Portugal tem um indesmentível e complexo problema de crescimento económico. Hoje tão iniludível que foi finalmente trazido para o debate eleitoral, nesta campanha. Se não se pode dizer que seja transversal a toda a campanha, menos se poderá dizer que tenha sido trazido em toda a sua plenitude. E, menos ainda, em modo de debate sério
Portugal tem vários problemas estruturais que confluem no problema do crescimento, como uma vasta rede de afluentes a desaguar no rio. Olhar para o estado do rio sem ver o que vem dos afluentes a montante é não querer perceber nada. E o que se não quer perceber, não se quer resolver.
É verdade que o tema veio para a campanha pela mão da direita, e em particular pela da Iniciativa Liberal, que dele faz prato principal. Daí passou para a agenda do PSD. A esquerda, mal, pouco mais fez que ignorá-lo, e deixou a direita sozinha a tratar do assunto da forma que entendeu. Com um mau diagnóstico, a receita nunca poderia ser mais que banha da cobra.
O diagnóstico partiu da comparação do crescimento dos países de leste, do lado de lá da antiga cortina de ferro, com o de Portugal. Não é por acaso, é um diagnóstico propositadamente enviesado para apontar ao fim político. Ignora que todos os países crescem mais nos primeiros 15 a 20 anos da adesão à Comunidade Europeia, por razões tão óbvias, que me dispenso de enumerar. Ignora as qualificações desses países à partida. Ignora o grau de especialização industrial da sua maioria. E ignora a sua centralidade geográfica e, em particular, as paredes meias com as maiores e mais desenvolvidas economias da União.
Ignora tudo isto para relevar as suas políticas liberais. De liberalismo.económico, evidentemente. Porque os outros não lhe importam. Os meios não devem justificar os fins, mas é campanha eleitoral... Temos de ser condescendentes.
O problema é a receita. Nessa já não pode haver condescendência. E a receita, adiantada por Cotrim de Figueiredo e logo apadrinhada por Rui Rio, é baixar o IRC. É simples: baixa-se o IRC e a economia desata a crescer!
Um vendedor de banha da cobra não faria pior. Mas esse nem disputa eleições nem se propõe a fazer crescer o país. Fica-se pelas dores de barriga e afins...
À medida que se vão confirmando as boas notícias da economia portuguesa, como hoje o INE a oficializar o crescimento de 2,8% no primeiro trimestre, ou Álvaro Santos Pereira, o revogado pelo irrevogável, a garantir que a OCDE vai rever em alta as perspectivas de crescimento económico em Portugal, mais voltas o eixo PAM (Passos - Albuquerque - Montenegro) dá.
De tantas voltas, já têm a cabeça a andar à roda. Já não dizem coisa com coisa. Vejam bem que, depois de andarem a dizer que nada daquilo ia dar certo, que estava tudo errado, que era uma impossibilidade aritmética, que eram histórias para meninos, e de rirem na cara de Centeno como se ele fosse o palhaço lá da turma vêm, agora que lhes entra pelos olhos dentro que está a correr bem, dizer que... foi por eles que correu bem. Que aquilo que não podia correr bem, porque era tudo ao contrário do que eles tinham feito, correu bem, porque eles tinham feito o contrário do que foi feito, e que está a correr bem...
Já estão também com a cabeça a andar à roda, não estão? Pois...
À medida que são anuncados novos e mais resultados positivos da economia portuguesa, aumenta a depressão da nossa direita radical, com reacções cada vez mais deprimentes.
Primeiro, o diabo estava em todo o lado. Depois passaria a estar no défice, essa coisa sagrada em nome da qual tudo teria de ser sacrificado. Não estava no défice, ou, se lá esteve, foi tão rapidamente escorraçado que nem se deu por ele. Tinha-se passado para o crescimento, só podia.... Tem que estar no crescimento, daí não dá para escapar!
Afinal, também não. Também não está aí. Se calhar não há mesmo diabo...
Ah... esperem aí. Não há diabo mas ainda há por onde pegar nisto: o crescimento não vale. Existe, está aí à vista, mas é a derrota da política da geringonça, não tem nada a ver com o modelo económico que nos venderam. O modelo apostava no consumo interno, e este crescimento vem das exportações. Exactamente! As exportações que ganhariam competitividade com a redução dos custos do trabalho, a tal reforma estrutural que Passos lamentou não ter concluído.
Mesmo assim, lembra Maria Luís, mesmo sem ter concluído essa patriótica tarefa, e nuclear reforma, de deixar os custos do trabalho em Portugal ao nível dos do Vietnam, os resultados estão à vista. Este crescimento é nosso, sem a nossa missão visionária, a economia portuguesa continuaria a passo de caracol.
Deprimentes. Até a matar o diabo...
No meio disto tudo apanho com o Salvador Sobral, num daqueles seus apartes, em pleno corredor do triunfo, no "off" a que agora perdeu direito, a dar-lhe com esta: "... ganhamos o europeu, ganhamos a eurovisão, temos um governo de jeito..." Pois é!
Na manchete da sua última edição, à esquerda - edição de fim de semana, para que não restem dúvidas - o Jornal de Negócios diz-nos que a economia da geringonça já deu o que tinha a dar. "Não dá mais"!
Na seguinte, na edição de hoje, no mesmo Jornal de Negócios, no mesmo espaço de manchete, diz-nos que a "Economia acelera para máximo de sete anos".
O que um fim de semana faz!
Todos sabemos que este foi o fim de semana de 13 de Maio. Como foi extraordinário e provavelmente irrepetível. Mas ninguém imaginaria que tivesse virado do avesso as perspectivas da economia portuguesa. Mas é para isso que temos jornais como o Jornal de Negócios: é para nos mostrar com tanta clareza aquilo que nem nos passa pela imaginação.
E se agora vos disser que a manchete de hoje não tem nada a ver com o fim de semana? Que tem apenas e só a ver com o que o INE vai hoje anunciar, que o crescimento económico do primeiro trimestre é o maior dos últimos sete anos?
Desconfio que me dirão que é ainda mais extraordinário que o extraordinário fim de semana que acabamos de viver...
Quando um grupo, um partido, uma seita ou seja lá o que for, não concebe outra posição que a do contra, teimosamente amuado nas suas limitações e obstinandamente contra tudo e contra todos, nada lhe corre bem. E tudo corre bem aos outros...
O governo chegou a acordo com o Santander, sobre os ruinosos swaps contratados pelas empresas públicas de transportes, que galopavam recursos perdidos nos tribunais de Londres (primeira derrota de Passos Coelho que, por tudo, queria ficar nos tribunais nacionais). Pagamos, custa-nos dinheiro, mas não havia volta a dar. E resolveu-se, com um desfecho bem melhor do que certamente resultaria da sentença judicial...
Com um banco a operar em Portugal com a dimensão do Santander qualquer outra saída que não a negociação era, evidentemente, absurda.
Que posição tomou imediatamente o PSD?
Dizer, através do inefável deputado Leitão Amaro, que a culpa de tudo isso era de um governo do PS. Não teve outro ponto de observação, nem ao de leve se relacionou com os factos. Que aí estão, claros e insofismáveis: três quartos (75%) dos 2,648 mil milhões de euros de perdas concentraram-se nas empresas dos Metros de Lisboa e do Porto, e os respectivos contratos estão assinados por boys do PSD. Alguns com lugar no governo de Passos, pelas mãos de Maria Luís Albuquerque, também ela com assinatura reconhecida nos contratados pela Refer, e de Marco António Costa, que também passara pela administração do Metro do Porto.
Quando, na semana passada, surgiram boas notícias sobre o desemprego, António Costa rejubilou mas adiantou logo que estariam a chegar, na próxima semana - que é esta -, mais boas notícias. E melhores!
Toda a gente se pôs a advinhar, mas ninguém acertou. Os analistas achavam que a queda do desemprego não fazia sentido (agora já não cai por via administrativa, já lá vai esse tempo, o efeito já se perdeu) sem que ninguém se lembrasse que poderia fazer sentido se a economia estivesse a crescer mais do que se dizia. E foi por isso com grande surpresa que ontem foram recebidos os dados do INE sobre o crescimento económico no terceiro trimestre: 1,6%!
Mais que o número - 1,6 é naturalmente curto para as necessidades, mas inquestionavelmente grande e significativo para a História deste século - o que impressiona é que, de repente, a economia portuguesa passou a ser a que mais cresceu na União Europeia.
Sabendo-se que o crescimento económico era a maior dificuldade do país, a maior dor de cabeça do governo e a pedra mais à mão da direita na oposição, estes dados, para além de constituírem uma grande notícia para o país, são obviamente uma excelente notícia para o governo.
Boa notícia é também que não se viu o governo embandeirar em arco. Não me parece que, passe embora o aproveitamento que disso fez para alargar a corda a Centeno (se fosse no futebol seria certo que Mário Centeno estaria despedido: quando o presidente apresenta publicamente votos de confiança no treinador, é invariavelmente sinal que estará na rua em pouco tempo), António Costa tenha exagerado nos festejos.
Que não seja notícia de primeira página de qualquer jornal é que já não é sequer notícia. É assim. De todos, apenas o Jornal de Negócios traz o tema para capa. Mas apenas o tema, que não a notícia: "Economia acelera com exportações e turismo". Nada de confusões!
Se a notícia fosse exactamente ao contrário era ver as capas dos jornais: "Portugal é quem menos cresce na Europa"; ou "Economia não descola"; ou tantos outros títulos do género...
Paul Krugman voltou a passar por cá. E a defender as teses da anti-austeridade, a apontar o dedo ao fundamentalismo (político) económico reinante na União Europeia e, de uma forma geral, a dar cobertura à política económica do governo.
Apontou os dois maiores riscos da economia portuguesa: o envelhecimento da população - com o que representa de encargos, e com o que dificulta a inovação e o consumo - e a emigração, a caixa da emigração jovem que se abriu nos últimos quatro anos.
Na realidade entendo que Krugman se referia às duas maiores ameaças que pairam sobre a nossa economia e a nossa sociedade: a natalidade - hoje, mais uma vez, em discussão na Assembleia da República - e a emigração. O resto são tretas, modas, ou o que lhe queiram chamar.
O problema, como se qualquer deles não fosse suficientemente grave, é que ambos convergem para o mesmo ponto: o envelhecimento da população. Se, não nascendo gente nova, a população envelhece, envelhece ainda mais quando os mais novos partem, ficando apenas os mais velhos.
Fomentar a natalidade e estancar a emigração - é um fenómeno de pura aberração que um país pobre gaste recursos a formar pessoas para depois entregar os países mais ricos - não é uma mera decisão política. Tem que ser, sem qualquer sombra de dúvida, o principal objectivo estratégico do país. Mas, aí está: sem crescimento económico não vale sequer a pena enunciá-lo.
Afinal o milagre económico não aconteceu, como toda a gente que não corre atrás de canas de foguete sabia, e o anémico crescimento foi interrompido logo no primeiro trimestre deste ano. Como sempre aqui se disse a interrupção da recessão resultou mais de comportamentos da física do que da economia: simplesmente nalgum ponto deixa de se cair, é quando se toca no fundo.
O governo, este governo agora sempre em festa, reagiu aos dados do INE que agora lhe não davam jeito nenhum. Não deixou de ser curioso que a conta tenha sobrado para o ministro Marques Guedes. O primeiro-ministro Passos Coelho, o vice Portas ou o ministro da economia, Pires de Lima continuam entretidos, e embriagados, com a festa. Não podiam deixar que os números a viessem agora estragar…
Não menos curiosa é a explicação apresentada para o regresso ao crescimento negativo, como agora se diz. Para não estragar a festa o ministro Marques Guedes veio descansar os portugueses, dizendo que não havia qualquer razão para alarme porque a quebra do PIB no I trimestre resultava apenas de uma quebra nas exportações provocada por uma situação irrepetível durante o ano – o encerramento para manutenção da refinaria da GALP em Sines. Não é apenas curioso que no mesmo período não tenham diminuído as importações de petróleo. É mais curioso ainda que o governo vá pegar exactamente no ponto que sempre foi utilizado para negar a verdade do governo no sucesso da economia e das exportações. Toda a gente se lembra que o governo fazia assentar o seu sucesso económico no aumento exponencial das exportações quando muita gente, entre as quais este modesto escriba, alertava exactamente para o facto de estarem a crescer sim, mas à custa da exportação de refinados de petróleo coisa que, para quem não é infelizmente produtor daquele ouro negro, não tem grande significado porque justamente não tem valor acrescentado.
Não é ironia do destino, é simplesmente a perna curta da mentira. O governo vai buscar para explicar a diminuição exactamente aquilo que sempre negou que explicasse o aumento!
O governo tem este problema congénito: só consegue olhar para um lado... Nunca consegue olhar para mais que um lado!
Acha que para estimular a economia basta incentivar a oferta. Acha que os empresários, só porque têm acesso a crédito ou IRC mais baixo, vão desatar a investir e a criar postos de trabalho.
Do lado da procura... nada! Nem mesmo estando obrigado ao pagamento do subsídio de férias dos funcionários públicos, que ora é de férias ora de natal... Sem procura, investir para quê?
A troika acaba de nos passar no segundo exame trimestral, fazendo uma avaliação positiva da implementação do programa de resgate financeiro e abrindo, assim, caminho a mais uma tranche de 8 mil milhões. Que há-de chegar lá para finais de Dezembro!
Na longa conferência de imprensa onde comunicou os resultados a troika fez alguns alertas. O principal terá sido que os resultados do programa estarão postos em causa se não houver crescimento económico. Como toda a gente percebe, apesar de não parecer!
Isto deixa de ser um simples alerta – um aviso à Cavaco, para depois vir dizer “eu bem avisei” – para passar a ser um sério aviso. E muito preocupante, porque não se vê como seja possível crescimento económico no meio deste mar de medidas recessivas. A não ser que acreditemos que o crescimento económico está assegurado pelas exportações que, de repente, crescem sem limite porque, com a baixa generalizada de salários, o país é acometido de um súbito surto de competitividade. E que acreditemos que há capacidade instalada para tal. E que os nossos mercados estão, também eles, a crescer desmesuradamente…
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