Por mais forte e inicisiva que seja a agenda da direita para descredibilizar o governo da gerigonça, não faltam motivos e oportunidades para salientar a abissal diferença de senso e de credibilidade entre as iniciativas que este governo vai apresentando e as congéneres do anterior.
O Aventar dá hoje expressão a uma dessas gritantes diferenças ao comparar o discurso e as iniciativas deste governo sobre o empreendedorismo com as do anterior. Comparar o programa "Start Up Portugal", ontem apresentado por António Costa no Porto, com o equivalente "Impulso Jovem" apresentado por Relvas com aquele rapaz a bater punho, como o Bruno Santos faz no Aventar, é a melhor forma de responder ao inqualificável discurso que Passos Coelho anda a passar sobre confiança.
Pois é. Há três anos Teixeira dos Santos declarava que a taxa de juro de 7% seria o limiar a partir do qual o país teria de chamar o FMI. O país não conseguia suportar taxas de juro dessa ordem. Foi imprudência, claro. Os mercados especulativos ficavam na altura a saber que poderiam esticar até aí ...
Este governo tem falhado tudo o que havia para falhar, como estamos fartos de saber e já ninguém consegue negar. Temos no entanto visto que aquele pequeno grupo de pessoas que, na esfera dos dois partidos que suportam o governo, ainda defende esta governação socorre-se, para isso, de um único argumento: o da credibilidade externa. Esse escasso número de apoiantes deste governo agarra-se ao único mérito que lhe reconhece: a recuperação da credibilidade junto dos credores. E invariavelmente recorrem logo a seguir a um argumento que, por muito repetido, dão por certo e verdadeiro:"como se prova pela descida dos juros"!
É verdade: a taxa de juro que há pouco mais de dois anos era dramaticamente insustentável é hoje a única coisa que os apoiantes deste governo têm para lhe creditar!
O resgate da credibilidade internacional não passa de um mito. É sabido que uma mentira muitas vezes repetida passa a verdade. Mas a máquina de propaganda do governo faz mais: mais do que uma simples verdade, faz da mentira muitas vezes repetidas um mito!
Ontem, no Parlamento, Vítor Gaspar teve mais uma das suas habituais prestações. Para além de voltar a falar dos impostos como se neles não tivesse qualquer responsabilidade, e de se transformar os falhanços rotundos e grosseiros das suas previsões em acertos raramente vistos em tempo de recessão, salientou os verdadeiros mas escassos aspectos positivos: a descida dos juros da dívida pública, a redução do défice primário e … o aumento da credibilidade do país.
Se a descida das taxas de juro da dívida pública nos mercados secundários e a redução do défice primário são dados objectivos e factos provados, o aumento da credibilidade externa do país já o não é. Não há nada que a meça, apenas se poderá concluir a partir de dados e indicadores que possam apontar nesse sentido. O comportamento das taxas de juro até poderá ser um deles, mas só isso!
Mas quando um jornal como o El País diz que o governo está a vender Portugal e se refere, da forma que o faz, aos processos das privatizações recentes, como a da EDP, ou em curso, como as da TAP e da RTP, não há razão nenhuma para avaliar em alta a credibilidade do governo. Que é quem precisamente faz a do país!
Estou absolutamente espantado com a reacção do líder da oposição à comunicação do primeiro-ministro, de ontem!
António José Seguro, que foi tão rápido - e tão pouco inteligente (não denunciando a posição do governo, tão distante da tão saudável quanto tardia decisão do BCE, contra ventos e marés, e tão próximo da alemã) - a comentar ao programa de compra de dívida do BCE, que Mario Draghi anunciara na véspera, não teve uma única palavra sobre a nova catástrofe que Passos Coelho fez abater sobre o país. Já lá vão mais de 30 horas e nem sequer as enormidades e as mentiras de Passos Coelho levam o líder da oposição à mínima reacção!
Já poucos tínhamos poucas dúvidas sobre a desgraça que é ter António José Seguro como alternativa. A partir de hoje já ninguém terá dúvida nenhuma!
Como alguém escrevia hoje num jornal, tem de haver alternativa. O drama é que não há, a catástrofe deste nosso país é que nos permitimos estar entregues aos Sócrates, Passos, Relvas, Seguros… Tudo gente da mesma escola, massa feita do mesmo fermento!
A entrevista de Sócrates à RTP confirma tudo o que já sabíamos, incluindo as suas dificuldades de convivência com a verdade, o seu divórcio da realidade e a sua capacidade manipuladora. E o TGV, evidentemente! Um erro, um mea culpa? Nada!
Tentou manipular a entrevista conforme tenta manipular a realidade, chegando ao ponto - em que é useiro e vezeiro – de hostilizar em particular a entrevistadora para, dessa maneira, controlar ele próprio toda a entrevista.
Eis alguns exemplos:
“… desculpe, essa pergunta não está correctamente formulada…”
“… essa pergunta que me faz não tem a mínima fundamentação …”
“… desculpe mas essa pergunta ofende-me …”
“…isto é fácil de entender para quem esteja de boa-fé e de espírito aberto…”
“… reconheça que não tem razão …”
De resto, porque a ajuda externa, a sua teimosa aposta para trunfo no jogo em que ele transformou a vida do país e de todos nós, e o chumbo do PEC IV, em que assenta a cartada da sua estratégia vitimização, também não são novidade, tomei nota da sua relação com a dívida - a nossa maior desgraça. Uma relação de assustadora irresponsabilidade!
Veja-se: O TGV não é problema porque o financiamento já está negociado com os bancos. E até com baixas taxas de juro, como enfatizou! Não há pois, do seu ponto de vista, nenhum problema em aumentar o endividamento e estamos em óptimas condições de o fazer. O que importa é que a taxa de juros até é boa…
A mesma irresponsabilidade com que, com a maior das naturalidades afirmou que era normal não ter dinheiro em cofre para pagar o serviço da dívida. Que o normal é, nestas circunstâncias, pedir emprestado.
Foi esta a maior lição que Sócrates hoje nos deixou: quando chega a hora de pagarmos as nossas dívidas não há qualquer problema em não ter dinheiro. Isso é normal, tão normal como ir pedir dinheiro emprestado para as pagar.
Sócrates, que disto fez prática ao longo destes seis anos da nossa desgraça, vem agora dizer-nos que assim é que é! E mais, que é isso que todos devemos fazer, porque isso é que é normal. Francamente…
Começou a corrida às nomeações e promoções que, em Portugal, se assemelham às corridas aos saldos. Dantes, quando funcionava a normalidade, havia a época de saldos – nos tempos que correm quem quiser vender alguma coisa tem de fazer saldos todo o ano – e as pessoas chegavam a fazer filas às portas dos principais estabelecimentos para ganharem uma corrida cujo prémio eram as melhores peças, precisamente por serem os primeiros a escolher. À medida que os anos foram passando, e as corridas aos saldos desaparecendo, fosse porque a época se alargava fosse porque já nem para saldos havia dinheiro, fomo-nos apercebendo da chegada de uma nova corrida: a corrida às nomeações e às promoções de fim de época!
Invariavelmente, independente da cor – também aqui não há santinhos – os governos em fim de prazo canalizam todas as energias para as nomeações de última hora.
Este governo não poderia (como poderia?) fugir à regra. Nem a catástrofe em que deixaram o país mergulhado, nem uma réstia de vergonha pelos sucessivos escândalos que afundaram o país na mais grave crise moral do último século - mais grave que todas as outras (económica, financeira e política) juntas - impediu este governo de, à última hora, instalar mais umas dúzias de boys: 156 nomeações numa semana, depois da demissão. É obra! E nós a pensarmos que já tinham comido tudo… Que já só restavam ossos!
Compreende-se agora que os poderes de um governo de gestão se esgotam em nomeações e promoções. Como é que poderiam chegar para resolver os problemas do financiamento do país?
Se esta gente nem consegue perceber o que está a fazer ao país como é que se pode esperar que sejam capazes de nos tirar daqui, deste buraco onde nos meteram?
A actual situação política, económica e social do país faz convergir os portugueses na responsabilização da classe política. Na descredibilização dos partidos e do próprio sistema político. Hoje os portugueses não têm dúvidas em apontar os partidos, e em particular os partidos do sistema ou do arco do poder, como os grandes culpados da situação a que o país chegou.
Os sucessivos escândalos que envolvem a classe política – desde a óbvia corrupção, confirmada ou apenas suspeita, à cadeia de favorecimentos à volta do poder, passando pela incompetência nas decisões – mais não fazem que agravar a perspectiva que os portugueses têm dos políticos.
Isto é, nós portugueses não só responsabilizamos a classe política clássica, do governo à oposição, pelo buraco em que o país está metido como, dada a conta em que os temos, ainda lhes não reconhecemos qualquer capacidade para nos tirarem desse buraco.
E, no entanto, pelo que vamos vendo pelas sondagens, tudo indica que o comportamento dos portugueses, na hora de fazer uso do mais decisivo instrumento que a democracia lhes disponibiliza, se dispõem a entregar o seu voto como se nada disso fosse verdade. Parece que, ao contrário do que se passou há pouco mais de um ano, penalizam um pouco mais o governo, é certo. E premeiam o principal partido da oposição, contrariando o discurso generalizado, como se o nosso sistema político mais não seja mais que um circuito de vasos comunicantes. Fazem como precisamente sempre fizeram até aqui!
Entretanto, e perante o tsunami de sacrifícios exigidos sempre aos mesmos, lado a lado com os milhões que se enterram no BPN, ou com a antecipação dos milhares de milhões de dividendos para fugir aos impostos do próximo ano, alguns tentam dar umas alfinetadas. Tentam espevitar uma imensa mole humana meia anestesiada, que acusam de mansos e incapazes de vencer a inércia para se mexerem e protestar. Dar um safanão em tudo isto. Gritar bem alto e esbracejar para que eles vejam que existimos e que somos capazes de muito mais do que simplesmente aguentar com a carga que nos põem em cima.
É neste quadro que decorre a campanha para as próximas eleições presidenciais, supostamente um período de intenso debate.
E o que vemos?
Vemos a comunicação social a levar ao colo o actual Presidente da República e candidato maior do regime. Vemos os media a estabelecer as balizas do discurso da campanha exactamente à medida dos poderes presidenciais: se alguém toca num qualquer problema é logo acusado de ignorante ou mesmo de demagogo, porque bem sabe que aquilo não cabe nos poderes do presidente. Como se ao eleitorado não interesse saber o que pensa um candidato dos problemas do país. Como se as decisões do presidente, dentro da sua esfera de poderes, se não enquadrem num pensamento político, em opções ideológicas ou simplesmente em valores.
Vemos que o caso BPN, mesmo que plenamente justificado pela actualidade – início do julgamento, insucesso da operação de venda, insucesso da gestão após nacionalização, mais 500 milhões para as aflições (apenas para mais uma aflição, porque não cobre sequer um terço do valor negativo dos capitais próprios, portanto não resolve problema nenhum) – não pode ser trazido a debate. Que é jogo sujo, populismo, demagogia … É até tiro no pé!
E vemos o único candidato vindo de fora do sistema, aquele que parecia ter todas as condições (um assinalável capital de prestígio e um total descomprometimento com o sistema) para protagonizar uma candidatura de rotura e de esperança numa nova forma de fazer política e de, em última instância, fazer implodir o edifício velho e caduco que alberga este sistema político podre, doente e viciado tornar-se, num ápice, parecido com os outros. Com os mesmos tiques, praticamente o mesmo discurso, os mesmos truques…
Vemos uma esperança transformar-se numa desilusão. E a comunicação social a falar de falta de experiência política sempre à luz de um padrão que segue um guião amarrotado, bafiento e falido!
O nosso primeiro-ministro garante-nos que as medidas anunciadas na semana passada “são suficientes para restaurar a credibilidade do Estado Português junto dos agentes financeiros”.
Fosse a credibilidade o forte do nosso primeiro-ministro, ou não nos tivesse já dito o mesmo no PEC I e depois no PEC II, quando o mundo mudara em duas semanas, e alguns de nós, os menos dados à análise destas coisas da economia, até poderiam acreditar.
Mas não. Não dá para acreditar: estas medidas, que ao contrário do apregoado não incidem em primeira ordem na redução da despesa – a redução na despesa é exactamente do mesmo sinal do aumento dos impostos, e não de efectivo corte nos desperdícios do Estado – espremem a classe média e têm consequências na economia, no crescimento económico.
O FMI apresentou esta semana uma previsão de crescimento zero que corrigiu, logo que percebeu que essa previsão não tinha em conta aquelas medidas, para um crescimento negativo de 1,4%.
Já toda a gente percebeu que em 2011 a economia portuguesa entrará de novo em recessão e que, mesmo que aquelas medidas tivessem acalmado (restaurado a credibilidade, nas palavras do primeiro-ministro) os mercados – o que as operações de colocação de dívida desta semana não confirmaram –, eles voltariam a agitar-se com o crescimento negativo que, evidentemente, lança a economia portuguesa numa espiral de recessão que se transforma num beco sem saída. Os mercados hoje penalizam-nos fortemente pelo comportamento do défice orçamental. Amanhã penalizar-nos-ão ainda mais pelo desempenho do produto!
Portanto estas medidas, ao contrário do que o senhor primeiro-ministro garante, não são suficientes. Nem credíveis!
No dia em que ficamos a conhecer os escalões de corte nos salários da função pública – cinco escalões, com o primeiro a iniciar-se nos 1.500 euros (com corte de 3,5%) e o último nos 4.200 (onde o corte é de 10%) – é bom lembrar que credibilidade rima com responsabilidade!
Sem que se inverta o sentido de responsabilidade de quem nos governa, de quem nos governou e nos levou a abdicar de produzir em troca de subsídios, e de quem fatalmente nos virá a governar, nunca Portugal conseguirá restaurar a credibilidade!
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