Sem surpresa Luís Filipe Vieira foi reeleito para o sexto mandato à frente dos destinos do Benfica. Ganhou uma das mais concorridas eleições da Hstória do Benfica, com uma maioria confortável (62% dos votos). No poder há duas décadas e com o total controlo da máquina, e com uma oposição fragmentada, não poderia ser de outra forma.
Ainda assim muito fez João Noronha Lopes, que chegou aos 34%, dos votos. Votação que certamente o deixaria bem colocado para disputar as próximas eleições, daqui a quatro anos. Já manifestou que não voltará a candidatar-se, mas estamos habituados a que no futebol tudo seja transitório, e nada definitivo.
Rui Gomes da Silva foi verdadeiramente cilindrado, com apenas 1,6% dos votos. Aqui, sim, temos algo de definitivo. Não tem definitivamente condições para ser Presidente do Benfica, algo que de resto poderia ter percebido há mais tempo. Depois de um resultado destes ninguém acredita que volte a tentar. Mas sabe-se lá...
Hoje é dia de eleições no Benfica. Marcadas para a próxima sexta-feira, foram antecipadas para hoje em função das restrições à mobilidade impostas para o fim de semana. Mais normal seria que fossem adiadas, mas foram antecipadas. Como natural seria que se prolongassem por dois, ou mesmo três dias, para reduzir os riscos de grandes ajuntamentos nestes tempos severos da pandemia.
Natural teria sido também que os benfiquistas tivessem encontrado um candidato que federasse toda a oposição, para seriamente poder desafiar o poder instalado. Há quatro meses, e na única vez que me pronunciei sobre as eleições que se realizam hoje, deixei aqui um manifesto nesse sentido, chamando-lhe "Uma missão para os benfiquistas".
Não aconteceu o que acho que deveria ter acontecido, e hoje são três candidaturas que vão a votos, depois da desistência de mais duas, uma das quais precisamente ontem. A de Bruno Costa Carvalho, por interposta pessoa por não ser candidatável à luz das condições estatutárias inventadas pelo actual poder. E assim, evidentemente, não se conquista o poder a ninguém.
Quando eu propunha alguém como Humberto Coelho para congregar a alternativa a LFV era exactamente para evitar que proliferassem candidaturas, todas elas bem abastecidas de egos, que dispersassem votos e favorecessem quem está no poder. E isso só seria evitado com uma personalidade incontroversa, agregadora, prestigiada e com História.
Mais que os seus deméritos pessoais, Rui Gomes da Silva e de João Noronha Lopes têm o imenso demérito de não terem utilizado o espaço que lhes permitiu as respectivas candidaturas para promoverem uma candidatura vencedora, à volta de uma personalidade unificadora e acima de qualquer suspeita. Não perdem pelos defeitos ou limitações de cada um, pela estratégia que cada um seguiu, ou pelo programa que cada um apresentou. Perdem porque eventualmente qualquer um dos dois perderia. Mas perdem seguramente por serem dois.
Soube-se no sábado que o primeiro-ministro, António Costa, e Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, integravam a comissão de honra da candidatura de Luís Filipe Vieira à presidência do Benfica. E ficou notícia, como não poderia deixar de ser.
É mais, bem mais, que apenas mais um caso de promiscuidade entre política e futebol. Percebe-se que os dois juntos fazem um pacote, mas são obviamente diferentes as responsabilidades de cada um. Desde logo porque são diferentes as responsabilidades políticas de cada um. Mas também porque, se é frequente ver os autarcas envolvidos com os clubes dos respectivos municípios, e encontrar até aí o paradigma daquela promiscuidade, como acontece no Porto com Rui Moreira, é raríssimo um envolvimento como este de um chefe de governo. Não me ocorre sequer qualquer um.
Evidentemente que a esfarrapada desculpa de que estes são actos da esfera pessoal de cada um, que nada têm a ver com o exercício dos respectivos cargos públicos, não colhe. Desde logo porque é o exercício desses cargos que lhes dá a notoriedade que lhes confere peso e a notabilidade que lhes dá a honra para uma comissão de honra.
Acresce a tudo isto Luís Filipe Vieira e as suas circunstâncias, suficientemente conhecidas para me dispensar de as enumerar. Enquanto não for condenado por coisa alguma, Vieira é inocente de tudo o que é suspeito e/ou acusado. Mas as suas circunstâncias vão hoje muito para além do quadro criminal, como também se sabe. E aí não há julgamentos, há factos. Que não abonam a honorabilidade de ninguém e objectos de forte condenação moral.
Só uma total falta de apurado sentido político justificaria esta decisão de António Costa se empenhar desta forma na candidatura de Luís Filipe Vieira. Não é por falta de faro político que António Costa é conhecido. É reconhecidamente o mais astuto dos políticos na praça, e não é fácil cair em lapsos comprometedores.
Resta então outra hipótese: sensação de impunidade. António Costa terá entendido que a forma como joga o jogo político lhe deu um estatuto que o coloca acima de tudo e de todos. E não é a primeira vez que se lhe nota essa soberba. Começa até a ser recorrente...
Diz-se que que o Presidente Marcelo quer que o primeiro-ministro lhe explique. Poderia começar assim: "Ó António explique-me lá, como se eu fosse muito burro, como é que se meteu nesta alhada"!
O Benfica tem passado estes últimos tempos em complexos exercícios de equilibrismo, aparentemente sem rede, entre a necessidade de reforçar a sua equipa principal de futebol, e a necessidade de Luís Filipe Vieira assegurar a sua perpetuação no poder.
Reforçar a equipa não seria, apesar de tudo, tarefa de grande grau de dificuldade. Reforçar a posição de LFV, deixando a ideia de reforçar a equipa para grandes proezas e conquistas, é que tem trazido grandes problemas.
Tudo tem corrido mal. O ponto alto foi, evidentemente, Cavani. Uma contratação que nunca teve em vista reforçar a equipa - nem poderia ter, independentemente da sua valia, pese a idade, um jogador daquele estatuto, que manda os outros correr enquanto ganha mais que todos eles juntos (há exagero, mas nem é assim tão grande) mina o espírito de grupo e não reforça equipa nenhuma - mas apenas reforçar LFV.
E por isso, na ânsia de não perder esse reforço, a sofreguidão deixou que a incompetência tomasse conta da condução do processo, que acabou em chacota nacional.
Depois de mais uns quantos nomes, diariamente alimentados nos jornais e televisões por especialistas que mais não têm sido que bobos da corte de LFV surgiu, como cereja no topo do bolo, o folhetim Darwin Nunez. Tinha falhado o "velho" mas aí estava o novo Cavani!
Os bobos da corte fizeram o seu trabalho, e fizeram do jovem uruguaio a estrela mais cintilante da galáxia da bola. Era sucesso desportivo imediato e estrondoso êxito financeiro a curto prazo. Das sucessivas lesões que vêm afectando o jovem jogador, com três intervenções aos joelhos em pouco tempo, uma das quais a uma ruptura de ligamentos, nada foi dito. Está tudo ultrapassado, e os maus tempos já ficaram para trás...
Finalmente Darwin Nunez chegou a Lisboa, pelo braço de Rui Costa. A contratação mais cara do futebol português - que afinal apenas igualava a de Nakagima pelo Porto, no último defeso - estava confirmada e o jogador seria apresentado no dia seguinte. Marcada a hora da apresentação ... nada. Fica adiada.
Nada de grave, justificaria de imediato a estrutura de comunicação de Vieira: apenas não tinha dado para concluir os testes médicos.
Claro que não era nada disso. Era de dinheiro que se tratava. O Benfica teria que abrir ainda mais os cordões à bolsa, e bater claramente o recorde do jogador japonês do Porto. Parece que alguém se esquecera de avisar o Rui Costa e o Almeria, que o Paulo Gonçalves, o tal, esse que nos enche de vergonha alheia, tinha também umas comissões a receber. Diz agora que representa o jogador e o seu empresário e, ao saber da contratação, em que não foi tido nem achado, chegou e apresentou a factura.
Terá certamente muitas mais para apresentar. É assim que as coisas funcionam.
E é assim que se vai reforçando a equipa, a poucos dias de se começar a decidir o acesso à Champions. E é assim, com pouca vergonha em cima de pouca vergonha, que Vieira faz do Benfica o seu bunker pessoal.
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