Bem sei que a questão mais importante da semana é a de um segundo mandato da Procuradora Geral da República, que nunca houve e que poucos sabiam que pudesse haver, lá mais para o fim do ano. É realmente espantosa a capacidade que esta gente tem para reduzir a agenda mediática à simples espuma dos dias!
Por isso ninguém ligou muito às notícias que foram chegando sobre o emprego, com a divulgação dos dados do INE relativos a Novembro. Notícias que dão conta da mais baixa taxa de desemprego desde Novembro 2004, em 14 anos, portanto. No último ano a população empregada aumentou em perto de 160 mil pessoas!
São boas notícias?
Sim e não!
Sim, porque a diminuição do desemprego nunca pode deixar de ser uma boa notícia. Sim, porque resulta do crescimento económico, e a economia a crescer tem que ser sempre uma boa notícia.
E não. Porque o desemprego jovem continua a crescer, e em Portugal foi mesmo onde, na União Europeia, mais cresceu. Em Setembro era de 24,6 %, e em Outubro já ia em 25,6%: num mês, mais um em cada 100 jovens era desempregado.
E isto quer dizer muitas coisas. Quer dizer que continuamos a desperdiçar recursos, a deitar dinheiro fora, na educação por evidente desadequação entre a formação dada aos jovens e as necessidades das empresas. O drama é que isto não quer obrigatoriamente dizer que essa formação seja desadequada, quer dizer é que a retoma do emprego acontece em sectores que não valorizam as qualificações dos jovens mais preparados.
Por isso o desemprego jovem tem um comportamento simétrico ao do desemprego geral. Por isso há cada vez mais jovens sem trabalho ao mesmo tempo que, ao que dizem, faltam 70 mil trabalhadores na construção, 40 mil na restauração e outros tantos no calçado, no têxtil e na metalurgia.
Quer isto dizer – e pior notícia não pode haver - que na nossa economia nada mudou, que tudo continua na mesma. E toda a gente sabe que as mesmas coisas, nas mesmas circunstâncias, produzem sempre os mesmos resultados.
Bem sei que não é uma promessa. É um compromisso. Mas será que ninguém se lembra dos 150 mil de há seis anos?
Bem sei que o toda a gente acha que o emprego é o abre-te Sésamo da gruta do voto. Por isso é tão grande a manipulação que o governo e a coligação fazem desses números... Mas era mesmo necessário seguir uma fórmula que por sinal até correu tão mal?
Claro que temos de saudar estas coisas de "O Quanto, o Quando e o Como". E, claro, falar de "quanto" sem falar de quanto emprego era deixar de fora o maior dos quantos. Com o "quando" pacífico, e os outros quantos nos 118% do PIB para a dívida e no 1,4% para o défice, é no "como" que poderá estar o diabo. Tanto maior quando falta o maior quanto do como...
Numa campanha eleitoral em que vai valer tudo, governo e coligação querem fazer do desemprego uma questão de números. Reduzindo o maior problema da economia e da sociedade portuguesa a um número, o problema fica resolvido. Um número é um número, e com os números faz-se o que se quiser...
Se há coisa em que os números se pareçam com pessoas - com algumas pessoas - é nisso mesmo: prestam-se a tudo!
Se as pessoas que um dia perderam o emprego e estão sem trabalho há dois, três anos ou quatro anos não são desempregados, são inactivos. Se as pessoas que estão ocupadas uma hora por semana a receber formação que nunca lhes servirá para nada, estão em formação, não são desempregados. Se as pessoas que estão integradas em estágios pagos pelo Estado às empresas, são estagiários e não desempregados. Se as pessoas que tiveram de sair do país são hoje emigrantes e não desempregados, os números do desemprego são forçados a cair.
Os problemas das pessoas, esses, são os mesmos. Às pessoas pouco interessam os números, mais ou menos martelados, e sempre manipulados, do desemprego oficial do governo. O que às pessoas importa é o emprego que lhes falta. Não importa o desemprego, importa é o emprego. Não conta para nada que os números do desemprego tenham caído quando os do emprego cairam ainda muito mais!
O que realmente conta é o emprego que foi destruído nestes últimos quatro anos, que - palavra do FMI - demorará 20 anos a recuperar. Demoraria, direi eu, se a economia portuguesa conseguisse garantir tanto tempo de crescimento ininterrupto, coisa de que nos não lembramos.
E o que nunca deixará de contar é a qualidade do emprego que se está a criar. Muitas vezes, mais que emprego a prazo, emprego com prazo marcado para o desemprego, assente numa relação de trabalho cada vez mais desigual.
Já passaram dois dias depois do Banco de Portugal ter mostrado ao país a aldrabice dos números do emprego e ainda não apareceu ninguém do governo a dizer o que quer que seja. Nem Paulo Portas... Nem Pires de Lima... Nem Passos Coelho, que não está cá e, de lá, só fala para dar mais uns recados à comissão de inquérito do BES... Nem nenhum dos inúmeros papagaios destacados para o comentário nas televisões, que por aí andam só por ver andar os outros...
Mas alguém haveria de aparecer ... É que a semana está mesmo a correr mal para a propaganda que Passos Coelho anda a espalhar pelo país fora. Ainda mal tinha acabado de vender banha da cobra do mexilhão e já a OCDE desmentia tudo...
São muitas as formas que um anúncio de recrutamento – oferta de emprego – pode assumir. Mais ou menos apelativo, mais fechado ou mais aberto nas condições de acesso, com mais ou menos exigências…
Há mesmo ofertas de emprego desenhadas à medida: os requisitos são tão fechados, tão ajustados, que se percebe de imediato que já há galo para aquele poleiro.
O que ainda se não tinha visto era uma oferta de emprego tão específica … tão específica … que já inclui o nome a pessoa a recrutar. Disto é que ainda se não tinha visto. Mas viu-se hoje e, pasme-se, publicado pelo IEFP!
Poderia fazer parte do perfil requerido. Por exemplo: licenciatura em educação de infância, 24 anos de idade, olhos azuis – que deve sempre dar mais jeito para os miúdos – cabelos louros, porque assim é que deve ser – olhos azuis/cabelos louros –, e de nome Vera – porque os miúdos já estão habituados ao nome – e apelido Pereira, que é para facilitar o processo de aprendizagem da botânica. Mas não. O anúncio exigia conhecimentos profissionais inerentes à profissão – nada mais claro nem menos lapalissiano – e nos outros conhecimentos requeridos é que surgia o nome: Vera Pereira!
Valham-nos os estímulos. E as medidas de estímulo…
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