Trump saiu do hospital e a primeira coisa que teve para dizer foi, sem surpresa: “Não tenham medo de Covid. Não deixem que ele domine a vossa vida”.
Não disse que afinal todas as porcarias que garantiu ter tomado, e recomendou que todos tomassem, não lhe tinham valido de nada. Não disse que acabara de sair de um internamento de urgência onde lhe tinham sido prestados cuidados e tratamentos que estão de todo inacessíveis aos americanos. Não repetiu as palavras do chefe da equipa médica que o assistiu no Walter Reed Medical Center, que dissera que, apesar do estado de saúde do presidente ser ainda considerado grave, poderia abandonar o hospital por dispor, na Casa Branca, do departamento médico presidencial com os melhores profissionais e as melhores condições de prestação de cuidados.
Nada disso lhe interessava referir. Interessa-lhe continuar a insistir na sua estratégia de minimizar o virus e a pandemia, porque é isso que alivia a percepção de toda responsabilidade que tem na realidade pandémica da América. E lhe alimenta a indissociável fanfarronice!
Em Orlando, na Florida, Donald Trump acabou de arrancar com a campanha da recandidatura. A tentar convencer que voltou a fazer grande a América ("make America great again"), como se a América alguma vez tivesse deixado de ser grande, a proposta de Trump é, agora, a de a manter grande. E o lema "keep America great".
Estranha noção de grandeza é a de Trump. Bastou que ontem, em Sintra, Mario Draghi, o presidente do Banco Central Europeu, tenha dito que poderia regressar ao programa de compra de dívida (e com isso ter animado os mercados financeiros), para Trump vir a correr para o Twitter mostrar a pequenez da sua grandeza. Escreveu o presidente americano que garante ter tornado a América grande, e que promete continuar a mantê-la grande: “Mario Draghi acaba de anunciar mais estímulos, o que imediatamente desvalorizou o euro em relação ao dólar, tornando injustamente mais fácil para eles concorrerem contra os EUA. Fazem-no de forma impune há anos, juntamente com a China e outros."
O algodão não engana... Mas também não desenganou por completo. Os americanos mostraram um cartão amarelo a Trump, mas nem foi muito alaranjado.
Os democratas ganharam claramente a Câmara dos Representantes, a câmara baixa do Congresso, por onde tem de passar todo o processo legislativo. E isso vai atrapalhar a agenda de Trump, mas vai também permitir o avanço em muitas investigações incómodas para o actual presidente, como as ligações e as interferências do regime de Putin na sua eleição e o seu cadastro fiscal. E ganharam mais governadores estaduais. Mas os republicanos mantiveram, e até reforçaram, a sua posição no Senado, a câmara alta, o que obriga a muita concertação no processo legislativo.
Trump não foi plebiscitado, antes pelo contrário, foi admoestado. Mas também não ficou erguida uma barreira à sua reeleição. Nem do lado democrata emergiu um adversário de peso, até porque a estrela ascendente, Beto O´Rourke, perdeu a corrida para o Senado, no Texas, para o poderoso Ted Cruz. Se as declarações de Trump tivessem alguma vez alguma justificação, diria que talvez tenha sido por isto que tenha escrito no seu twitter: "Tremendous success tonight. Thank you all!".
Hoje há eleições nos Estados Unidos. A meio do mandato, Trump quis fazer delas um plebiscito, como expressamente confirmou, e um trampolim para a reeleição. Para isso empenhou-se e comprometeu-se integralmente com a campanha, o que quer rigorosamente dizer que mentiu, manipulou e forjou como se não houvesse amanhã.
O reportório não é novo, nem traz sequer nada de novo: amedrontar os eleitores, incutir-lhes muito medo com a invasão do país por um gigantesco bando de sul-americanos criminosos, terroristas, traficantes de droga, violadores e assassinos, e avisar que só não ganhará se houver fraude eleitoral. Novo é que, agora, milhares de pessoas a fugir da miséria a que foram condenados por governantes corruptos que sucessivas administrações americanas plantaram e suportaram, engrossam uma caravana que atravessa o México em direcção a norte, à fronteira onde Trump colocou 15 mil soldados com ordem para matar.
Hoje os americanos vão dizer se a eleição de Trump, há dois anos, foi um acidente, ou se, fechando-se sobre si próprios, fecharam definitivamente a América ao mundo. É uma espécie de teste do algodão!
Mais um tiroteio nos Estados Unidos. Do nada, só porque sim. Um participante num torneio de videojogos, em Jacksonville, na Florida, desatou aos tiros, matou dois colegas e feriu onze, antes de se matar a si próprio.
Porque sim. Porque tinha mau perder. E porque ... sim, isto é a América. A América dos lobies, onde o das armas é o maior de todos. Onde é demasiado fácil ter acesso a armas...
E onde se prepara o funeral do senador John McCain, a reserva moral do Partido Republicano, e da América. Sem Trump, conforme expressa e publicamente manifestou em vida.
Espera-se agora que o inquilino da Casa Branca, que nunca o respeitou em vida, o respeite na morte. E que se abstenha de aparecer... É o mínimo que se lhe exige!
A imprensa norte-americana junta-se hoje em uníssono contra os ataques de Trump e a sua miserável campanha de propaganda, que não tem outro fim que não seja eliminar quem a escrutine e denuncie.
Ao fazer dos jornalistas o inimigo, Trump quer esvaziar a capacidade de escrutínio, eliminar a crítica e deixar o populismo à solta, a salvo da denúnica. Quer fazer das redes sociais palcos de gigantescos comícios à escala global, enquanto convence as pessoas que são os mais limpos veículos de informação, numa comunicação sem filtros nem intermediação.
Os editoriais de hoje de mais de 350 jornais por todos os Estados Unidos são o grito da América que grita. Um gigantesco grito de protesto contra o populismo e a autrocracia, mas também a afirmação de um compromisso de defesa do jornalismo e da liberdade de imprensa, e um alerta para a importância da independência dos jornais. Que no chamado mundo livre nunca esteve tanto em causa como hoje.
A democracia precisa de uma imprensa forte, livre e independente. Hoje, como diz o título do editorial do New York Times, "A free press needs you"...
Tudo serve a Trump para destabilizar o mundo, e torná-lo num sítio muito perigoso. Nem que seja apenas para desviar as atenções...
Paul Manafort, o responsável da campanha campanha de Trump entre Março e Agosto de 2016, vai a julgamento já depois de amanhã. E para que não se saiba o que se vai ficar a saber ... ameaça o Irão!
São as famosas cortinas de fumo. Só que o fogo que Trump usa para fazer fumo é perigoso de mais...
Há uma semana Trump humilhou os parceiros da NATO. Há dois dias, humilhou toda a Grã Bretanha, nada nem ninguém lhe escapou. Nem a Rainha... Chegado a Helsínquia, lado a lado com o seu amigo, inspirador e par, humilhou a América.
Quando Trump diz ao mundo que acredita em Putin, e não nos serviços secretos americanos, humilha a América. Quando acusa os seus antecessores de responsáveis pelas más relações com a Rússia, trai o seu país.
Pelo meio, entre a humilhação da NATO e do Reino Unido e da própria América, Trump rebentou com todos os pilares do Ocidente, ao declarar inimigos a Europa e o Canadá.
Talvez agora os mais renitentes comecem finalmente a perceber a perigosidade da criatura. Não, não é embirração!
Putin? Esse só dá por bem empregue o tempo (e o dinheiro) que gastou para o colocar na Casa Branca. Para já tudo lhe corre bem... O mundo já está de pernas para o ar!
Aqui há uns anos ficou famoso um slogan publicitário criado para uma marca de cerveja - "provavelmente a melhor cerveja do mundo"... Pegou de tal forma que permanece como imagem de marca da Carlsberg.
Creio que serviria bem para anunciar a cimeira de hoje, em Helsínquia, entre "provavelmente, os dois mais odiados líderes do mundo"!