TEMA DA SEMANA #8 DESPESA DO ESTADO
Por Eduardo Louro
Passos Coelho, há duas semanas atrás, lançou o tema da Refundação do Memorando da Troika avisando logo que pretendia envolver nisso o PS.
Ninguém percebeu o que era isso - creio que nem ele próprio – mas em poucos dias a máquina da comunicação transformou a Refundação do Memorando da Troika na Refundação do Estado, e isso – que toda a gente percebeu o que era – passou a dominar a agenda mediática: claramente o tema da semana. Um tema inquinado à partida, logo a partir do mote dado pelo Ministro das Finanças, quando Vítor Gaspar – com aquela do desvio entre o que os portugueses pretendem do Estado e os impostos que querem pagar - lançou os carris de preconceito ideológico por onde pretendia que corresse o tema.
Percebia-se claramente a ideia: o governo, que já tinha esgotado recurso ao aumento de impostos - já tinha chegado ao ponto em que aumentá-los já não correspondia a aumentar a receita – tinha agora que passar a cortar nos serviços que deve aos cidadãos, precisamente pelos impostos que lhe cobra. Nada como dizer isto: se não podemos cobrar-vos mais impostos, temos que passar a prestar-vos menos serviços! Menos educação, menos saúde, menos segurança, menos apoios sociais…
Pois bem! Esta ideia que foi posta a circular, lançada nos carris com a máquina de comunicação a dar-lhe gás, não está completamente certa. Está errada, mas ninguém quer que se saiba que está errada!
Está errada porque não é verdade que não haja por onde cobrar mais impostos. E está errada porque não é verdade que tudo o que haja para cortar na despesa do Estado se limite ao que faz parte das suas funções!
Está errada dos dois lados, no da receita e no da despesa.
Claro que o estado pode cobrar mais impostos, não pode é cobrar mais aos mesmos de sempre. Pode cobrar mais IRC – muito mais - acabando com as isenções que subsistem em grandes empresas e mesmo na banca. Pode cobrar mais IMI, sem entrar no desvario que aí vem e que irá levar ao desespero largos milhares de famílias. É que o montante cobrado de IMI representa pouco mais de metade do que é colectável. De fora, isentados, estão milhares de edifícios cujos proprietários – entre os quais e especialmente a Igreja – devem rir desabridamente sempre que ouvem falar de equidade.
E claro que há mais despesa para cortar, bem antes de chegar às verdadeiras funções do Estado. Há despesa a cortar nos gastos de funcionamento do Estado, naquelas coisas em que, sempre que se fala delas, alguém vem desvalorizar e falar em demagogia. Mas falar em automóveis e motoristas, em secretárias e assessores, em tachos e clientelas, e em estudos e pareceres, é falar de largos milhões de euros em má despesa, mas é também falar de moral ou de falta de vergonha, de ética ou de despudor, de transparência ou de corrupção e de verdade ou mentira. Mas nunca é demagogia, como a máquina da comunicação nos quer fazer crer.
Há a despesa militar, que já nada tem a ver com soberania. Perdida! E as missões militares internacionais…
Há a despesa com as PPP, que não é intocável como nos impingem. E que não é nem pode limitar-se a pequenos cortes em adjudicações futuras que, como areia atirada aos olhos, são apresentados como obra concluída no que a PPP diz respeito. É mentira que o governo aí tenha mexido, uma palha que seja. Não quer, não está interessado! Prefere manter intocável a promiscuidade entre interesses privados e públicos, alimentada, apadrinhada e protegida pelos sucessivos governos.
E há os juros da dívida pública, uma despesa que supera a da maioria dos ministérios e próxima da dos maiores, o da saúde e o da educação: mais de 7,1 mil milhões de euros! Juros que resultam de taxas absurdas: seis, sete ou oito vezes a que o BCE põe à disposição dos bancos… Dos bancos que, com isso, obtém margens pornográficas, superiores às praticadas no mundo em que negócio e tráfico são sinónimos!
Depois de tratarem desta despesa, sim. Venham falar-nos de cortes na saúde, na educação, no apoio social. Depois de tratarem desta despesa e de cobrarem aqueles impostos venham então explicar-nos que o Estado Social é uma ilusão em que todos vivemos demasiado tempo!
Nunca o farão. E continuaremos todos os dias a ouvir os mesmos politólogos, os mesmos economistas, os mesmos ex-ministros das finanças ou os mesmos banqueiros a dizerem-nos as mesmas coisas. Para que as coisas fiquem na mesma!