Soubemos ontem que a taxa de desemprego tinha subido em Abril para 6,3%. Que tinha subido em Abril, todos tínhamos essa percepção. Não era surpresa. Surpresa era um crescimento tão baixo. Aos 6,2 de Março - que até baixara relativamente a Fevereiro - acrescia apenas 0,1%. Insignificante em qualquer circunstância, mais ainda no ponto mais alto da paralisação da actividade económica na crise em curso.
À primeira vista poderia pensar-se que em Abril as pessoas estavam todas em casa mas que ninguém estaria ainda despedido. Que, entre layoff e tele-trabalho, toda a gente estaria a manter os seus vínculos laborais. E que as insolvências geradoras de grandes fluxos de desemprego ainda estariam em banho-maria.
É certo que, das falências que esta crise ditar, muito poucas - se é que alguma - ocorreram ainda. As poucas que tenham já acontecido vêm de trás, e nem sequer terão sido aceleradas neste período.
Mesmo assim, 6,3% de taxa de desemprego nesta altura... não é fácil de acreditar. A não ser que o INE tenha uma boa explicação ...
E não é que tem?
Um desempregado, para que tecnicamente o seja - e não é um definição do INE, é da OIT e de utilização universal - não basta estar desempregado, sem trabalho. Para o ser tem ainda que estar activamente à procura de emprego. Se não o estiver, passa de desempregado a inactivo. Mesmo que esteja a receber subsídio de desemprego...
Temos então esta coisa curiosa, mas verdadeira: um desempregado para o IEFP não é um desempregado para o INE. E por isso, para as suas estatísticas de desemprego, o INE recorre a instrumentos de consulta onde, naturalmente, uma das perguntas que coloca é se, no mês, o inquirido desenvolveu iniciativas de procura de trabalho. Em Abril, com as pessoas em confinamento e as empresas fechadas, seria difícil às pessoas responderem afirmativamente. Por isso ficaram inactivas, e não desempregadas.
Até parece que é para rir. Mas não é. É sério. É mesmo assim: 6,3% de desemprego!
Provavelmente António Costa é um tipo com azar, a quem tudo acaba sempre por correr mal. Não vale a pena recuar muito para ilustrar esta ideia, todos se lembram como foi desejado, dentro e fora do seu partido, e como era limpo e sorridente o horizonte à sua frente. E no que deu pouco tempo depois, logo que a coisa apertou e o tempo fugiu...
Mas não há melhor ilustração para a falta de estrelinha de Costa do que esta estória dos cartazes que, pelos vistos, não tem culpados. Mesmo que o Ascenso Simões se tenha finalmente demitido...
Basta ver como a polémica que desencadearam deu cabo, destruiu por completo, apagou, aquilo que eram as mensagens mais fortes que a campanha eleitoral tinha para fazer passar. O desemprego e a precaridade não são apenas o maior legado que esta governação deixa ao país. São também as maiores feridas abertas na sociedade portuguesa, que não podem simplesmente ser arredadas da campanha eleitoral só porque acabaram vertidas nuns cartazes manhosos, mas acima de tudo orfãos!
Numa campanha eleitoral em que vai valer tudo, governo e coligação querem fazer do desemprego uma questão de números. Reduzindo o maior problema da economia e da sociedade portuguesa a um número, o problema fica resolvido. Um número é um número, e com os números faz-se o que se quiser...
Se há coisa em que os números se pareçam com pessoas - com algumas pessoas - é nisso mesmo: prestam-se a tudo!
Se as pessoas que um dia perderam o emprego e estão sem trabalho há dois, três anos ou quatro anos não são desempregados, são inactivos. Se as pessoas que estão ocupadas uma hora por semana a receber formação que nunca lhes servirá para nada, estão em formação, não são desempregados. Se as pessoas que estão integradas em estágios pagos pelo Estado às empresas, são estagiários e não desempregados. Se as pessoas que tiveram de sair do país são hoje emigrantes e não desempregados, os números do desemprego são forçados a cair.
Os problemas das pessoas, esses, são os mesmos. Às pessoas pouco interessam os números, mais ou menos martelados, e sempre manipulados, do desemprego oficial do governo. O que às pessoas importa é o emprego que lhes falta. Não importa o desemprego, importa é o emprego. Não conta para nada que os números do desemprego tenham caído quando os do emprego cairam ainda muito mais!
O que realmente conta é o emprego que foi destruído nestes últimos quatro anos, que - palavra do FMI - demorará 20 anos a recuperar. Demoraria, direi eu, se a economia portuguesa conseguisse garantir tanto tempo de crescimento ininterrupto, coisa de que nos não lembramos.
E o que nunca deixará de contar é a qualidade do emprego que se está a criar. Muitas vezes, mais que emprego a prazo, emprego com prazo marcado para o desemprego, assente numa relação de trabalho cada vez mais desigual.
O desemprego continua a subir. Vai já no terceiro mês consecutivo, sempre a subir... Dentro de dias teremos o primeiro-ministro a dizer daqui até às eleições vai ser assim: sempre a subir. Porque está tudo à espera dos resultados das eleições... E que o desemprego só voltará a cair se ele as ganhar!
O próprio presidente virá esclarecer que o "seu crescimento de 2%" tem como pressuposto, que dá como certo - nunca se engana e raramente tem dúvidas -, que a actual maioria continua no poder. Que cresce tudo no último trimestre... E que é normal que o desemprego esteja agora a crescer porque, explicará de cátedra, há uma décalage de 18 meses a dois anos para que o crescimento se faça sentir no emprego.
A ministra da Justiça virá garantir que o desemprego sobe porque a taxa de reincidência é de 90%. Sem fazer ideia do que seja isso, mas com a breve convicção que o que importa é ter um número. Não importa de onde venha, nem para onde vá. Nem mesmo que não exista!
O vice-primeiro-ministro virá virar os números ao contrário, baralhando emprego e desemprego numa confusão que já ninguém percebe do que se está a falar. O que importa é que está melhor, como dirá logo a seguir o ministro da economia... Se alguém contestar ainda há a banca rota!
E a ministra das finanças a dizer que não tem nada a ver com isso. Não é VIP. Tem os cofres os cheios e os jotinhas a procriar. O que é que querem mais?
Se calhar ainda queriam uma administração fiscal que penhorasse quatro bolos a um restaurante... Por 30 cêntimos... Que lá ficassem a apodrecer às mãos do fiel depositário...
A Drª Isabel Jonet é assim uma coisa como o Dr Ulrich. Ou como o Sr Soares dos Santos. Não há meio de perceber que … cada tiro, cada melro. Que talvez não fosse má ideia calar-se!
Bem sei que a intelligentsia do regime sai logo em sua defesa, incapaz, porque não quer ou porque não lhe convém, de perceber que o que irrita mesmo é aquela maneira meio estúpida de fazer generalizações, de criar categorias preconceituosas, de falar de cátedra, de dar sermão…Apressa-se logo a esclarecer o que a senhora disse, dizendo não o que ela disse mas qualquer coisa mais perto do que lhes convinha que ela tivesse dito.
Uns dizem que a incontinente verbal e patroa do Banco Alimentar não criticou os desempregados, mas apenas a vida de ilusão que as redes sociais lhes provocam. Lá porque estão ao computador até pensam que estão a trabalhar… Outros acham que a senhora apenas peca por ser franca e falar do que sabe, coisa que ninguém lhe perdoa por não ser politicamente correcta, quer dizer, de esquerda. Não colhe, acho eu!
A senhora pode ser de direita, isso não tem mal nenhum. Pode até ser tia de Cascais. Pode ser tudo o que quiser, e até gostar de brincar aos pobrezinhos… Pode até preferir que as pessoas desempregadas, em vez das redes sociais, ocupem o tempo na televisão dos Gouchas, das Júlias e dos Baiões …O que ela e os seus não podem é achar que dar sermões a desempregados, quando o desemprego anda perto dos 20%, é a mesma coisa que criticar o que quer que seja noutras circunstâncias. Nem deixar de perceber que já não há paciência para esses registos!
Por força das minhas funções profissionais, mas também pelo relacionamento de proximidade que cultivo com os meus alunos, acabei de participar nas cerimónias de encerramento de mais um curso de Enfermagem.
Há muitos anos que a minha escola vem abrindo dois cursos por ano, um com início em Setembro e outro em Março. Por isso, há muitos anos também que encerra dois cursos em cada ano. Este é um desses, que se iniciaram em Março. De 2010, há quatro anos atrás!
É sempre um momento de grandes emoções, para alunos, familiares e professores. Quatro anos é muito tempo, mas também pouco, passam depressa. É esse um dos sortilégios do tempo, que sendo sempre o mesmo nunca é o mesmo… Em quatro anos vivemos uma vida que tem muito de comum. Acompanhamos sonhos, venturas e desventuras. Partilhamos alegrias e tristezas e sentimos que, da mesma forma que cada um deles leva no fim um pouco de nós, também nós ficamos com um bocadinho de cada um deles.
É sempre assim, curso após curso. Ano após ano, década após década… Por isso, e mesmo sendo assim há tantos anos, cada encerramento de curso é um sempre momento de grande intensidade emocional que une professores, alunos e familiares. Os professores porque também sentem sua a vitória deles, dos alunos e dos pais que, na maioria das vezes, sabe Deus com que sacrifícios, realizaram um sonho de vida!
Quando estes alunos iniciaram este percurso, há quatro anos atrás, o país era outro, bem diferente do que agora é. Era acima de tudo outra a imagem que dele tínhamos, diferente, mas muito diferente, da que dele hoje temos. Por isso o sonho de cada um deles foi sendo certamente retocado, ajustado à revisão das expectativas em baixa, como se diz na esotérica linguagem dos mercados.
Desta fornada de cinquenta novos licenciados poucos, muito poucos, ficam no país. Mas os que ficam – melhor dizendo, os que por enquanto ficam – não ficam por terem encontrado saídas profissionais. Não, ficam porque querem resistir à emigração, porque ainda não conseguem lidar com a ideia de deixar o país. Porque, como dirá quem manda, não são suficientemente empreendedores e não estão dispostos a abandonar a sua zona de conforto… Os que ficam, ficam porque, a deixar família e amigos e partir atrás do desconhecido, preferem procurar emprego numa caixa de supermercado, engrossar o portfólio das empresas de trabalho temporário, ou mesmo as dos seus colegas mais velhos e de poucos escrúpulos, que vendem os seus serviços ao Estado e aos privados a três euros à hora, e em condições de trabalho e de dignidade inaceitáveis. Todos os outros têm já contratos assinados para a Inglaterra, Suíça e Alemanha…Para, em condições de trabalho e de remuneração dignas, venderem as competências que em condições de excelência o país lhes forneceu!
Tenho muita dificuldade em perceber tanto desperdício. O país investe em profissionais altamente especializados e depois desperdiça todo esse investimento. Percebo, claro que sei por que outros países europeus os vêm cá buscar. É muito remotamente aí que, como professora e formadora, vou encontrar uma parte do meu sentido de dever cumprido. A outra, felizmente que bem maior e a que mais conta, encontra-a nos olhos de cada um deles. Todos os dias!
E amanhã vou iniciar um novo curso, arrancar com uma nova fornada para entregar a esses mesmos países. Quiçá a outros que venham a descobrir este filão!
Pelo crescimento que apregoa, deve ser destas exportações que Paulo Portas fala …
E lá está a Alemanha a preparar-se para dar cabo da credibilidade que Passos devolveu ao país, da confiança com que a Albuquerque e o próprio Portas inundaram os mercados e do milagre económico de Pires de Lima…
Lá se irão todos os sucessos desta governação. Todos, não. Porque o estrondoso êxito no combate ao desemprego é um valor seguro. E irreversível. Esse nem este regresso da Alemanha ao epicentro da destruição da Europa conseguirá pôr em causa. Porque os jovens não deixarão de continuar a emigrar como, ao contrário do que Pires de Lima anunciava, os que emigraram não regressarão. Nem os inactivos voltarão ao activo do desemprego, pelo contrário, cada vez mais desempregados passarão a inactivos. E grande parte dos que continuarão a ser despedidos não deixará de ser substituída por outros tantos por metade do salário…
Pois não. Não é por magia, mas parece. É porque a emigração sobe, mas é porque foi criada uma nova categoria de portugueses: os inactivos!
Muitos portugueses deixaram de estar desempregados. Diz o INE que 300 mil passaram a inactivos. Não faltará muito que o governo venha dizer que é gente que não quer trabalhar, e a chamar-lhes mandriões!
Já ouvimos falar em milagre económico. Em breve ouviremos falar no milagre do emprego, que o desemprego está a baixar a um ritmo nunca visto em nenhum outro país do mundo. E que há é cada vez mais mandriões!