A Polícia Judiciária impediu um atentado terrorista na Faculdade de Ciências, em Lisboa. Ou um ataque em massa a estudantes, professores e funcionários da Faculdade. Ou - mais parece - uma experiência criminosa, mesmo carregada de terror, a um rapaz tresloucado.
Na verdade a PJ, alertada pelo BBI, deteve um rapaz de 18 anos, pouco sociabilizado e fascinado pelos frequentes ataques a escolas nos Estados Unidos, que teria a acção aprontada para amanhã. Sabemos que todos os dias, se calhar não tantos por cá, mas seguramente pelo mundo fora, são evitados dezenas ou centenas de actos terroristas. Sabemo-lo porque isso é noticiado. Exactamente assim, como a notícia de uma estatística.
Provavelmente a própria Polícia Judiciária forneceu a notícia nessa perspectiva. Mais em cima do acontecimento, é certo. Mas isso até poderá dever-se à menor frequência de notícias deste tipo que tem para dar. Como são poucas, deteve o rapaz de manhã e revelou-o ao fim da tarde.
E, claro, foi um filão para as televisões, todas "CMTVizadas". Umas mais que outras, mas todas na mesma onda.
A CNN Portugal surgiu ainda não há três meses, prometendo revolucionar o panorama da televisão, e reclamando um estatuto único - ninguém nunca fizera nada igual e era verdade a acabar de chegar pela primeira vez a Portugal. Afinal ... limita-se a copiar a CMTV. E como copiar é fácil, é hoje uma cópia tão fiel que chega a ser difícil distinguir o original.
Ao final da tarde deu a noticia. Em primeira mão, como por toda a noite e a todos os minutos reivindicou. Nessa primeira notícia dava conta de um ataque terrorista - claro - que estava planeado para amanhã no Instituto Superior Técnico, e abriu logo ali o filão, começando a surgir comentadores de todo o lado com as banalidades do costume. Dez ou quinze minutos depois, o primeiro directo. Lá está, o directo - a alfa e o ómega desta forma de fazer televisão.
Dois directos, logo a abrir, e anunciar novos dados. O novo dado era, então, e de fonte que não poderiam naturalmente revelar, que o atentado teria lugar no ... Instituto Superior Técnico. Que a repórter começaria por identificar por Instituto Técnico Superior. O segundo repórter não acrescentava nada, limitou-se a babar-se com a grande revelação da colega a revelar o que o pivot em estúdio, agora também ele próprio a babar-se com a nova revelação, tinha revelado na notícia inicial. Cinco minutos depois, talvez nem tanto, o Instituto Superior Técnico passou a Faculdade de Ciências, como se nunca tivessem existido nem fontes nem Instituto Superior Técnico. Ou mesmo Instituto Técnico Superior. Em fundo passavam imagens do FBI, e muitas bandeiras americanas...
Este foi apenas o início do festival da CNN/CMTV. Repórteres por todo o lado em directos durante toda a noite ... sempre a dizer exactamente a mesma coisa. Especialistas de tudo a perorar sobre tudo. E comentadores tudólogos a debitar generalidades. Horas e horas a fio, durante toda a noite. E certamente a repetir amanhã durante todo o dia. Em breaking news, obviamente.
Primeiro foi o segredo bem anunciado e melhor guardado a levar expectativas céu acima. Depois a festa, a passadeira vermelha, por onde desfilou o poder mais alto de um país que também assim se vai fazendo pequenino. Presidente da República, primeiro-ministro, ministros... estavam lá todos. Era finalmente a verdade da notícia a chegar, tudo o que para trás ficara não passava de mentira. Era a revolução da verdade que viria mudar para sempre o panorama informativo deste país. Pequenino!
Finalmente o pano subiu. E o país pequenino abriu a boca de espanto. As caras eram velhas. Velhas conhecidas, bem entendido. De algumas já nem nos lembrávamos bem, vinham bem lá do fundo do baú.. Outras tínhamo-las visto há dez minutos, uma hora, dois ou três dias... O ritmo era o mesmo, como se não tivéssemos passado pelo countdown. Os mesmos formatos, com os mesmos participantes...
As notícias.... ah ... as notícias... Essas, ou há ou não há. Havia?
Não, não havia. Mas havia João Rendeiro para estender noite fora, esticando o espectáculo da notícia. Que afinal só precisa de ser espectáculo, isso da revolução e da verdade fica para os separadores promocionais. Tudo como a TVI já fazia sem ter de pagar royalties... Mas é a CNN Portugal. De Portugal dos pequeninos.
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