Nove anos depois o Benfica voltou a conquistar a Taça da Liga. A oitava. É caso para dizer que a Taça da Liga voltou a casa. Muito tempo depois. Tanto que ainda nem se falava em "campeão de inverno", e depois de oito anos a vadiar pelas mãos deste e daquele. Mas voltou!
Foi o terceiro dérbi na final da competição. Disputada em Leiria, aqui ao lado, bem no centro de Portugal, e não no estrangeiro, na tal internacionalização prometida por Pedro Proença, antes de perceber que, comparar o nosso futebol ao inglês, ao italiano e ao espanhol, é enganar-nos a nós para se enganar a ele.
E no entanto a primeira parte do dérbi da final desta noite até deu para comparar. Benfica - com a mesma equipa inicial que brilhara a grande altura na meia final, com o Braga (a novidade foi Beste ter ficado de fora, na bancada) - e Sporting - com três alterações no onze relativamente á outra meia final (duas pelas lesões de Morita e de Matheus Reis, a outra por o Rui Borges ter retirado o surpreendente Fresneda) - ofereceram-nos uma primeira parte de alto nível, como se joga nos grandes campeonatos do futebol europeu.
Ambas as equipas jogaram em altíssimos ritmo e intensidade, e com enorme pressão em todas as zonas do campo. O Benfica fê-lo através de um jogo mais elaborado, e mais agradável à vista, enquanto o Sporting o fez mais através de um futebol directo. O Benfica jogava um futebol mais associativo, trabalhado nos três corredores, especialmente pelos laterais, frequentemente com mudanças de flanco, obra de Di Maria - mais uma grande exibição! - e de Kokçu.
Esta espécie de contraponto entre as duas equipas, naquele registo de intensidade, acabou por trazer ainda mais espectacularidade ao jogo. Era virtualmente impossível manter aquele ritmo na segunda parte, disso ninguém tinha dúvidas.
Os golos acabam por se encaixar no que foi o jogo. E até de o justificar. O Benfica inaugurou o marcador às portas da meia hora de jogo, num bonito golo de Schjelderup, assistido por Di Maria, justamente num passe da direita para esquerda. O Sporting empatou à beira do intervalo, num penálti assinalado pelo árbitro João Pinheiro, e convertido por Gyokeres.
O golo do empate, e as circunstâncias em que ocorreu, transporta-nos para os temas da arbitragem e da sorte, que aqui trouxe há pouco. Dizia então que, com razão de queixa das arbitragens, não era por elas que o Benfica perdera. E que a equipa não tinha sorte, mas também não fazia por a merecer.
Pela dualidade de critérios que João Pinheiro evidenciou ao longo de todo o jogo, e pela forma como nunca assinalou nenhuma das muitas faltas sobre o Di Maria, apesar de o contra-factual ser impossível de provar, tenho poucas dúvidas que o penálti assinalado a Florentino nunca o seria, em idênticas circunstâncias, contra o Sporting. Exactamente como o uso da mão por parte do João Simões, dentro da sua grande área, teria dado penálti se tivesse ocorrido na área do Benfica. Ou como, se no final da primeira parte, a chapada do Maxi ao Otamendi, tivesse sido ao contrário, João Pinheiro teria puxado do cartão vermelho.
Na primeira parte o Benfica merecia ter sorte. Tinha feito tudo para a merecer, mas voltou a não a ter. Não a teve nas circunstâncias em que o penálti foi assinalado. E voltou a não a ter quando Trubin o defendeu com o pé, e a bola subiu para cair dentro da baliza. Por poucos centímetros teria saído. Os mesmos poucos centímetros que, por clara falta de sorte de Pavlidis, impediram o 2-0, logo a seguir ao primeiro golo.
E assim - e com uma segunda parte igualmente emotiva, mas claramente de bem menor qualidade, por força do desgaste físico (o Benfica estava a jogar menos de 72 horas depois do jogo das meias finais, o Sporting tinha-a jogados 24 horas antes) - o empate subsistiu até ao final. E o troféu foi decidido nos pontapés da marca da grande penalidade, nos penáltis, como se diz.
Na primeira séria de cinco ninguém falhou, nem ninguém defendeu. E só não foram todos os dez excepcionalmente bem executados porque não se poderá dizer que o quinto do Benfica, marcado pelo Renato Sanches, tenha sido muito bem marcado. O guarda-redes do Sporting - Franco Israel devia estar com grande moral, sabendo que já contrataram o Rui Silva ao Bétis para o seu lugar - ainda tocou na bola.
A partir daí quem falhasse perdia. Do lado do Benfica, Leandro Barreiro marcou o sexto, e Florentino - o homem do jogo - o sétimo. Ambos irrepreensíveis. Quenda ainda marcou o sexto, mas já aí tinha deixado francas possibilidades a Trubin de defender. Calhou a Trincão permitir-lhe a defesa decisiva.
Da festa. Merecida. O Benfica foi melhor. As estatísticas não mentem: o Benfica teve mais bola, mais ataques, mais remates (16, contra 10, e 4 contra 3 enquadrados), fez mais passes, e mais passes certos.
Foi bonita, a festa. E foi muito bonito ver Trubin, em vez de sair a correr disparado para o festejo, dirigir-se a Trincão e abraçá-lo. A sua prioridade foi confortar um adversário, e isso é bonito. Como fez também, e foi igualmente bonito, Bruno Lage.
Cabia ao Benfica entrar mandão no jogo para tentar explorar o momento depressivo do Sporting, acentuar a desconfiança dos seus adversários, e criar dúvidas à volta do novo comando técnico de Rui Borges, acabado de chegar. Por muito que "dérbi seja dérbi", com a sua imprevisibilidade, e até com a badalada tendência para favoritismos invertidos em função do momento das equipas, seria inevitável que uma forçada má entrada do Sporting marcasse o destino do jogo.
Mas bem sabemos que o Benfica, e em particular o de Bruno Lage, não é dado a essas coisas de entrar de peito feito nos grandes jogos, nos de maior exigência. Por isso permitiu que o Sporting crescesse em crença, errasse menos e crescesse no jogo. E passou a ser o Benfica a errar.
E como errou!
O golo que ditou o resultado, perto da meia hora de jogo, é o paradigma do erro: Otamendi errou, com uma mudança de flanco despropositada a enviar a bola para fora das quatro linhas; depois, a equipa desligou da reposição da bola; depois, ainda, Tomás Araújo falhou completamente a abordagem ao Gyokeres; finalmente ninguém compensou na defesa, permitindo que o Catamo surgisse sozinho na direita a rematar para a baliza.
E no entanto o Benfica sabia - e era capaz - de fazer isso. De entrar mandão no jogo e empurrar o adversário para as profundezas da sua depressão. Mostrou-o na segunda parte, com toda a clareza.
Esse é o problema. Foi o problema hoje, como já o foi noutros jogos. Nos grandes jogos o Benfica reage, em vez de tomar a iniciativa.
Se o Benfica foi capaz de ir para cima de um Sporting já refeito da depressão, moralizado por estar a ganhar, e por uma primeira parte de clara superioridade, e de criar situações de golo suficientes para ganhar o jogo, mais facilmente o poderia ter feito ao Sporting que iniciou o jogo. Bastava querer!
Não digo que o Bruno Lage não quis. Digo que não teve coragem, nem rasgo, nem ambição para o querer.
Assim, o Benfica perdeu o jogo. Mal, porque ainda assim não o mereceu. Perdeu a liderança do campeonato, que tinha acabado de atingir. Caiu de primeiro para terceiro. E ressuscitou o Sporting!
No dérbi em Alvalade o Benfica não repetiu a exibição da Luz, na passada terça-feira. Por isso, ainda que tenha feito suficiente para ganhar o jogo, perdeu-o. Inglória e imerecidamente, mas perdeu-o. E perdeu hoje o campeonato.
Ao intervalo o jogo estava empatado, com o Sporting a marcar nos primeiros segundos, e o Benfica nos últimos. Começa por aí a história do jogo: ninguém, nos primeiros segundos do jogo, pode ter feito o que quer que seja para justificar um golo; nos últimos segundos já tudo pode ter sido feito para o justificar.
O Sporting apanhou-se simplesmente a ganhar. Tudo começou num erro de António Silva, com um passe à queima para Bah, que o Pote aproveitou. Depois foi a premonição que a sorte estava toda virada para os de Alvalade: um ressalto que podia ter tido um destino qualquer acabou por levar Trubin, em rota de colisão com Otamendi, a desviar a bola para a frente (como na Luz) para Catamo fazer o golo.
Começando o jogo a perder o Benfica teve de se fazer à vida. E fez - repito, sem repetir a exibição da há dias na Luz - mas assegurando o domínio do jogo, e sendo melhor. Muita bola, muitos remates, muitos cantos, mas apenas um golo, e já nos últimos segundos. O Sporting pouco mais fez que limitar-se a esperar. A esperar erros do adversário, a esperar que o Gyokeres resolvesse e à espera que o tempo passasse.
A segunda parte foi novamente diferente. Rúben Amorim voltou a cedo mudar as peças, e o Sporting passou a equilibrar o jogo e a geri-lo, satisfeito com o empate. Nas pequenas coisas, nos incidentes do jogo, a sorte sorria-lhe sempre. A bola sobrava sempre para os seus jogadores (o lance do remate de Gyokeres ao ferro é paradigmático: num "despacho" da defesa do Benfica a bola vai bater violentamente na cara do Hjulmand e teve de ressaltar precisamente para o sueco, sozinho, com a baliza à frente). E, no que podia, o Artur Soares Dias, dava uma ajuda. Como fez, a mais de 25 minutos do fim do jogo, ao perdoar o segundo amarelo ao Hjulmand. Ao contrário do que, mais tarde, fez com Aursenes, hoje o melhor jogador do Benfica.
O Benfica ia criando algumas oportunidades. Golos é que não. A bola ou batia em Coates ou no ferro. Rúben Amorim esgotava as substituições (o Morita e o Gonçalo Inácio não atinavam, o Pote esgotou, e depois o Trincão, e o Hjulmand, tinha de sair, já tinha escapado por duas vezes à expulsão, e seria difícil continuar a escapar) à entrada do quarto de hora final. Schemidt fizera pouco antes a primeira (Tengstedt por Cabral). E ficou-se por aí. Já nos descontos, e já depois de o Sporting ter marcado, fez então duas.
No fim, no primeiro dos seis minutos de compensação, Sporting marcou, e ganhou o jogo e o campeonato. Foi num canto, e a bola interceptada pela defesa do Benfica foi novamente direitinha para o pé do Catamo. O Benfica ainda voltou a ter oportunidade de evitar a derrota. Mas a sorte esteve sempre do outro lado ...
Foi um grande jogo de futebol, o dérbi desta noite na Luz, de bancadas cheias de novo.
Foi um grande jogo, e foi um grande jogo do Benfica. Na primeira parte - o melhor que se viu da equipa nesta época - foi absolutamente dominador. Ao intervalo já merecia ter resolvido a eliminatória, tal o domínio sobre o Sporting, e tantas as oportunidades de golo criadas. Noutras circunstâncias, ou noutras alturas, o jogo teria ficado arrumado logo no primeiro quarto de hora.
Diz-se que os dérbis são assim. Que normalmente quem está em melhor momento não é o melhor no jogo. E não ganha. O Sporting está num grande momento, mas o Benfica foi melhor. Muito melhor, na primeira parte, melhor na segunda, mas não ganhou.
Desta vez o Benfica surpreendeu. Surpreendeu os adeptos e o Sporting. Pressionou o adversário no campo todo, disputou cada bola com mais intensidade que o adversário e, depois ... tem melhores jogadores. Às vezes não parece, mas tem mesmo. E hoje, quando não foi só João Neves a correr e a ser intenso, e todos correram tanto, e com tanta intensidade, ou mais, que o adversário, viu-se.
É certo que, apesar disso, o Benfica não ganhou e ficou afastado da final do Jamor. Mas isso acontece algumas vezes no futebol. Nem sempre ganha quem é melhor.
Depois do "banho" da primeira parte, Rúben Amorim mexeu na equipa ao intervalo. E bem, melhor era impossível. Mudou as laterais (Esgaio e Diomandé, na direita, e Nuno Santos na esquerda, tinham simplesmente sido atropelados pela avalanche benfiquista) lançando St. Juste e Geny Catamo para o lado direito, e Matheus Reis na esquerda.
Logo no arranque da segunda parte o central holandês lançou Gyokeres nas costas da defesa (subida) do Benfica. Segurou a bola e deu-a a Hjulmand para um remate feliz, e indefensável. Nem a absoluta falta de sorte, nem as adversidades da arbitragem - já lá vamos - impediram a resposta imediata do Benfica. E cinco minutos depois empatou, com golo de Otamendi, a passe de Neres.
Nem deu para festejar. E não foi por António Silva ter de imediato ido buscar a bola para a trazer para o centro do terreno. Foi porque dois minutos depois já o Sporting voltava a marcar. Desta vez foi Geny a cruzar, e Trubin a interceptar a bola para a deixar em Paulinho.
Era de mais, mas era assim. E nem assim os jogadores do Benfica se deixaram abater. E continuaram incansáveis à procura do golo, que a sorte e a arbitragem nunca quiseram que acontecesse.
O penálti - claro - de Coates sobre Rafa (70 minutos) poderia ter ajudado, mas nem o João Pinheiro, no campo, nem "o lagarto" Hugo Miguel no VAR, o quiseram que acontecesse. Já na primeira parte o mesmo havia sucedido com o mesmo Coates, então sobre Tengstedt. Dessa vez João Pinheiro optou por assinalar um fora de jogo que nunca existiu. O Hugo Miguel devia ter ido á casa de banho.
Houve mais. Di Maria fartou-se de levar pancada, sempre sem falta. E levou até um amarelo. O que nem Gonçalo Inácio levou quando se mandou a pontapé às pernas do Tengstedt, a caminho de se isolar para a baliza. Tudo isto em cima daquele golo anulado no jogo da primeira volta, em Alvalade.
É verdade que, ao contrário do que se passou do outro lado, as substituições tardaram. Já o guarda-redes do Sporting tinha - finalmente - visto o cartão amarelo por queimar tempo, quando Tengstedt saiu para entrar, desta vez, Marcos Leonardo. Já só faltavam 5 minutos para os 90 quando Neres, esgotado, foi substituído por Tiago Gouveia, ainda a tempo de desperdiçar duas claras ocasiões de golo. E jogava-se já o minuto 90 quando Florentino, exausto, saiu para entrar João Mário. E é verdade que nenhum dos que entraram esteve ao nível dos que saíram. Exactamente ao contrário do que se passou do outro lado.
No fim, nem o insucesso impediu a Luz de aplaudir a equipa. Merecidamente. Os jogadores mereceram!
Não há vitórias morais, e a Taça já foi. Mas, se até ao final da época jogarem sempre todos assim, mesmo continuando a sortear o ponta de lança, é possível acreditar em tudo. Em ser ainda campeão, e até ganhar a Liga Europa.
O dérbi desta noite em Alvalade fica marcado pela arbitragem de um lagarto, no campo, e de um super-dragão, no VAR. Enquanto Fábio Veríssimo ia inclinando o campo, e teve até a lata de assinalar um penálti num lance em que ninguém tocou no Edwards, e ainda por cima precedido de fora de jogo, no VAR, Fábio Melo recomendou-lhe a anulação do golo de Di Maria, que estabeleceria na altura o empate mas, mais que isso, daria completamente a volta ao jogo, como todo a gente percebeu.
Mas isto são os incidentes do jogo. Ou chamemos-lhe assim. O resto foi o jogo. O que foi, o que passou a ser, e o que não chegou a ser.
O jogo tinha em confronto duas ideias de futebol, já se sabia.
Este Sporting, de Ruben Amorim e em especial desta época, tem a sua matriz de jogo bem definida - pressão alta, para recuperar bolas perto da área adversária, alternada com períodos de bloco baixo, a chamar o adversário, para lhe abrir espaço nas costas por onde, nos melhores momentos do seu futebol, lançam alas rápidos ora em diagonais; ora em rápidas variações de flanco. No mais estereotipado basta-lhes lançar aquela espécie de "touro" de dois pés que é Gyokeres.
Este Benfica usa igualmente a pressão alta, e priveligia as transições rápidas através da capacidade de lançamento de Kokçu, da capacidade técnica de Di Maria e da velocidade de Rafa e Neres.
O Sporting faz mais passes - e posse - nas zonas mais recuadas do terreno. O Benfica mais em processo atacante. O Sporting é mais agressivo na disputa de bola. O Benfica não tem jogadores com as características de Hyulmand e Morita.
Para impôr o seu estilo de jogo a um adversário como este Sporting, os jogadores do Benfica têm que ser perfeitos no passe e na recepção, precisamente o "alfa" e o "omega" do futebol. E hoje estiveram longe de o ser. Em especial Kokçu e Neres.
O Sporting marcou cedo, ao nono minuto, no primeiro remate do jogo. Da cabeça do Pote, ao segundo poste sem marcação, a bola foi ao poste de daí para dentro da baliza. A ganhar desde bem cedo o Sporting ficava com o jogo a jeito, e passou gradualmente a impôr o seu futebol. O Benfica, falhando passes e recepções, perdia rapidamente a bola, permitindo ao Sporting ao domínio completo do jogo. Foi assim até ao intervalo.
A estratégia "de bola para o Gyokeres que ele resolve" só não funcionou porque António Silva ia salvando a nau, encontrando sempre forma de se opor ao ponta de lança sueco. O que o miúdo conseguiu praticamente sempre, não conseguiu Otamendi quando lhe chegou a vez de ficar na "cara do touro", e deu no 2-0, novamente com a bola a ressaltar do poste para dentro da baliza. Ao mesmo minuto 9, agora na segunda parte.
Que começara com uma substituição estranha de Roger Schmidt, ao retirar Bah, o único lateral de raiz na equipa, para entrar Morato para a esquerda, com Aursnes a passar para a lateral direita. Nada mudava, e a ganhar já com uma vantagem confortável, o Sporting ia segurando a bola e controlando o jogo. Das bancadas saíam olés, que tiveram o condão de "acordar" dos jogadores do Benfica.
Shmidt fez entrar Tengstedt para o lugar de Neres, o mais adormecido de todos. E os jogadores do Sporting começaram a evidenciar a quebra física que já não lhes permitia correr atrás das bolas todas (houve momentos impressionantes, e não foram poucos, em que eles partiam de mais longe da bola que os do Benfica mas chegavam lá primeiro) nem tapar todos os espaços. O jogo estava a mudar a olhos vistos e, ao minuto 68, Koçu abriu para Di Maria (esse nunca dormiu) que assistiu Aursnes para o golo.
Três minutos depois Di Maria foi por ali dentro e, já bem dentro da grande àrea, rematou como só ele sabe. Era o empate, e o fantasma abatia-se sob as bancadas de Alvalade que pouco antes cantavam olés. Faltavam mais de 20 minutos e nunca se saberá o que iria acontecer. Sabe-se é que o super-dragão no VAR conseguiu - sem grande dificuldade, percebeu-se que era o que mais queria - convencer Veríssimo que Tengstedt, em fora de jogo posicional, tinha tido intervenção no lance.
E o jogo que poderia a partir daí ter acontecido não chegou a acontecer. O Sporting foi substituindo toda a defesa e meio campo, com muitos jogadores já de gatas. Até as pilhas falharam finalmente a Gyokeres, a demonstrar que afinal é humano, e as bancadas, que antes cantavam olés, exigiam ao seu amigo do apito que acabasse o jogo.
E assim o Benfica voltou a perder, três meses depois. Perder é sempre mau, no Benfica é péssimo. Jogar o que o Benfica jogou na primeira parte não é desejável que se repita. Mas a equipa saiu viva, e com bons sinais de saúde física. Viva para, daqui a mais de um mês, na Luz, disputar a passagem à final do Jamor, de que já temos muitas saudades. E para o jogo do próximo domingo, no Dragão!
"No futebol tudo é possível". Ou "futebol é isto mesmo".
O futebolês às vezes tem coisas acertadas. E os dérbis, que são sempre o expoente máximo da emoção no futebol, às vezes atingem o inimaginável.
O dérbi desta noite, na Luz, cheia que nem um ovo, como é frequente apesar das oscilações da equipa, foi futebol. Que é "isto mesmo", e onde "tudo foi possível".
O Benfica começou bem, e foi melhor na primeira metade do primeiro tempo, ao contrário do que, pela fase que atravessa, e pelo que havia sido a semana dos dois rivais (com o Benfica á beira do abismo em San Sébastian, e o Sporting com um jogo-treino em Alvalade, com os polacos do Rákow), seria de esperar. Sempre mais agressivo na disputa da bola, e mais forte nos duelos, numa espécie de papéis invertidos, o Benfica, com João Neves - na sua posição natural, e com três centrais na equipa (António, Otamendi e Morato) mas sem a estrutura de três centrais, com Morato a defesa esquerdo - em grande, ganhou o meio campo e dominou o jogo, com três claras oportunidades de golo nesse período, incluindo uma bola no ângulo superior direito da barra da baliza de Adan. Seriam três as bolas nos ferros na baliza do Sporting, durante o jogo.
Depois, o Sporting começou a equilibrar o jogo e Trubin, por duas vezes, negou-lhe o golo. Às três foi de vez. Em cima do minuto 45 João Mário perdeu na disputa com Edwards, que lançou Gyökeres para marcar, num potente remate de primeira, que Trubin não conseguiu (e pareceu que porventura poderia ter conseguido) defender.
No seu melhor período, em três oportunidades, o Sporting marcou. Precisamente ao contrário do Benfica, que não tirara nada do seu melhor. A conjugação destes dois factores - o crescimento do Sporting (sabe-se que as últimas imagens são sempre as que ficam mais nítidas na memória), e a vantagem no marcador - sugeria grandes dificuldades para o Benfica virar o resultado na segunda parte.
O reinício do jogo confirmava essas dificuldades. E se a expulsão de Gonçalo Inácio, por segundo amarelo, logo aos 6 minutos, abria perspectivas novas para o jogo, a verdade é que, adaptando-se bem à circunstância de jogar com 10, o Sporting parecia ter sempre o jogo controlado. O Benfica tinha esgotado a alma a meio da primeira parte, e a criatividade não abundava.
As substituições de Roger Schmidt - Musa e Florentino por Cabral e Tengstedt - não só não mexeram com a qualidade de jogo da equipa, como irritaram ainda mais os adeptos. E o jogo foi-se arrastando, com uma única oportunidade de golo, num remate "com selo de golo" de Di Maria, que Adan desviou para a trave (terceira bola na trave), e mais uns incidentes de arbitragem aqui e ali.
Só aos 85 Roger Schmidt faria nova - e última - substituição, trocando João Mário por Gonçalo Guedes. Tarde de mais, até porque se viu como Guedes mexeu com o jogo, e como o Benfica voltou a ganhar alma. Então sim, percebeu-se que os jogadores do Benfica não queriam perder o jogo. Até na forma como Trubin subiu à área de Adan, primeiro num livre lateral e, depois, no canto que resultaria no golo de João Neves (que execução!) aos quatro dos seis minutos de compensação.
Se já era incrível, depois foi a loucura. Dois minutos depois, na melhor jogada colectiva do Benfica em todo o jogo: Di Maria desmarcou Aursenes na direita, que ganhou a linha final e cruzou; Rafa deixou passar entre as pernas e, de calcanhar, o mal-amado Tengstedt marcou.
A loucura em dois tempos. O árbitro assinalou fora de jogo. Mal, percebia-se de imediato em jogada corrida. E confirmar-se-ia quase cinco minutos depois, com a validação do VAR, por estranhos 4 centímetros.
Com a festa instalada na Luz ninguém se lembrou mais de Artur Soares Dias. Mas foi uma arbitragem à sua maneira, e à maneira do que nos habituou. Por isso, mas também pelos muitos que já ouvi dizer que o Sporting mereceu ganhar este jogo, ficam aqui apenas duas notas.
A primeira falta assinalada ao Benfica aconteceu já aos 40 minutos, a Rafa. Quando o jogador do Benfica, depois de uma joelhada de Hjulmand na coxa, que não só era falta evidente, como ainda merecedora de punição disciplinar - o dinamarquês deveria mesmo ter sido o primeiro jogador do Sporting a ser expulso - , agarrou a bola com a mão, convicto da falta sofrida.
Ficou um penálti - claro - por marcar, a meio da segunda parte, por cotovelada de Morita sobre Otamendi. Mas foram muitos mais, os lances que, a acontecerem na área do Benfica (basta lembrar-mo-nos do ano passado) Artur Soares Dias apontaria para a marca de grande penalidade.
Por último, Roger Schmidt. Tirou "a cabeça do cepo", mas não a tem no lugar!
A uma jornada do fim de um campeonato que liderou desde a primeira jornada, que dominou em toda a linha, e em que tem indiscutivelmente sido a melhor equipa, o Benfica ainda não é campeão. Muito por culpa própria, mas muito, também, pelo que é o futebol em Portugal há 40 anos e que, pelos vistos, continuará a ser.
Ainda não foi desta que o 38 foi carimbado. Pelo que foi o jogo dos penáltis de ontem - apenas mais um - e pelo que foi o dérbi desta noite, que o Benfica teria de ganhar. O "match point" de hoje em Alvalade começou a ser desperdiçado na preparação do jogo, falhada em toda a linha. Como havia sido falhada a do jogo da Luz, com o Porto.
A primeira parte do jogo de Alvalade chegou a parecer decalcada desse com o Porto, quando há perto de mês e meio o Benfica desperdiçou a oportunidade de acabar, bem cedo, com este campeonato. Os mesmos erros de estratégia, a mesma apatia, e a mesma resignação levaram a equipa a entregar ao adversário o mesmo domínio do jogo.
O Benfica entrou em Alvalade como se este fosse apenas mais um jogo deste campeonato, e não o jogo que teria de ganhar para se fazer campeão.
O primeiro erro foi, com Bah recuperado e mais uma vez no banco, continuar a insistir em manter Aursenes como lateral direito. O seu rendimento na posição já é, em si mesmo, um problema. Problema maior é, no entanto, a falta que faz à equipa nas posições em que ele faz toda a diferença. Com o internacional norueguês nessa posição o Benfica não ganha um lateral direito e perde o seu mais influente jogador.
O segundo, e não menos decisivo, foi o défice de agressividade. Os jogos que têm de ser ganhos exigem entradas com os índices de agressividade no máximo. Não há outra forma. Mas a equipa não entrou claramente convencida disso, e começou a perder todos os duelos, todas as bolas divididas, todos os ressaltos... A agressividade e o querer dos jogadores do Sporting nunca encontraram resposta nos do Benfica. A atitude do árbitro João Pinheiro, ao deixar passar incólumes os excessos de agressividade leonina, em evidente dualidade de critérios, foi reforçando ainda mais a confiança dos jogadores do Sporting, cada vez mais contrastante com as do Benfica.
Nem a circunstância de na baliza adversária estar um guarda-redes com poucos jogos, e pouca experiência, pesou na estratégia para o jogo, também aí com tudo a ver com agressividade e atitude.
E assim o Sporting foi crescendo. Em confiança e, a partir daí, em qualidade técnica e táctica. Até, a partir do meio da primeira parte, depois da primeira oportunidade de golo, desperdiçada pelo Pote, passar a dominar completamente o jogo. Vlachodimos ainda adiou o golo que se adivinhava, com uma grande defesa a remate do Esgaio. Apenas isso. Logo a seguir já não evitou o primeiro golo, todo ele a espelhar a permissividade e a apatia da equipa. António Silva falhou um corte fácil, o Trincão ficou a com a bola e rematou sobre o lado esquerdo, já com pouco ângulo. Vlachodimos defendeu para a frente (ficando a ideia que poderia ter feito melhor), com toda a defesa a "dormir na forma", permitindo que o avançado do Sporting desse meia volta e voltasse a trás para a recuperar, contornar o guarda-redes, e enviá-la tranquilamente para a baliza.
Cinco minutos depois, já em cima do intervalo, a mesma passividade e o mesmo adormecimento, daria novo golo. Num canto, o Sporting voltou a marcar, com Diomandé a ganhar nas alturas a Grimaldo uma bola que deveria estar a disputar com Aursenes.
Em toda a primeira parte o melhor que o Benfica conseguiu foi uma única oportunidade de golo, ainda com o resultado em branco, num remate de cabeça do Rafa que saiu por cima da trave, por descoordenação no tempo de salto. E o 0-2 era até lisonjeiro!
Ao intervalo Roger Schemidt fez o que deveria ter feito antes do início do jogo. Em 10 minutos, fez o que não terá feito numa semana inteira. A equipa veio para a segunda parte com Bah (saiu João Mário, mais notado em Alvalade pelos assobios que por qualquer outra coisa) e Aursenes nos seus respectivos lugares, e com a mentalidade indispensável para discutir o jogo. Que mudou, por completo.
O Benfica tomou conta do jogo e só não marcou mais cedo porque o João Pinheiro não quis que o empurrão claro e ostensivo do Nuno Santos ao Gonçalo Ramos, dentro da grande área, fosse penálti. Mas é assim, este campeonato. Ontem, em Famalicão, foram quatro, e até acções com bola e jogadores fora do campo acabaram em penálti. No dérbi da Luz, o Paulinho mandou-se sozinho para o chão, e foi penálti. Este empurrão, não é nada. Siga...
Rúben Amorim percebeu que a sua equipa tinha gasto as baterias todas na primeira parte. Começou por fazer entrar Paulinho (troca com Edwards), para passar a jogar longo, para a frente.
Benfica ia juntando oportunidades ao domínio do jogo, mas o golo ia tardando. Roger Schemidt voltou a mexer, trocando Rafa e Gonçalo Ramos por Guedes e Musa. Que, três minutos depois, com uma grande arrancada, só não marcou porque o jovem Israel desviou, com a ponta dos dedos, para o canto que João Pinheiro não assinalou. Foram precisos apenas mais dois minutos para, finalmente, o golo. Aursenes, depois de ter sido carregado dentro da grande-área, levantou-se a foi ainda a tempo de responder de cabeça ao cruzamento de Grimaldo (sim, jogou, e sim, vai deixar saudades!), que recuperara a bola, do outro lado.
Rúben Amorim respondeu ao golo com ... medo. E reforçou a defesa e o meio campo, para defender o resultado, tentando repor a agressividade perdida. Ia conseguindo.
O relógio ia avançando e o Benfica não saía de cima da área adversária. Entrou Florentino (para substituir Chiquinho, acabado de amarelar) e entrou bem. A ideia que ainda haveria tempo para, pelo menos, o golo do empate ia crescendo. Entrou ainda Ristic, provavelmente para anunciar a definitiva despedida de Grimaldo.
Ia o tempo de compensação (8 minutos) a meio quando finalmente entrou a bola que não queria entrar. Rematada duas vezes pelo João neves. O menino que merecia que aquele seu primeiro golo pela equipa principal fosse o da vitória, e do título, e não apenas o do empate no dérbi. Que merecia, como mereciam os benfiquistas que estiveram no estádio - onde, mais uma vez, adeptos sportinguistas cantaram o nome do Benfica à moda do Dragão - uma abordagem ao jogo que garantisse a festa do 38. Hoje, em Alvalade!
Sessenta e duas mil e quinhentas almas nas bancadas esgotaram a Luz para assistirem ao dérbi eterno. Que, não tendo sido dos mais vibrantes, não deixou de ser um bom espectáculo de futebol, nem de ter os ingredientes que fazem dele, sempre, um jogo único, e sem paralelo no panorama do futebol em Portugal.
Quando se esperaria que fosse o Benfica a entrar forte no jogo, até porque se anunciara que Roger Schemidt teria mesmo pedido isso aos jogadores, e porque o adversário não tinha razões para trazer muita confiança na bagagem, foi o Sporting que entrou melhor no jogo. E fez do jogo, no primeiro quarto de hora, aquilo queria exactamente dele - ter bola. Depois, poderia querer mais, mas para começar o que queria mesmo era ter a bola. Quem tem a bola não têm que correr atrás dela. Nem é atacado.
Rúben Amorim sabia que se o Benfica tivesse bola as coisas se complicariam, e muito. Como, de resto, o próprio jogo viria a confirmar. Por isso quis ter bola simplesmente para a ter, e não tanto para "ferir" - para utilizar uma horrível expressão que é agora usada - o adversário.
Conseguiu-o durante pouco mais que esse primeiro quarto de hora. A partir daí o Benfica não lhe permitiu mais que fosse o dono da bola, e passou a tê-la e a jogá-la como sabe, e a meio da primeira parte já era Adan a safar o golo, em duas ocasiões consecutivas. E já era um Benfica galvanizado, apostado em não sair de cima da área sportinguista.
Valeu então ao Sporting a matreirice de Paulinho. Foi o seu momento "matreirice 1". Simulou que tinha sofrido uma falta, rebolou pelo chão, entrou a equipa médica ... e acabou com aquilo que já começava a cheirar a sufoco. E a verdade é que aquela espécie de intervalo, convocado pelo experiente e matreiro avançado do Sporting, resultou. Quebrado o ritmo, o Benfica voltou a ter que reaquecer o motor e, para que tudo fosse ainda pior, logo a seguir, numa carambola dentro da área, foi nessa altura que o Sporting marcou. Na realidade não marcou, mas foi golo, e conta na mesma. A bola primeiro ressaltou em Otamendi, e deixou Vlachodimos batido. Depois, ressaltou em Bah (que continua completamente fora de forma, numa altura em que nem há Gilberto) para dentro da baliza.
O Benfica teve que reaquecer os motores rapidamente, e a máquina voltou a funcionar. E 10 minutos depois do auto-golo sofrido o Benfica empatou, numa jogada de insistência de António Silva, que serviu Rafa para partir os rins a Matheus Reis, e assistir Gonçalo Ramos, na cara de Adan. Daí até ao intervalo só deu Benfica, mas não deu mais golos. Mesmo que o miúdo - a anunciar más notícias para o que estava para vir - logo a seguir tenha assustado, ao falhar um atraso de cabeça para Vlachodimos e deixar a bola ao dispor de Trincão, sozinho, só com o guarda-redes grego pela frente. Mas reagiu tão rapidamente "a tirar-lhe o pão da boca" (na imagem) que até pareceu que tinha feito de propósito, a exemplo daqueles cabeceamentos para a trave de própria baliza, para evitar o canto.
Logo a abrir a segunda parte, sem que o jogo tivesse ainda dito o que quer que fosse, o VAR manda Soares Dias ver em imagens o momento "matreirice 2" de Paulinho. Depois de cinco minutos "a deliciar-se com as imagens", o árbitro - que até aí só tinha tido cartões para mostrar a jogadores do Benfica, por muito que Ugarte se tivesse esforçado para que lhe fosse mostrado por nem sei quantas vezes - assinalou penálti. Que o Pote aproveitou para o seu já clássico golo na luz.
E o Benfica começava a segunda parte a perder um jogo que poderia e deveria ter saído do balneário a ganhar. Com um penálti em que a "matreirice" de Paulinho contou com a colaboração da "verdura" de António Silva. Pré-anunciada, como se vira!
O Benfica voltou a pegar no jogo e o empate final demorou, de novo, apenas dez minutos. Mais uma bela jogada de futebol com Florentino a abrir para Grimaldo, na esquerda, e este a assistir para Gonçalo Ramos bisar, ainda, e de novo na cara, de Adan.
Logo a seguir Schemidt trocou Aursenes por Neres. Para ganhar o jogo, pensou-se.
Mas não. Porque Neres também está longe dos seus melhores momentos. Mas também porque a equipa tem agora intermitências que antes não tinha. O futebol é o mesmo, a intensidade, a pressão, a velocidade, e também a inspiração e a confiança dos jogadores, é que não são tão constantes quanto eram. E nem mesmo a confiança do treinador, como se viu por se ter ficado pela entrada de Neres (a de Chiquinho, nos últimos dois minutos, não conta para essas contas).
Por isso não ganhou um jogo que, como se viu, teria de ganhar. Até porque, sempre que o jogo teve futebol digno de se ver, foi praticado pela equipa do Benfica.
E assim acabou o pleno de vitórias que marcava esta época na Luz. E assim se perderam cinco pontos em três jornadas. Depois de, sempre a somar, de seguida, deixar cair uma das competições e de perder a invencibilidade... É também por isto que este dérbi teria de ser ganho!
Parabéns, Nelson Veríssimo. Parabéns pelo 45º aniversário, e parabéns pela vitória (e como é sempre saborosa!) e pela forma brilhante como eclipsou o futebol do Sporting, de Rúben Amorim.
Foi um grande jogo este que o Benfica fez hoje em Alvalade. Os jogadores foram brilhantes, mas foram, acima de tudo, de uma dignidade, de uma entrega e de uma raça como ainda se não tinha visto. Nunca foram inferiores aos adversários na disputa pela bola, nunca tiveram medo dos duelos e nunca lutaram menos. Quando assim é, tudo é diferente, e sofrer golos deixa de ser a fatalidade que tem sido.
Dava ainda apenas para o jogo contar uma história de cartões - o cartão, nem sequer amarelo, que não foi mostrado a Coates, logo no início, e o vermelho que ficou em amarelo na agressão de Sarábia a Vertohghen - quando o Benfica marcou o primeiro golo, à beira do fim do primeiro quarto de hora. Foi a primeira jogada de golo, até aí, para além da história dos cartões que poderiam dar ao jogo outra história, só dava para perceber que o Benfica não deixava o Sporting impor o seu futebol habitual. Depois do golo - excelente lançamento de Vertonghen, o resto ficou por conta de Darwin, que começou por, primeiro, bater o Neto em velocidade, depois deixar o Coates para trás com um toque de cabeça seguido de fuga para, por fim, fechar com um chapéu a Adan. Mais bonito era difícil.
O golo abriu definitivamente as hostilidades. O Sporting reagiu e acelerou o jogo. Mas o Benfica, defendendo muito bem - uma autêntica equipa, que tem sido sempre o que mais tem faltado - era sempre mais perigoso . Adan negou o segundo, que surgiu pouco depois, porque no lance a seguir ao canto que resultou da defesa do seu guarda-redes, o Sporting criou a sua única oportunidade de golo, negada por Vlachodimos, a roubar a bola ao Pote, isolado à sua frente. No lance corrido, dessa segunda vez que a bola entrou na baliza de Adan, ficaram algumas dúvidas. Mas o Hugo Miguel, no VAR, tratou do assunto. Nas linhas manhosas, não fez a coisa por menos - 96 centímetros.
Quase um metro? Ó Hugo Miguel, isso não é de mais para ser levado a sério?
Fábio Veríssimo no campo e Hugo Miguel no VAR, não é de mais. É o costume, e apenas mais do mesmo.
Mais do mesmo foi a segunda parte. Temia-se que a equipa - exactamente a mesma que iniciou o jogo de Liverpool - pudesse quebrar fisicamente, e não conseguisse aguentar aquele ritmo diabólico de luta pela bola e pelos espaços, a defender e a atacar. Mas nada disso!
A segunda parte disse ao que vinha logo de entrada. Começou com mais uma grande oportunidade de golo do Benfica, naquele remate do Diogo Gonçalves a roçar o poste. E com a única oportunidade do Sporting, logo na resposta, num toque de cabeça ao poste- nem sequer se pode chamar-lhe remate - do Sarábia, que devia estar no balneário. E vimos uma segunda parte ainda mais intensa. Com o Benfica a continuar a defender a grande nível, a continuar a ganhar todos os duelos, e sempre a criar perigo nas saídas em contra-ataque.
E com Fábio Veríssimo a acrescentar histórias à história dos cartões da primeira parte: Nuno Santos "aviou" um pontapé na cabeça do Gilberto, já no chão depois de o ter ceifado, e nada. O Paulinho deu uma cotovelada no Vertongen, sem bola, quando ia a passar por ele e.... o Veríssimo do apito resolveu a coisa com um amarelo para cada um. Porro, distribuiu empurrões a torto e a direito na substituição de Taarabt, mas foi o jogador do Benfica a ver o cartão amarelo, quando ia a sair sem se meter com ninguém. E Hugo Miguel a acrescentar histórias à história do VAR. E à sua longa história de perseguição e incompetência. Houve um vermelho, foi para o Rui Pedro Brás. Mas a esse já eu o teria mostrado há muitos meses.
Por volta dos 60 minutos Rúben Amorim começou a mexer na equipa. Tinha no banco Slimani, Ugarte, Edwards. E em campo demasiados jogadores completamente secados pelos jogadores e pela estratégia do Benfica. Nelson Veríssimo no banco tinha Gil Dias e Paulo Bernardo. O suficiente para chegar ao segundo golo e "matar o jogo", numa jogada emblemática. Ao segundo minuto dos 7 de compensação que o árbitro entendeu justificarem-se, Darwin arrancou pela esquerda e foi tal o pânico que acabou rodeado por cinco - cinco! - jogadores do Sporting. Nada impressionado com tamanha guarda de honra, entregou a bola ao Gil Dias para tranquilamente meter a bola por baixo do corpo do pobre Adan . Mesmo com os 11 jogadores, em vez dos 7 que deveria ter em campo, ao dispensar cinco só para Darwin só sobravam seis. Mas estavam lá mais para a frente...
E lá ficou o resultado um pouco mais condizente com o que foi a superioridade do Benfica no dérbi, mesmo quando ainda estamos longe do dia em que voltarão a respeitar o Benfica, como hoje dizia o miúdo Henrique Araújo, no fim do jogo da equipa B em Vila do Conde, com o Rio Ave. Sim, um miúdo da equipa B. Não foi o presidente Rui Costa. Nem sequer o Rui Pedro Brás. Não terá sido por isso que foi expulso!
Poderia recorrer-se a uma expressão corrente no futebol para dizer que o Benfica entrou a dormir, e quando acordou já estava a perder. E que a partir daí, com a competência do Sporting a defender, e a contra-atacar, o derbi estava perdido.
Mas não foi só isso que foi o jogo, isso foi o seu início- E o indício do que viria a ser.
Passando para o fim, poderia também dizer-se que o Benfica teve mais bola, e até mais oportunidades de golo. E que afinal perdeu o jogo porque, ao contrário do Sporting, não aproveitou as oportunidades que teve.
Mas, também não foi isso o jogo.
O jogo foi, todo ele, de princípio a fim, um confronto entre uma equipa de autor e outra de geração espontânea. Entre uma equipa que conhece todos os momentos do jogo, e o que fazer com eles. Que funciona mecanicamente, onde cada peça sabe exactamente qual a sua função, e seja qual for a peça, a função é desempenhada. Apenas é preciso que a peça esteja preparada, física e mentalmente, para a função que lhe cabe desenvolver.
Essa equipa é a do Sporting, e Rúben Amorim o seu autor. Dizia-se que surgiria na Luz debilitada pela falta de duas peças fundamentais ao seu funcionamento - Coates e Palhinha. Mas ninguém notou a falta deles, porque o que importa é a função, e essa nunca ficou por desempenhar. Como ninguém deu pela lesão de Fedal, o outro central. O que toda agente notou foi que os jogadores do Sporting entraram no jogo com uma extraordinária agressividade competitiva, que nem dois amarelos no primeiro minuto minimamente abalaram. O que toda a gente viu foi como o Sporting conseguia ter sempre três jogadores a pressionar cada jogador do Benfica que pegava na bola. E que cada jogador do Sporting, quando a recuperava, descobria os espaços para a jogar.
Foi isto que foi todo o jogo. E por isso, as duas bolas nos ferros da baliza de Adan, a ridícula anulação do golo de Darwin por 6 centímetros de fora de jogo do Yaremchuk, e até as circunstâncias em que o Sporting marcou o segundo e o terceiro golo, sempre a seguir a oportunidades desperdiçadas pelo Benfica, parecem meras incidências do jogo. Sempre controlado pelo Sporting, que pareceu sempre ter os melhores jogadores e os mais capazes. Pareceu até que nenhum jogador do Benfica seria capaz de marcar qualquer dos golos que os do Sporting marcaram. E que nenhum dos que os do Benfica falharam - o bola que Rafa rematou à barra apenas aconteceu por falta de confiança para rematar de primeira - seria falhado pelos do Sporting.
E tudo isto - agressividade competitiva, definição de funções, modelo de jogo, condição física e mental - é da responsabilidade do treinador. Como é o treinador que escolhe os jogadores, os que contrata e os que coloca em cada jogo..
Não sei se os lenços brancos no fim do jogo se devem a esta constatação, ou apenas à frustração desta derrota. Mas sei, e há muito, que o treinador do Benfica está comprovadamente esgotado, e em acelerado processo de destruição de valor.
Se este foi o início deste mês de Dezembro, é de temer pelo fim.
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