O congresso do PSD deste fim de semana foi mais parecido com um comício do que com um congresso. Lá apareceu Cavaco, a dar perceber que Montenegro o preferiu a Passos. E como se percebe...
Saiu à pressa, porque a mulher já o esperava para jantar. E Cavaco não é de deixar a mulher à espera, nem de deixar o jantar arrefecer. Passos poderia não ter tanta pressa.
Montenegro lá espalhou promessas. Prometeu tudo. Não a todos, mas aos que se contam em votos. Aumenta pensões, claro. A mínima promete chegar aos 820 euros. E há-de até igualar o salário mínimo. É mesmo assim, iguala a retribuição a quem trabalha a uma pensão a quem não contribuiu. E claro, vai pagar tudo aos professores. Os tais seis anos, seis meses e 23 dias. É tudo para pagar, votem lá...
Nem assim convenceu os companheiros de congresso. Há deles, e parece que não são poucos, que acham nem assim lá "chega". É preciso “uma base comum que possa dar o tal élan que permita acrescentar ao que o nosso líder tem feito” - disse Nuno Morais Sarmento, um deles.
Pois é. O problema é essa "base comum". O IL já deu "tampa". Há o CDS, e o PPM. Mas isso é na História.
Olha-se à volta ... e não "chega" para "base comum". Então há que contar com os eleitores do PS que se assustam com Pedro Nuno Santos. Ora aí está, como dizia o Ricardo Araújo Pereira, o congresso do PSD elegeu o líder do PS. Os socialistas já não têm que se dar a essa maçada, Montenegro resolve tudo. E até isso.
Em "comício", Montenegro resolve tudo. Tem outro problema: percebe pouco do que se passa à volta. Ainda não percebeu por que é que Francisco Assis foi o primeiro protagonista da candidatura do "radical" Pedro Nuno. Nem por que é se lhe juntou Álvaro Beleza.
Pois é. Sem Chega, não chega mesmo. E o diabo - afinal ele havia de chegar - é que nos Açores as coisas não correram nada bem, mesmo que disso não desse o Congresso notícia. Nem o próprio José Manuel Bolieiro, agora às voltas com o Presidente Marcelo para lhe dar uma segunda oportunidade, e não dissolver a Assembleia Regional.
O diabo é mesmo assim. Aparece donde menos se espera, e até se disfarça de ironia.
Talvez não tenha suscitado tanto interesse como era habitual, mas este quadragésimo Congresso do PSD, não deixou de ocupar o lugar central no espaço mediático deste fim-de-semana. Claro que as directas, ao retirarem aos últimos congressos a suspense da eleição do líder e os jogos de bastidores que lhe abrilhantavam o cartaz, roubaram-lhe a carga maior do espectáculo. Mesmo assim ainda se pode continuar a dizer desta o que se diz da outra - "não há festa como esta".
Montenegro disse e desdisse-se. Disse - esforçou-se por isso - que trazia uma agenda social, que iria combater os baixos salários dos portugueses, desdizendo que "baixar os custos do trabalho foi a reforma que ficou por fazer" pelo seu executivo de referência, do excelso Passos Coelho, o seu ponto no palco da liderança parlamentar do governo que foi para além da troika. Deu "um chega para lá" ao seu antigo companheiro das lides passistas, dizendo-se "nada de políticas xenófobas", e que nunca encabeçaria um Governo que as tolerasse, mas contradizendo-se nos acordos que se farão “quando e se necessários”. Quer dizer, quando e se precisar do Chega para ser poder, bem longe do claro “não” de Jorge Moreira da Silva na disputa das directas.
O resto foi construir e transmitir a ideia de um partido unido à sua volta, para a qual chamou os possíveis adversários que contam, depois de dar os "rioístas" por mortos, o "rioísmo" por enterrado e o "passismo" por ressuscitado. E foi mesmo desta celebração pascal que se fez a festa maior no defunto Pavilhão Rosa Mota, reencarnado Super Bock Arena. Como foi bonito e enternecedor ver aqueles abraços esfuziantes e aqueles sorrisos abertos, de felicidade de orelha a orelha, em velhos rostos sisudos, como se o país tivesse acabado de renascer das trevas. E toda aquela gente saída do inferno a acabar de entrar no eterno paraíso celestial!
O PSD, dividido ao meio nas eleições internas de há duas semanas, depois de quatro anos com cada um para seu lado, surgiu agora em Congresso unido como nunca. Já ninguém apoia ninguém que não seja Rui Rio.
É o que faz o cheiro a poder. Um cheiro que entrou intenso em Santa Maria da Feira, trazido pela aragem das sondagens. Essas mesmas, as - há tão pouco tempo - malditas sondagens. E não qualquer outra coisa.
Não uma mensagem forte, e muito menos propostas empolgantes. Nem outras, na verdade não surgiu uma única proposta para apresentar aos eleitores. Mas é assim a nossa democracia. Não precisamos de propostas, até porque não estamos habituados a que sejam levadas muito a sério. Basta-nos que o poder apodreça nas mãos de quem o tem, e que comece a espalhar mau cheiro. Que cheira ao mais requintado perfume a quem só está à espera que esse cheiro se aproxime.
Tem sido sempre assim. E assim vai continuar a ser a nossa alternância democrática.
Quando o poder apodrece basta agarrá-lo, e o balão enche mesmo com qualquer coisa que não tenha sentido, como Costa ter de dizer se viabiliza um governo do PSD se não ganhar as eleições, quando já disse que se vai embora se não as ganhar.
E no entanto é esta a ideia mais forte que do Congresso saiu para fazer vida na campanha!
Percebeu-se o esforço de tentar fazer sair do Congresso do PSD a ideia de unidade do partido. Do partido como um todo e do partido à volta do novo líder.
Santana Lopes foi o pivot desse processo. Quase que apareceu no Congresso como se tivesse sido ele a ganhar as directas. Baralhou, partiu e deu. E, claro, ficou com as melhores cartas... Nesse aspecto foi um congresso "à antiga", e sabe-se como Santana Lopes gosta disso.
Mas não resultou. NInguém ficou com a ideia que o PSD tenha saído deste congresso unido e com uma liderança forte e duradoura. Antes pelo contrário. Ficou a ideia de um saco de gatos assanhados onde tudo vai valer. Luís Montenegro puxou logo ali da faca, e não a vai voltar a pousar na baínha. E Rui Rio, com a meteórica ascensão de Elina Fraga (confessem lá: quem é que sabia que a senhora era do PSD? Não pensavam todos que era do partido do Marinho Pinto, se é que ainda existe?) não cedeu ao populismo, como diz Marques Mendes, cedeu à vingança. Foi uma facada nas costas do Passismo!
Mas, se o Congresso não conseguiu sequer deixar a ideia de um partido pacificado (quanto mais unido), também a ideia de um partido regenerado por uma liderança asséptica morre na fotografia do novo líder ladeado, à direita, pela imagem do populismo justiceiro e, à esquerda, pela do oportunismo promíscuo. Com Elina Fraga de um lado e José Luís Arnaut do outro, a ética de Rui Rio não cabe na fotografia!
Não surpreende que Passos Coelho tenha procurado - e pelos vistos encontrado - na(s) Universidade(s) a porta de entrada na vida profissional, agora que, pelos vistos, fecha a porta da política. Não surpreende que alguém cuja única especialidade conhecida era a de abrir portas, seja tão expedito a abri-las para si próprio. Não surpreende sequer alguém que levou vinte anos a fazer uma licenciatura, depois de passar pela chefia de um governo, fique automaticamente qualificado para professor universitário. O que verdadeiramente surpreende é o despudor da imprensa que temos.
Sem ela, sem essa imprensa, Passos não teria exponenciado a sua especialidade em portas. Foi com ela que, em muito pouco tempo, Passos transformou a pequenina portinha de saída que o diabo lhe tinha apontado na porta grande por onde vai sair este fim de semana.
Não me admiraria muito numa parceria entre os principais players do negócio dos media e algumas universidades privadas para explorar a fileira da porta, sob a cátedra de Pedro Passos Coelho.
O Congresso do PSD tinha de dizer qualquer coisa sobre o que aí vem. E disse, coisa pouca, porque o tema por lá mais apetecido continua a ser o passado - como se lá pudessem encontrar alguma coisa de que se pudessem orgulhar - mas disse.
Melhor: deixou dito, nas entrelinhas. Deixou dito que Passos Coelho, depois de grande esforço, acredita finalmente que já não é primeiro-ministro. Mas que já não acredita que possa voltar a sê-lo. Por isso começou a preparar a sucessão, para assegurar a sua dinastia. Por isso deixou dito que seria Maria Luís Albuquerque a seguir-lhe na linha sucessória. Porque uma desgraça nunca vem só!
Depois de há poucas semanas ter garantido a renovação da liderança do partido por números norte-coreanos, Pedro Passos Coelho chega às vésperas do Congresso em adiantado estado de isolamento, cada vez mais entregue a si próprio. Aquele aplauso espontâneo e demorado do restrito núcleo dos apoiantes/dependentes feito deputados, ontem, no Parlamento, é prova disso mesmo. De decadência, de que o fim da linha está próximo, a lembrar Marcelo Caetano em Alvalade, a poucos dias do 25 de Abril, faz hoje precisamente 42 anos.
Não é apenas Paulo Rangel, que pode não ter princípios, mas não é estúpido, a perceber isso. Nem Rui Rio, que também não. Nem estúpido, nem modesto: "Se eu lá fosse, ainda me arriscava a ser um elemento central do congresso ...eu não quero perturbar"!
O fim-de-semana está a chegar ao fim e o Congresso do PSD já lá chegou. Acabou a festa, acabou o espectáculo, acabaram os números de ilusão e magia... É tempo de voltar à realidade!
Amanhã é segunda-feira e tudo vai estar como deixamos na sexta. Nada mudou, mesmo que Marcelo tenha mudado alguma coisa, e Cristo volte, como Relvas. E que Seguro se tenha deixado ir a reboque de Rangel, e que Assis tenha deixado de se importar de ser a terceira ou quarta escolha ...
Não há meio desta gente se entender com a realidade!
O mega espetáculo em que as televisões transformam a super-produção que é o Congresso do PSD contou com a participação de uma vedeta surpresa. O artista convidado, mesmo que, ao que disse, auto-convidado, fez jus ao seu estatuto de vedeta de primeira grandeza e tomou conta do espectáculo. Mas deu um jeitão!
Deu jeito ao Passos mas, como não há almoços grátis, deixou-o encostado à parede. Só falta o Congresso - que resolveu a contra gosto (Menezes desbocou, mais uma vez) o problema das europeias - resolver também já o problema das presidenciais e decidir o apoio à candidatura da vedeta. Provavelmente não têm lata para tanto. Mas já não há volta a dar, já não há cata-vento nenhum. E, como se viu, essa coisa de ser comentador político, em vez de ameaça é oportunidade. E que oportunidade!
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