De um congresso dos principais partidos do nosso xadrez político espera-se sempre qualquer coisa. Espera-se sempre um coelho qualquer a saltar de uma cartola qualquer, alguma loiça partida e mesmo muita roupa a lavar.
Esperava-se... Já não se espera nada disso. E muito menos quando o partido em congresso está no poder: aí só dá mesmo para endeusar o líder. Até pelos mais críticos: "a solução é má, mas o primeiro-ministro é bom" - disse Francisco Assis. E está tudo dito!
Ana Gomes ainda se esforçou por dizer mais alguma coisa, mas nem ela conseguiu ir muito além da terminação. Ficou-se pelos mínimos em defesa da marca. Da sua!
Na verdade, no congresso do PS não se passou nada. Nem horas extraordinárias, que nunca foram necessárias!
Daniel Adrião quis abanar o congresso do PS com uma proposta revolucionária para o xadrez partidário do regime. A moção que levou ao congresso era sedutora, desde logo pela própria designação: "Resgatar a democracia", num quadro de crise da democracia representativa, soava bem. Mas passou ao lado do congresso. Dela nada se ouviu. Desta moção tão prometedora, e da lista que lhe dava expressão - que acabou com 18 lugares na Comissão Política Nacional - para a História deste 21ª congresso do PS não ficará mais que a extemporânea e descabida tentativa de redenção de José Sócrates que, na intervenção de uma das integrantes da lista - Cristina Martins, se não estou em erro - roçou mesmo o patético.
Os partidos são mesmo assim. Ou isto mesmo, como se diz no futebol!
PS: Pior só mesmo as televisões. E pior ainda só mesmo a SIC, cujo repórter, enquanto na tribuna o Daniel discursava, garantia com toda a convicção: «De Daniel Adrião, o homem que apresentou uma moção contra António Costa e até concorreu a secretário-geral contra António Costa nas eleições directas, ainda não há sinal, ainda não o vimos por aqui no congresso do PS esta manhã.»
De surpresa, apareceu Guterres, e disse que tinha saudades. Martin Schultz, que estava por cá, também apareceu e disse que é contra as sanções da Europa. António Costa já tinha explicado ao Congresso a legitimidade da sua opção pela geringonça, relendo até passagens do seu discurso no anterior congresso, vai para dois anos.
E veio gente de fora: Pacheco Pereira pôs o dedo na ferida, para dizer que, com o Tratado Orçamental, não há lugar para a social democracia na Europa. Mantê-lo é deixá-la entregue ao neo-liberalismo. E Ana Drago disse o que os socilaistas porventura não poderão dizer, mas que toda a gente percebe que é assim: se o PS não tivesse tomado o rumo que tomou, escolhendo a saída à esquerda, estaria agora em vias de ser riscado do mapa.
Há gente no PS que não percebe isso. É até bem provável que, mais que não perceber isso, não perceba onde está o seu lugar... Muitos multiplicaram-se em entrevistas aos jornais nos últimos dias. Uns até disseram que havia medo. Tanto que nem lá puseram os pés. Francisco Assis não tem medo - tem aspirações, não pode ter medo - e subiu à tribuna para dizer que ... está sozinho. Não está. Com ele estão os que lá não estão, cheios de medo. E está o Sérgio Sousa Pinto. Que não tem medo... nem outra coisa. Por isso se ficou pelos corredores, a dizer que quer o partido de Mário Soares.
Ora aí está o que a oposição a António Costa tem para dizer: que quer o partido de Mário Soares. Como um menino no meio de uma grande birra quer um brinquedo...
À falta de PODEMOS – fenómeno impossível em Portugal, com uma sociedade civil amorfa e em estado de anestesia permanente, como sempre se desconfiou e como desde Setembro de 2012 toda a gente ficou a saber – e com o Bloco, por implosão, e o PC, por História e por crença, definitivamente encostados à parede da não solução, arrumados no cantinho do protesto, abre-se ao Livre, de Rui Tavares, uma janela de oportunidade única. Em boa verdade essas condições não lhe abriram a janela toda, deixaram-na apenas entreaberta para que António Costa pudesse meter a mão para lha deixar escancarada.
Parece-me que pouca gente está a perceber isto, e que são ainda menos os que estão a perceber a dimensão dessa janela que se está a abrir. Devo no entanto reconhecer que não está a ser ignorado por boa parte da direita. Nota-se isso na onda de solidariedade que os sectores bem pensantes da direita estenderam a Francisco Assis. E nas anunciadas perspectivas de volte face das sondagens, na própria presunção hoje revelada por Rui Rio que, com a prisão de Sócrates e com a chamada viragem à esquerda de António Costa no Congresso, o PS deixa de estar em condições de ganhar as eleições. Diz Rui Rio que, se há umas semanas se poderia falar de maioria absoluta para o PS, hoje se fala na vitória do PSD.
Esta é a perspectiva que convém à direita, a ideia que no fundo nada mudou, que tudo continua na mesma, que alternativa e alternância são a mesma coisa. Que as eleições se irão continuar a decidir ao centro, nessa enorme franja eleitoral que ora vota PS ora PSD. E que o balanceamento de Costa para a esquerda empurra essa franja do PS directamente para os braços do PSD.
Ora, isso era assim no passado. Antes de Passos Coelho ter dizimado a classe média. As classes médias portuguesas poderão não ser de sair à rua, como os espanhóis ou os brasileiros, mas não são estúpidas. Nem masoquistas. Têm memória curta, bem sabemos, mas o que, desta vez, a direita lhes fez é muito difícil de esquecer.
António Costa também sabe que é assim. Que não há eleitorado seu que fuja para a direita por ele se encostar à esquerda. Tão bem como sabe que, nessa mesma franja, há eleitorado que ainda não perdoou todo o passado ao PS, que o co-responsabiliza pela situação do país, e que espera por qualquer coisa nova. Que, à falta de melhor, poderia até ser o partido de Marinho e Pinto…
Com o Bloco e o PC fora de combate – porque os portugueses sabem que têm de encontrar uma solução governativa – o Livre é o coelho que António Costa tira da cartola. Ninguém sabe quanto é que o partido do Rui Tavares vale. Vale pouco certamente, mas poderá vir a valer muito…
O que se sabe é que o Livre, a fazer lembrar o apelo de Cunhal aos comunistas em 1986 – “votem no homem” (Mário Soares) “com a mão direita e tapem-lhe a fotografia com a mão esquerda” –, vai ser o voto no PS dos que nunca votariam na mãozinha. Mas que votariam Bloco, ou Marinho e Pinto, ou branco… Ou que nem votariam!
António Costa escancarou esta a janela de oportunidade a Rui Tavares. Espera que a partir de agora as mulheres e os homens do Livre façam o resto. E que por lá entre uma gigantesca lufada de ar fresco…
Que não dê em pneumonias... Para isso já basta Sócrates!
António Costa tem todo o direito de pedir maioria basoluta. É legítimo, e até oportuno, que o faça ao encerrar o congresso. Mas... sustentado em méritos próprios... Através de chantagem ou de ameaça é que não!
Não é democraticamente aceitável que António Costa peça ao eleitorado uma maioria absoluta argumentando que, se assim não for, o país perderá um ou dois meses a negociar uma coligação, prolongando a agonia da governação deste governo. Isso não argumento, é ameaça!
O presidente apelou ao consenso, mas parece que pouco mais faz que quebrá-lo. Ou que avisar… Bem avisar!
O governo quer estender para fora o consenso que não existe lá dentro. Nos conselhos de ministros parece que já pouco falta para andar tudo à batatada… Até Vítor Gaspar apela ao consenso, e chama-lhe agora consenso esclarecido, quando o único consenso é correr com ele. Se forem capazes…
Consenso, consenso é no PS. O congresso deste fim-de-semana foi mesmo para mostrar ao Presidente e ao Governo que consenso é com eles. António José Seguro é ele próprio o consenso, eleito com mais de 96% dos votos. Na nova Comissão Política não podia haver mais consenso…
É até consensual que Seguro aplaudiu o discurso de Cavaco. Não aplaudiu de pé, é certo. Foi apenas sentado, o que - é consensual - faz toda a diferença. E não põe em causa o consenso no PS contra o discurso de facção do presidente…
António Costa esperava por uma vaga de fundo, uma onda que o levasse, na sua crista, ao ponto mais alto do poleiro socialista. Ouviu falar na onda da Nazaré, que levaria o nome desta minha praia - será sempre a minha praia, mesmo que aquela não seja a minha onda - ao topo do mundo, e pensou que… era aquela. Que aquela onda gigante não tinha aparecido na Nazaré para Garret McNamara surfar e voltar a bater o seu recorde mundial, mas apenas para o levar ao destino que há muito o destino lhe traçara.
Foi já tarde, bem tarde, que percebeu o que se estava a passar. Aquela era uma onda demasiado grande e, como o pobre faz da esmola quando é grande, desconfiou. E não a pegou, deixou que morresse na praia... perante desespero dos socratistas.
Aquela era a sua – deles - onda, onde tudo tinham apostado, convencidos da já crónica fraca memória dos portugueses. E convencidos também que, com o sol da ambição a bater-lhe nos olhos, Costa não perceberia que aquele seria um sol de pouca dura!
Uma sucessão de erros de cálculo que acabou num triste espectáculo. Mas clarificador!
Sócrates, lá por Paris, deve ter ficado a perceber que, para apanhar a onda, terá que ser ele a trepá-la. Não tem cá tropas que lhe façam isso.
António Costa deve ter percebido que não lhe chega ter boa imprensa. Precisa de tropas - que não tem – porque com as tropas dos outros não chega lá. Saiu pela porta pequena, e com sérios riscos de até Lisboa perder.
Seguro, que não tem autoridade nenhuma para acusar quem quer que seja de falta de lealdade – porque disso pode toda a gente acusá-lo, conspirou na sombra durante todo o consolado de Sócrates mas sempre sem coragem para dar a cara, sempre escondido por trás dos arbustos -, provavelmente com mais facilidade do que alguma vez imaginara, ganhou novo fôlego. Que, já se percebeu, não lhe servirá para muito…
Quem se fica a rir é Passos Coelho, que sabe que pode dormir descansado. Assim a consciência lho permita…
Tanta agitação no Rato para nada. Só se não diz que a montanha pariu um rato para fugir ao trocadilho.
É inacreditável, mas parece que é assim: António Costa renunciou à candidatura, e reina a paz em todo o território socialista!
O PS deu mais um triste espectáculo ao país. Se já era difícil tê-los em boa conta, a partir de agora é simplesmente impossível. E, não servindo para alternativa, o PS não serve para coisa nenhuma!
E pronto. Foi mais um congresso do PS, o segundo em menos de 6 meses. Em cinco, o último – em que toda aquela gente se reuniu para exaltar Sócrates - foi há precisamente cinco meses. E no entanto parece que foi já há tanto tempo… Tanto que já ninguém se lembra!
Este congresso apenas não ficará na memória de toda a gente como o congresso da amnésia porque houve alguém que se lembrou de alguma coisa. Não fosse António José Seguro – que também já não se lembrava que tinha passado os três dias daquele fim-de-semana do princípio de Abril agachado atrás dos arbustos– lembrar-se de umas palavras de Almeida Santos há muitos anos e estaríamos a gora a falar de um congresso de esquecidos. E para esquecer!
Mas não, o novo líder guardara, bem e durante muitos tempo, umas palavrinhas do velho presidente para, agora e ali, lhas devolver: “Caro António, ainda vamos ouvir falar muito de si!” O que se faz por um elogio…
No último congresso elogios ao querido líder foi coisa que não faltou. Foi de mais, foi moléstia! Quem não se lembra do arrebatador Zé do António Vitorino? Desta vez o líder se os quis teve mesmo que deitar mão ao faça você mesmo. Nem que para isso tivesse que romper com a amnésia geral do congresso. E que prognosticar um grande futuro a Almeida Santos … o novo presidente honorário!
De resto, nem tudo foi mau. Ficamos a saber "que as pessoas estão primeiro" e que o PS recusa a política de soundbytes e da televisão. Como se viu logo no arranque...
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