pregadora. Mas quando o ouvimos dizer que "em Albufeira a força da natureza na fúria demoníaca, embora os ingleses digam que é um ato de Deus, um act of God, nós temos que traduzir de outra maneira”; ou, sobre a morte que há lamentar, que "era um homem que já tinha vindo do estrangeiro, tinha 80 anos, fica a sua mulher, Fátima, ele que era um homem de apelido Viana. Ele entregou-se a Deus, e Deus certamente que lhe reserva um lugar adequado. A família também está determinada em continuar..." ficamos inundados de dúvidas sobre muitas coisas muito sérias. E com uma única certeza: com todo o seu campo político esgotado, a Passos Coelho tudo serviu para ministro!
Deus nos valha...
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