Futebolês #42 Falso ponta de lança
Por Eduardo Louro
O futebolês é uma linguagem com virtudes inimagináveis. Entre elas uma capacidade extraordinária de adaptação aos mais rebuscados conceitos e uma enorme facilidade de transmitir as mais subliminares mensagens. O falso ponta de lança tem um pouco de tudo isso!
Há o ponta de lança – o matador –, que já por aqui passou, mas também o falso ponta de lança. Que, ao contrário do falso médico (ou de qualquer outro falsificador), não anda por aí a armar-se no que não é. O falso ponta de lança não é aquele tipo que chega ao aeroporto todos os Verões (e todos os Janeiros, também Verão lá na terra deles) a proclamar aos setes ventos que faz muitos golos, que remata bem com os dois pés e que é muito bom de cabeça mas que, depois … nada. Nem um só desses atributos! Esse, embora pudesse parecer, não é o falso ponta de lança. Esse é o barrete!
O falso ponta de lança não é um impostor. Fazem dele um impostor, não o é ele próprio. É o treinador que cria esse embuste!
Ou porque não tem mesmo um ponta de lança na equipa – às vezes só tem um ou outro desses barretes – e, já diz o povo, quem não tem cão caça com gato; ou porque, mesmo tendo-o, não o utiliza porque tem medinho do adversário. Não é capaz de o enfrentar cara a cara. De disputar o jogo pelo jogo, olhos nos olhos com o adversário. Arma a equipa em bases ultra defensivas e, não lhe sobrando ninguém para servir o ponta de lança – ou assistir, como vimos na assistência –, opta por destinar as tarefas atacantes a um só jogador, normalmente franzino e rápido e de boa relação com a bola.
Aí está o falso ponta de lança!
Que nem sequer é bem uma falsidade. Comparada com as falsidades que por aí andam…
São as falsas partidas do Benfica e da selecção, a colocarem em sérios riscos os respectivos objectivos logo de início. São as falsas soluções e até mesmo os verdadeiros problemas confundidos com falsas questões!
Na selecção, como de resto se esperaria, tudo se resolveu com o despedimento de Queiroz. É falso que Madaíl tivesse algo a ver com o problema, ou mesmo que não seja ele o próprio problema. Basta olhar para a desorientação e o desespero verdadeiramente humilhante da tão disparatada quanto ridícula ideia de ir suplicar a José Mourinho (e ao Real Madrid) que venha treinar a selecção nos dois próximos jogos. Nunca visto!
No Benfica as coisas estão a correr como a partir de certa altura (o tema tem aqui sido abordado desde a 36ª edição) era previsível que corressem.
É visível que não há só falsos pontas de lança. Também há falsos resultados, falseados por arbitragens que, muitas vezes, custam a perceber como meramente infelizes. Objectivamente o Benfica vem sendo duplamente prejudicado: penalizado por decisões erradas nos seus próprios jogos e por decisões erradas que têm beneficiado os seus adversários directos. E os órgãos sociais do Benfica reagiram. Com razão. Mas mal, a meu ver! Mal porque dispararam em todas as direcções, e muito mal quando apelam à desmobilização da sua massa associativa – a sua maior força. Uma força capaz de levar a equipa ao colo – joga praticamente em casa em 27 ou 28 dos 30 jogos do campeonato – como ainda há pouco se via. Apelar aos adeptos para não comparecerem nos campos dos adversários é deitar fora uma das principais vantagens comparativas. Mas é também um espinho na relação de boa vizinhança com a grande maioria dos concorrentes: os pequenos clubes que vêm na visita do Benfica o seu euromilhões!
Não é assim que se mobilizam as tropas!
Ah! E Olegário Benquerença?
Bom, não está em causa a sua seriedade, para mim absolutamente intocável. Mas começa a ser demasiado evidente que não é feliz nos jogos com o Benfica. E como faz infelizes todos os benfiquistas (menos um, que eu conheço e ele também)!
Tudo começou aqui há uns anos, na Luz, com aquele remate do Petit que o Vítor Baía defendeu para além de uma linha que, mais que uma linha de golo, é uma linha que separa benfiquistas e anti benfiquistas. A partir daí é uma história de jogos complicados que, à luz dos dois últimos – o do Dragão do final da época passada e agora este de Guimarães – o melhor mesmo é pôr-lhe ponto final. E que a recente homenagem da A. F. Porto (já quase ninguém se lembrava da sua histórica e tumultuosa relação com a arbitragem) em nada ajudou. É que não é a mesma coisa da homenagem da A.F. Leiria, em que com muito gosto (a convite do tal benfiquista único que acima referi) participei, na véspera da partida para a África do Sul!
E domingo há derbi. Que parece estar já a aquecer, depois de uma longa semana europeia em que apenas o Braga deu passo em falso!